MONITORARIZAÇÃO DO ESFORÇO RESPIRATÓRIO E DA PRESSÃO TRANSPULMONAR DURANTE A VENTILAÇÃO MECÂNICA ASSISTIDA
Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico Responsável Técnico e Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos. Coordenador da Residência em Medicina Intensiva – COREME e membro do Grupo Técnico de Enfrentamento à COVID -19 da Santa Casa de São Jose dos Campos.
INTRODUÇÃO
O termo “parênquima pulmonar”, é
a parte funcional do pulmão envolvida nas trocas gasosas pelo que incluiria os
alvéolos pulmonares e os bronquíolos respiratórios, mas para outros, o termo
descreveria qualquer forma de tecido pulmonar, incluindo bronquíolos,
brônquios, vasos sanguíneos, interstício e alvéolos[1] [2]. Sabemos também que a
matriz do interstício pulmonar está composta principalmente por fibras de elastina
e de colágeno formando uma espécie de esqueleto fibroso, denominado matriz
extracelular pulmonar. Esta matriz dá suporte de sustentação às células
alveolares e endoteliais (membrana alvéolo-capilar). Quando este esqueleto
fibroso é distendido por forças mecânicas (ventilação a pressão positiva), não
apenas se distende o interstício, mas também as próprias células alveolares e endoteliais.
Ou seja, haverá distensão (estiramento) intersticial e celular.
Células do parênquima pulmonar, das vias aéreas em geral e do sistema
vascular associado, estão normalmente sujeitas
a uma variedade de estímulos ou forças
mecânicas passivas e ativas como resultado da natureza dinâmica e
cíclica da função pulmonar, associadas à insuflação-deflação pulmonar, perfusão
vascular, e da atividade física[3].
Ao longo dos últimos anos tem havido um
crescente interesse no estudo dessas forças mecânicas e sua relação com lesão
pulmonar. Células submetidas a estímulos mecânicos na forma de strain e stress apresentam uma gama diversificada
e ampla de respostas a esses estímulos mecânicos. A proliferação celular,
a diferenciação, a secreção, e circulação, a transdução de sinal, a expressão
do gene, e a síntese de proteínas são eventos que podem ser modificados por
forças mecânicas[4].
CARACTERIZAÇÃO DE
ESTÍMULOS MECÂNICOS
Pelos conceitos de biomecânica sabemos
que as forças físicas ou mecânicas que agem sobre o parênquima pulmonar durante
a ventilação mecânica são de 2 tipos:
1. STRAIN: significa “deformação”, qualquer mudança de comprimento em relação ao o comprimento inicial. É o estiramento de uma estrutura ou região pulmonar causado por uma tensão em relação ao seu comprimento no estado de relaxamento, ou seja, a deformação de uma estrutura, em decorrência de uma força externa aplicada sobre a mesma. Avalia a relação entre a variação do comprimento gerado pela força aplicada, e o seu comprimento inicial. (Fig.1).
Fig. 1 O strain como
força mecânica
2. STRESS: significa “tensão”, força por unidade de área que se desenvolve em reação a uma força aplicada
externamente ao pulmão de mesma intensidade,
mas com sentido
oposto, ou seja, é a
distribuição de forças por unidade de área de pulmão. Representa a “tensão
mecânica”.
Há 3 formas (Fig.2):
1.
SHEAR
STRESS: quando as forças de
tensão são paralelas ao plano. Também chamado de “stress de cisalhamento”;
2.
COMPRESIVE
STRESS: quando a tensão está
dirigida para dentro a partir da parte sobre a qual atua. Também chamado de `stress
de compressão",
3. TENSIONAL STRESS (STRETCH):
quando a tensão é dirigida para fora a partir da parte sobre a qual atua. Também
chamado de “stress de tração'.
Cisalhamento, compressão e tração, representam respectivamente:
a tendência das partes para deslizar-se, aproximar-se, ou separar-se, sob a ação de forças aplicadas. STRETCH é um “stress de tração”, SHORTENING
é um “stress de compressão”, e uma ANGULAR DISTORTION é um “stress de
cisalhamento”[5].
Fig.2 O stress como força mecânica
Pacientes com SARA apresentam distribuição
heterogênea de edema, colapso e aeração nos pulmões que leva a uma concentração
regional de forças nos pulmões também heterogenea. Diversas variáveis respiratórias têm sido utilizadas como marcadores do stresse
e strain pulmonares. A pressão transpulmonar (PL), que é a diferença
entre a pressão da via aérea e a pressão pleural, é considerada o equivalente
clínico da tensão mecânica ou stress. O equivalente da deformação ou strain, por
sua vez, é a relação entre o volume corrente (VC) e o volume de repouso pulmonar
ou a capacidade residual funcional (CRF). Percebe-se que afinal, se estabelece
uma relação entre a PL e o VC que nos remite ao conceito de elastância. Assim,
poder-se-ia dizer que stress seria o strain x elastância especifica do pulmão. Sob
ventilação mecânica, o stress e o strain pulmonares são os
principais determinantes da VILI e nos pacientes com esforço muscular excessivo
e as assincronias paciente-ventilador pode potencializar este fenômeno, através
do aumento da pressão transpulmonar e da geração de volumes correntes também
elevados.
Poderíamos
aplicar esses conceitos de biomecânica às estruturas do tecido pulmonar: Células
brônquicas, alveolares, endoteliais (capilares) e parenquimatosas, bem como os
fibroblastos e macrófagos. Strain pode ser mais proeminente nas células do epitélio alveolar durante a respiração,
ao passo que a stress de cisalhamento pode atuar principalmente no
endotélio vascular. O endotélio vascular
pode também ser submetido a strain e a pressão hidrostática. Além disso,
o stress de cisalhamento pode atuar em outras células. O fluido pleural afeta as células
mesoteliais e a camada de fluido das vias aéreas e afeta células epiteliais
alveolares. Finalmente, strain pode ser gerado por rearranjos do
citoesqueleto, tais como a contração da actina levando à
transmissão de tensão em toda a célula, incluindo o núcleo[6].
Alvéolos são as estruturas mais
importantes a sofrer os impactos dessas forças descritas (Fig 3):
Fig 3. Stress e Strain no parênquima alveolar
Além disso, os tipos de forças físicas
também variam de acordo com a parte da célula em que operam. Por exemplo,
na camada de fluido das vias aéreas e alvéolos aplica-se stress de cisalhamento na
superfície apical do epitélio, enquanto que a distensão da membrana basal aplica
stress de tração à superfície basolateral das células epiteliais.
VENTILATOR-INDUCED LUNG INJURY (VILI)
A ventilação mecânica tem sido reconhecida como causa de lesão pulmonar
desde sua introdução, embora o termo Ventilator-Induced Lung Injury (VILI)
ou Lesão Pulmonar Induzida pela Ventilação Mecânica (LPIVM) tenha sido
introduzido em 1993[7].
Ao longo do tempo, vários fatores tem sido reconhecidos como possíveis
desencadeadores de lesão pulmonar induzida pela ventilação mecânica (LPIVM). O
primeiro, é a pressão gerada pelo ventilador ou pressão de via aérea (“barotrauma”),
onde a pressão excessiva leva à ruptura macroscópica do parênquima pulmonar provocando
pneumotórax, pneumomediastino, enfisema subcutâneo e embolia gasosa[8].
O segundo, é o volume gerado pelo ventilador ou volume corrente (“volutrauma”) que
causa lesão como demonstrado por Dreyfuss et.al.[9]
e definitivamente comprovado pelos resultados do ensaio ARMA, onde o maior
volume corrente foi associado a uma mortalidade quase 10% maior do que o menor
volume corrente (12 vs. 6 mL/kg de peso predito)[10].
O terceiro, se refere à abertura e fechamento cíclico das unidades pulmonares (“atelectrauma”),
que leva a stress e a má distribuição do strain em um parênquima
pulmonar heterogêneo e consequentemente a aumento acentuado de citocinas
inflamatórias
(biotrauma)[11].
Menos atenção tem sido dada à frequência respiratória e ao fluxo, às quais, evidências
experimentais atribuem um papel significativo na geração de LPIVM. A lesão
inicial do parênquima pulmonar é necessariamente mecânica e pode se manifestar
como uma distorção não fisiológica da matriz extracelular e/ou como
microfraturas no hialuronano, provavelmente o polímero mais frágil embutido na
matriz. Sendo o pulmão um órgão viscoelástico, onde diferentes forças (stress)
provocam deformação (strain), há uma entrega maior de energia para o paciente
por parte do ventilador que terminará induzindo deformação irreversível e
remodelação do pulmão (ergotrauma)[12].
Esta lesão por excesso de energia (energytrauma) pode ser monitorada através da
estimativa do mechanical power[13]
[14].
O
reconhecimento da Lesão Pulmonar Induzida pela Ventilação Mecânica (LPIVM ou
VILI) tem sido essencial para o nosso entendimento das interações entre a
ventilação mecânica e o trauma pulmonar subsequente. Tem sido possível medir,
analisar e compreender as diferentes forças aplicadas aos pulmões (stress) e a
deformação resultante (strain), o que permitiu estabelecer parâmetros de
estratégia protetora que minimize ou evite a LPIVM. A avaliação da mecânica respiratória
em paciente submetido à ventilação mecânica controlada, monitorando parâmetros pressóricos
como pressão de platô (Pplat), Pressão de pico (Ppi), pressão pleural (Ppl) pela
pressão esofágica, driving pressure (DP), pressão transpulmonar (PL), pressão positiva
expiratória final (PEEP); e de complacência pulmonar e da parede torácica
(estática e dinâmica) assim como de resistência da via aérea, têm sido
ferramentas essenciais para estabelecer os parâmetros da denominada estratégia
protetora (Fig. 4).
Fig. 4 Evolução temporal do conceito de VILI
PATIENT SELF-INFLICTED LUNG INJURY (P-SILI)
Em 2017, Laurent Brochard,
Arthur Slutsky e Antonio Pesenti, descreveram uma nova entidade
denominada patient self-inflicted lung injury (P-SILI), considerando que
pacientes ventilando espontaneamente, intubados ou não, com insuficiência
respiratória aguda podem ter um esforço respiratório alto e respirar com
grandes volumes correntes gerando oscilações da pressão transpulmonar
potencialmente prejudiciais[15].
Segundo descreveram
originalmente, existem três caminhos possíveis que explicam como a respiração
espontânea pode ser prejudicial e facilitar a progressão da lesão pulmonar gerada
pelo esforço respiratório do paciente em pacientes com SARA:
1. Mesmo que o pulmão
"normal" possa tolerar aumentos muito grandes de volumes correntes e de
ventilação minuto por curtos períodos de tempo (como ocorre durante o exercício
extenuante) os pulmões com lesão pré-existente são mais suscetíveis a lesão
pulmonar induzida pela ventilação (conceito de "dois golpes”).
2. Com base nos conceitos
fisiológicos clássicos, as oscilações da pressão transpulmonar (ou seja, o stress
nos pulmões) são semelhantes para um determinado volume corrente (começando no
mesmo volume pulmonar), seja gerado por um ventilador mecânico, esforço
espontâneo, ambos, ou ventilação com pressão negativa (Fig. 5). No
entanto, existem várias sutilezas que podem levar à lesão pulmonar em pacientes
com pulmão lesado, relacionadas à distribuição regional da lesão, com
diferenças associadas nas pressões transpulmonares locais e stress local. Aumentos
regionais na pressão transpulmonar nem sempre são bem refletidos por uma
medição global do volume corrente ou da pressão transpulmonar. O fenômeno de
pendelluft é um bom exemplo, em que um grande esforço pode induzir a
redistribuição intrapulmonar de ar das áreas não dependentes para as
dependentes. O pulmão da SARA é heterogêneo, constituído por áreas aeradas, mal
aeradas e não aeradas (o conceito de “baby lung”). O paciente ao fazer esforço
inspiratório aumenta sua pressão transpulmonar (PL) abrindo as áreas
"fechadas" e não aeradas no pulmão. Embora isso permita certo grau de
recrutamento tidal, esse fenômeno aumenta excessivamente o alongamento da área
pulmonar dependente, gerando eventualmente lesão pulmonar.
Fig. 5 A
mesma pressão transpulmonar (PL) pode ser gerada durante a ventilação mecânica
controlada, uma respiração espontânea (SB) ou uma combinação das duas durante a
ventilação com pressão de suporte (PSV – Partial Assist). De cima para baixo:
fluxo (Flow), pressão alveolar (Palv em vermelho) e pressão das vias aéreas (Paw),
pressão esofágica (Pes), pressão transpulmonar calculada (PL) e volume corrente
(L). Linhas azuis verticais delimitam o tempo de inspiração. CMV = ventilação
mecânica controlada.
3. Durante a ventilação
controlada, a pressão alveolar é mais alta do que a pressão expiratória final durante
a maior parte do ciclo respiratório. Durante a ventilação espontânea,
entretanto, a pressão alveolar pode cair bem abaixo da pressão expiratória
final. O aumento da pressão vascular pulmonar transmural no contexto de uma
permeabilidade vascular aumentada aumenta muito o risco de edema pulmonar por
vazamento vascular. Aumentos nas pressões vasculares transmurais pulmonares
também mostraram piorar a LPIVM. Durante os esforços inspiratórios, a pressão
intratorácica torna-se negativa e o volume sanguíneo intratorácico aumenta.
Durante esses esforços, a pressão intravascular medida nos vasos pulmonares
intratorácicos diminui, mas em menor extensão do que a pressão esofágica ou
pleural, resultando em aumento das pressões vasculares pulmonares transmurais.
Exemplos dos efeitos da pressão pleural negativa são dados pelo edema pulmonar
de pressão negativa que ocorre no pulmão normal quando a resistência das vias
aéreas aumenta a um nível muito alto, e pela abundante literatura sobre edema
pulmonar induzido pela resistência das vias aéreas. Portanto, pressões
alveolares negativas criadas por mudanças maiores na pressão pleural e,
portanto, mudanças positivas na pressão transvascular, favorecem o edema
pulmonar, um mecanismo que é amplificado com o aumento da permeabilidade
vascular. O edema pulmonar gerado provoca prejuízo na troca de gases e hipoxemia
que levará, por sua vez, a um incremento do drive respiratório reiniciando um ciclo
vicioso de P-SILI (Fig. 6).
Fig
6. Ciclo vicioso da P-SILI
MÉTODOS
NÃO INVASIVOS PARA AVALIAR O ESFORÇO RESPIRATÓRIO
Em 2019, Michele Bertoni e col., diante dos possíveis efeitos deletérios provocados pelo esforço muscular respiratório excessivo durante a ventilação mecânica podendo causar lesão pulmonar autoinfligida pelo paciente (P-SILI) e miotrauma do diafragma, e diante da falta de métodos não invasivos para avaliar esse esforço muscular publicaram os resultados de um estudo em que estabeleceram uma técnica não invasiva para calcular a beira leito, a pressão transpulmonar dinâmica (ΔPLdyn) e a pressão muscular (Pmus), variáveis que refletiriam com acurácia os limites de segurança do esforço muscular inspiratório[16].
Para os autores, o
esforço muscular inspiratório aumenta o volume corrente (strain pulmonar) e o stress
pulmonar dinâmico global, quantificado pela pressão transpulmonar (PL):
PL = Paw – Ppl
Paw = Pressão da via aérea
Ppl= pressão pleural (aferida pela Pes)
Como já descrito, esforços inspiratórios vigorosos podem gerar o fenômeno de pendelluft e amplificar o stress pulmonar regional, causando lesão pulmonar regional mesmo em modos de ventilação controlados a volume. A amplitude desta tensão regional é refletida pelo delta de pressão transpulmonar dinâmica (ΔPLdyn) definida para cada respiração como o aumento em PL do início da inspiração (final da expiração) ao pico da inspiração.
ΔPLdyn = PL final insp. – PL final da exp.
O excesso de carga
diafragmática pode prejudicar o fornecimento de oxigênio sistêmico e causar
lesão do músculo diafragma (miotrauma). O esforço inspiratório é quantificado
pela pressão dos músculos respiratórios (Pmus) e não é monitorado
rotineiramente durante a ventilação mecânica. Embora várias técnicas de monitoramento
estejam disponíveis, como por exemplo, manometria esofágica, atividade elétrica
do diafragma (EAdi) e ultrassom do diafragma, elas requerem equipamento
apropriado, habilidade e tempo, tornando difícil para médicos avaliarem esforço
inspiratório como parte do monitoramento respiratório de rotina a beira leito.
O drive respiratório
(estímulo neural) faz parte da monitorização multiparamétirca
do paciente em ventilação mecânica assistida em que o paciente deflagra os
ciclos ventilatórios pelo seu esforço muscular. Seu mecanismo fisiológico,
assim como sua avaliação e monitorização através da pressão de oclusão
expiratória nos 100 primeiros milissegundos (P0.1) e aplicações já foram
abordados neste mesmo Blog:
http://blogdeterapiaintensiva.blogspot.com/2020/12/driverespiratorio-em-pacientes-criticos.html
http://blogdeterapiaintensiva.blogspot.com/2021/01/a-p0.html
Da mesma forma, a avaliação
da mecânica respiratória em modos ventilatórios assistidos mediante oclusão
inspiratória, através do cálculo das pressões de platô, driving pressure, complacência
do sistema respiratório e o índice de pressão muscular (IPM) também já foram
abordados neste Blog:
http://blogdeterapiaintensiva.blogspot.com/2021/03/avaliacao-da-mecanica-respiratoria-nas.html
Agora, com base nos
estudos de Bertoni e col., temos mais ferramentas para avaliar a magnitude do stress
pulmonar dinâmico gerado pelos efeitos combinados do ventilador e do
esforço respiratório do paciente. Sabe-se que a pressão de platô (Pplat) e a driving
pressure estática (Pplat – PEEP) são usadas para detectar o excesso de stress
pulmonar durante a ventilação mecânica controlada, mas essas medições podem não
ser confiáveis na presença de esforço inspiratório, pois podem subestimar a
verdadeira magnitude do stress aplicado ao pulmão de forma global e regional. Além
disso, essas medidas representam a pressão elástica total do sistema respiratório
(combinando o pulmão e a parede torácica). Valores elevados, portanto, não
implicam necessariamente em estresse pulmonar excessivo quando a elastância da
parede torácica é aumentada. Uma técnica rápida e não invasiva para detectar o
esforço respiratório excessivo e o stress pulmonar dinâmico aumentaria
substancialmente a viabilidade de detectar uma respiração espontânea
prejudicial durante a ventilação mecânica.
Durante uma manobra de oclusão
no final da expiração, aplicada aleatoriamente pelo ventilador,
a deflexão máxima da pressão das vias aéreas gerada pelo esforço inspiratório
do paciente contra as vias aéreas ocluídas é denominada de Pressão de
Oclusão Expiratória (ΔPocc) que está correlacionada com a pressão
gerada pelos músculos respiratórios para expandir os pulmões e a parede
torácica durante respirações assistidas mecanicamente porque uma única oclusão
expiratória final não altera o impulso respiratório. Portanto, o ΔPocc pode
fornecer um meio não invasivo de detectar o esforço inspiratório excessivo e o stress
pulmonar dinâmico durante a ventilação mecânica assistida.
O estudo conduzido em duas
unidades de terapia intensiva médico-cirúrgica da University Health Network,
Toronto, Canadá, representa uma análise auxiliar de um estudo clínico em
andamento (MYOTRAUMA) que avalia a atividade e função do diafragma longitudinalmente
durante a ventilação mecânica. Os pacientes selecionados do estudo MYOTRAUMA foram
aqueles que estavam intubados e em ventilação mecânica assistida. Pressão esofágica
(Pes) foi calculada para usá-la como substituta da pressão pleural (Ppl).
A pressão transpulmonar (PL), calculada
como Paw - Pes. Aferida no final da inspiração, pode ser estática
(PLsta = Plat – Pes) ou dinâmica (PLdyn = Ppi – Pes).
A driving pressure
dinâmica (ΔPawdyn), foi calculada como a Ppi – PEEP.
Distingue-se da driving pressure estática (ΔPawsta) aferida como
Pplat – PEEP.
O delta de pressão transpulmonar
dinâmica (ΔPLdyn), definida para cada respiração como o
aumento em PLdyn do início ao pico da inspiração. PLdyn final da insp. – PLdyn
final da expir.
A pressão de recuo
elástico da parede torácica no final da inspiração (Pcw),
foi estimada para cada respiração a partir do produto do volume corrente e a
elastância da parede torácica estimada empiricamente, baseado na capacidade
vital prevista.
A pressão gerada pelos
músculos respiratórios durante a inspiração (Pmus), foi
quantificada para cada respiração como Pcw e Pes durante a inspiração.
O produto pressão-tempo da
Pmus por respiração (PTPmus), o padrão de referência
para quantificar o esforço inspiratório, foi calculado a partir de Pcw e
a integral de Pes durante a inspiração.
Para evitar erros de
medição devido a medições imprecisas de Pes , os registros em que a razão de ΔPocc/ΔPes
era maior que 1,3 ou menor que 0,7 foram excluídos da análise.
Os limites adotados para Pmus
e ΔPLdyn excessivos foram selecionados a priori com base nas observações
fisiológicas e clínicas disponíveis. Pmus normalmente varia entre 4 e 10 cm H2O,
e ΔPLdyn normalmente varia entre 4 e 8 cm H2O. Dada alguma incerteza nas
definições ideais para Pmus excessivo e ΔPLdyn, a precisão discriminativa foi
avaliada para duas definições possíveis diferentes de valores "excessivos":
para Pmus, 10 - 15 cm H2O, e para ΔPLdyn, 15 - 20 cmH2O.
52 gravações diárias
foram coletadas em 16 pacientes. Nesta amostra, Pmus e ΔPLdyn foram frequente
excessivamente elevados: Pmus excedeu 10 cm H2O em 84% dos dias de estudo e ΔPLdyn
excedeu 15 cm H2O em 53% dos dias de estudo. As medições do ΔPocc detectaram
com precisão Pmus > 10 cm H2O (AUROC 0,92, IC 95% 0,83–0,97) e ΔPLdyn >
15 cm H2O (AUROC 0,93, IC 95% 0,86–0,99).
Desta forma, ΔPocc permite
a detecção não invasiva precisa da pressão elevada do músculo respiratório e da
pressão transpulmonar dinâmica através das seguintes equações preditivas:
Pmus predita = -3/4 ΔPocc. (VN: ≤ 10 -15 cm H2O)
ΔPLdyn predito = ΔPawdyn – 2/3 ΔPocc OU
(Ppi – PEEP) – 2/3 ΔPocc. (VN: ≤ 15-20 cm H2O)
*Deve se considerar a média dos valores de 3 aferições aleatórias.
A maioria dos
respiradores permite realizar uma manobra de oclusão expiratória (pausa
expiratória) de 2 a 3 segundos (até 5 segundos) registrando os valores correspondentes
à pressão negativa realizadas pelo paciente quando cai abaixo de 0 (Pdrop). Entretanto,
para isso o paciente deve vencer antes a PEEP programada, pelo que o ΔPocc =
Pdrop – PEEP. Os respiradores da Maquet (Servo-S, Servo-I) permitem gravar
o registro dos gráficos e curvas para posteriormente verificar os valores de
pressão. Os respiradores da Dixtal, permitem realizar a manobra do Pimax, na
qual é realizada uma oclusão expiratória de 20 segundos. É possível usar o
valor aferido no primeiro esforço inspiratório e imediatamente abortar a
manobra. O respirador fornecerá a curva e o valor da máxima pressão negativa
(Pdrop). Entretanto antes de iniciar a manobra o respirador zera a PEEP, pelo que
há que se ter a cautela de aferir o valor correto do ΔPocc = Pdrop – PEEP.
O Grupo canadense da Divisão
Interdepartamental de Medicina Intensiva da Universidade de Toronto,
Canadá, dirigido pelo Professor Laurent Brochard, do qual faz parte não apenas
Michel Bertoni, mas outros nomes renomados como Irene Telias, Ewan Goligher, Lisanne
Roesthuis, etc., tem se destacado na investigação e estudo da mecânica ventilatória
em pacientes com respiração espontânea. O Centro de Excelência em Ventilação
Mecânica de Toronto (CoEMV) do St. Michael's Hospital lidera a ventilação
mecânica personalizada e baseada em evidências por meio da prática
colaborativa, educação, pesquisa e inovação (https://coemv.ca/).
O grupo desenvolveu varias calculadoras que auxiliam na monitorização da
ventilação mecânica. Uma dessas calculadoras permite o cálculo do ΔPocc, a
Pmus predita e o ΔPLdyn predito: https://rtmaven.com/
O estudo propõe também um
FLUXOGRAMA para monitorização do paciente (Fig. 7):
Fig.7 Algoritmo clínico
proposto para monitorar a pressão do músculo respiratório (Pmus) e as
oscilações da pressão transpulmonar dinâmica (ΔPLdyn) com base na deflexão
negativa na pressão das vias aéreas durante uma manobra de oclusão expiratória
final (Δ Pocc). Pes, pressão esofágica
E março de 2020, Michele
Bertoni e col., trouxe nova publicação sobre monitoramento do esforço
respiratório do paciente durante a ventilação mecânica, tecendo considerações
sobre ventilação protetora do pulmão e do diafragma[17].
A respeito da P-SILI
apontam os seguintes mecanismos (Fig.8).
Stress pulmonar global
excessivo. Como já discutido, os esforços respiratórios do
paciente podem aumentar o volume corrente e a PL acima dos limites seguros
quando o impulso respiratório é elevado.
Stress pulmonar regional
excessivo. No pulmão lesado, o pulmão colapsado e consolidado
introduz heterogeneidades mecânicas do parênquima, aumentando o risco de
volutrauma por meio da amplificação do stress regional. O stress mecânico e o strain
(deformação) não são redistribuídos uniformemente durante a inflação.
Consequentemente, os esforços inspiratórios geram grandes oscilações da PL nas
regiões consolidadas dorsais, resultando no movimento do ar das regiões não
dependentes para as dependentes (fenômeno de pendelluft). Embora isso
recrute o colapso do pulmão e melhore a incompatibilidade ventilação-perfusão,
esse fenômeno aumenta o alongamento excessivo da área pulmonar dependente.
Nesse caso, o aumento na PL detectado pela manometria esofágica pode não ser
uma medida confiável do stress local.
Pressão transvascular e
edema pulmonar. Durante a respiração espontânea, a Ppl
negativa gerada pelo esforço respiratório aumenta a pressão transvascular (o
gradiente de pressão que conduz a migração de fluido pelos vasos pulmonares),
aumentando a água pulmonar total e o edema pulmonar e prejudicando ainda mais a
função respiratória.
Assincronias. As
assincronias do ventilador, incluindo duplo disparo (respirações mecânicas
duplas de um único esforço inspiratório) e reverso (contrações do diafragma
induzidas por insuflação torácica passiva em pacientes ventilados passivamente)
podem aumentar o volume corrente e a PL e gerar pendelluft, levando a lesão
pulmonar.
Fig. 8 Mecanismos de
lesão pulmonar-diafragma em pacientes com respiração espontânea em ventilação
mecânica assistida. Observe que alguns desses mecanismos também se aplicam sob
ventilação mecânica controlada (por exemplo, disparo reverso). PEEP = pressão
expiratória final positiva
Em relação a MIOTRAUMA,
a ventilação mecânica causa miotrauma por vários mecanismos, levando a uma via
final comum de Disfunção Diafragmática associada a Ventilação Mecânica (VIDD). Os
mecanismos de miotrauma estão resumidos na Fig.8:
Falta excessiva de carga.
A assistência excessiva da ventilação mecânica e a supressão do impulso
respiratório devido à sedação levam à atrofia aguda por desuso e a fraqueza do
diafragma. A descarga diafragmática causada pela ventilação superassistida
(tanto no modo controle como assistido) é frequente durante a ventilação
mecânica, em particular durante as primeiras 48 horas. É importante ressaltar
que o baixo nível de esforço respiratório necessário para acionar o ventilador
não é suficiente para evitar a atrofia por desuso, de forma que pode ocorrer
atrofia do diafragma sob ventilação com pressão de suporte.
Carga concêntrica
excessiva. Maior esforço inspiratório do paciente, dissincronias
e subassistência devido a um nível insuficiente de suporte são frequentes na
ventilação mecânica assistida. Contrações concêntricas vigorosas provocam alta
tensão muscular, resultando em inflamação muscular, proteólise, dano
miofibrilar e desordem do sarcolema. Em pacientes gravemente enfermos, a
inflamação sistêmica torna as miofibrilas musculares mais vulneráveis à lesão
mecânica.
Carga excêntrica.
As contrações excêntricas ocorrem quando um músculo gera tensão contrátil
enquanto se relaxa (contração durante o alongamento). Tais contrações são muito
mais prejudiciais do que as contrações concêntricas (encurtamento). Quando uma
pressão expiratória final positiva baixa (PEEP) e redução excessiva no volume
pulmonar expiratório final estão presentes, o diafragma se contrai mesmo
enquanto se alonga durante a fase expiratória ("pós-inspiratória")
para evitar atelectasia (fenômeno de "frenagem expiratória"). Formas
específicas de dissincronia (disparo reverso, ciclagem curta, esforço ineficaz)
podem gerar contrações excêntricas porque o diafragma é ativado durante a fase
expiratória.
PEEP excessiva.
Evidências experimentais preliminares sugerem que manter o diafragma em um
comprimento menor com o uso de PEEP excessiva pode fazer com que os sarcômeros
“caiam” do músculo e encurtem seu comprimento (atrofia longitudinal). Isso
poderia teoricamente prejudicar as características da relação
comprimento-tensão do músculo quando a PEEP for reduzida, prejudicando o
desempenho do diafragma.
Os três primeiros desses
mecanismos de lesão podem ser detectados monitorando o esforço respiratório,
enfatizando o potencial desse monitoramento para ajudar os médicos a garantir
uma respiração espontânea segura durante a ventilação mecânica.
A seguir os autores
apontam formas de monitoramento da ventilação espontânea:
1. COM USO DE PRESSÃO ESOFÁGICA
(Pes):
A Pes é usada como substituto
da pressão pleural (Ppl) permitido aferir:
1.1 A pressão
transpulmonar (PL) através da formula: Paw – Pes. Um limite
superior aceitável para PL ainda não foi definido; mas um máximo "preventivo"
de 20 cmH2O em um paciente com lesão pulmonar é uma meta razoável para limitar
o risco de lesão. Destacam que em se tratando de ventilação assistida (ventilação
+ esforço do paciente) o uso da Ppi para aferir a PLdyn seria de maior utilidade.
1.2 A pressão muscular
(Pmus) através da formula: Pcw – Pes, onde Pcw é a pressão
de recuo elástico da caixa torácica. Os níveis ideais de Pmus durante a
ventilação mecânica assistida são incertos. Dados recentes sugerem que valores
de Pmus semelhantes aos de indivíduos saudáveis respirando em repouso podem
ser seguros e podem prevenir a atrofia do diafragma (5–10 cmH2O). Na prática
clínica de rotina, geralmente pode-se desconsiderar a correção para Pcw porque
a elastância da parede torácica é geralmente relativamente baixa (mesmo quando
as pressões pleurais estão elevadas). Portanto, um alvo ΔPes de cerca de 3-8
cmH2O pode ser considerado razoavelmente comparável a um Pmus normal de 5-10
cmH2O.
1.3 Produto pressão –
tempo (PTP). A medida padrão ouro do esforço
respiratório é a integral do Pmus ao longo da duração da inspiração (produto
pressão-tempo [PTP]). O PTP está intimamente relacionado ao gasto de energia do
músculo inspiratório. Valores de PTP entre 50 e 100 cmH2O/s/min provavelmente
refletem o consumo adequado de oxigênio e esforço respiratório aceitável. Na
prática clínica de rotina, a magnitude e a frequência do balanço em Pes são
provavelmente suficientes para monitorar o esforço respiratório.
1.4. Pressão
Transdiafragmática. Um cateter de balão duplo pode ser usado
para monitorar oscilações inspiratórias em Pes e pressão gástrica (Pga) para
quantificar especificamente a pressão gerada pelo diafragma (pressão
transdiafragmática [Pdi]). Durante um esforço inspiratório (dependendo do
padrão de movimento toracoabdominal), o esforço contrátil do diafragma move os
órgãos abdominais para baixo, aumentando a pressão abdominal (balanço positivo
em Pga) e expandindo a cavidade torácica (balanço negativo em Pes). Mesmo
quando o movimento toracoabdominal é tal que o diafragma se move para cima
durante a inspiração (ou seja, Pga diminui), o esforço contrátil do diafragma é
refletido pelo fato de que Pga diminui menos do que Pes (e, portanto, Pdi
aumenta). Essa técnica é usada principalmente em pesquisas, e não na prática
clínica.
2. SEM USO DE PRESSÃO
ESOFÁGICA (Pes)
2.1 Com manobra de
oclusão inspiratória (pausa inspiratória). Breves manobras
de oclusão no final da inspiração (pausa inspiratória) são amplamente
utilizadas para medir a pressão de platô (Pplat) em ventilação mecânica passiva
(sem drive respiratório). A driving pressure (ΔP) nestes pacientes, calculada
como a diferença entre Pplat – PEEP, reflete o estresse pulmonar e o risco de
lesão pulmonar e se correlaciona intimamente com a mortalidade em pacientes com
SDRA. Bellani et al. sugeriram que uma
breve manobra de oclusão inspiratória pode também permitir medições confiáveis
de Pplat nos pacientes em ventilação mecânica assistida. Durante uma pausa
inspiratória em ventilação mecânica assistida, os pacientes relaxam os músculos
inspiratórios no final da inspiração, resultando em um aumento na Paw
facilmente detectável como elevação da curva na tela do ventilador. Quando o
paciente está superassistido e o esforço respiratório é baixo, a Paw cai
durante a oclusão. Uma Pplat e uma ΔP altos medidos dessa forma aumentam a
preocupação com hiperdistensão e lesão pulmonar. Bellani e colegas relataram
recentemente que a ΔP e a complacência medidas por manobras de oclusão
inspiratória final durante a ventilação mecânica assistida predizem a
mortalidade, apoiando a validade e relevância dessas medidas. Neste Blog se
encontra explanação ampla:
http://blogdeterapiaintensiva.blogspot.com/2021/03/avaliacao-da-mecanica-respiratoria-nas.html
2.2 Com manobra de oclusão expiratória (pausa expiratória). Como explicado neste post, o uso do ΔPocc estimado a partir de uma pausa inspiratória permite estimar a Pmus predita = -3/4 ΔPocc. (VN: ≤ 10-15 cm H2O) e o ΔPLdyn predito = ΔPawdyn – 2/3 ΔPocc ou (Ppi – PEEP) – 2/3 ΔPocc. (VN: ≤ 15-20 cm H2O) que por sua vez podem avaliar o esforço muscular respiratório e alertar para altos níveis de esforço e risco de P-SILI. Ainda, a P0.1 (pressão das vias aéreas gerada nos primeiros 100 ms de inspiração contra a oclusão expiratória) fornece uma medida do impulso respiratório do paciente. Embora a confiabilidade de P0.1 tenha sido confirmada apenas em pequenos estudos, um valor entre 1,5 e 3,5 cmH2O parece ser um método fácil para orientar os médicos a ajustar a ventilação durante a ventilação mecânica assistida. Valores de P0.1 menores que 1,5 cmH2O podem sugerir que o esforço respiratório é inadequado, e valores maiores que 3,5 cmH2O sugerem alto drive respiratório. Maiores detalhes acessar:
http://blogdeterapiaintensiva.blogspot.com/2020/12/driverespiratorio-em-pacientes-criticos.html
http://blogdeterapiaintensiva.blogspot.com/2021/01/a-p0.html
Importante mencionar que os
valores da Pmus predita aferida pela pausa inspiratória (índice de pressão
muscular) e pela pausa expiratória (-3/4 ΔPocc) podem não coincidir, caso durante
as pausas o paciente realize esforços musculares inspiratórios ou expiratórios,
que irão alterar os valores da variáveis necessárias para o cálculo inferido da
Pmus, quer seja pela oclusão inspiratória, quer seja pela oclusão expiratória.
2.3 Pela avaliação da
atividade elétrica do diafragma (EAdi). O uso de um cateter
equipado com eletrodos de eletromiografia permite o monitoramento contínuo da
atividade elétrica do diafragma (Eadi). Eadi demonstrou ser comparável à pressão
transdiafragmática e é mais prática do que a eletromiografia de superfície
(EMG). Quando a ventilação é conduzida por Eadi (durante a assistência
ventilatória ajustada neuralmente [NAVA]), a interação paciente-ventilador
melhora. Eadi também ajuda os médicos a reconhecer diferentes assincronias.
Conforme demonstrado a tendência da Eadi pode ser usada para detectar falha no
desmame em um estágio inicial: ela aumenta progressivamente em pacientes que
falham em seu teste de respiração espontânea, enquanto a atividade do diafragma
permanece estável em pacientes que passam no teste. As alterações do Eadi
apareceram antes dos sinais de fadiga. Como sinal elétrico, o Eadi é uma
expressão da ativação do diafragma pelo sistema nervoso central, e não da
geração de força diafragmática (esforço). Durante a respiração em repouso em
indivíduos saudáveis, o EAdi varia entre 5 e 30 μV. Por causa dessa grande
variação, é difícil especificar um Eadi alvo para atingir durante a ventilação
mecânica. Alternativamente, o EAdi pode ser usado para estimar o Pmus sob
diferentes condições de assistência do ventilador. Ao considerar o acoplamento
entre a atividade elétrica e a constante de geração de pressão durante o tempo
(acoplamento neuro-mecânico = Pmus/EAdi obtido durante a oclusão expiratória),
o Eadi poderia permitir uma avaliação respiração a respiração de Pmus durante o
ciclo respiratório normal.
2.4 Pela avaliação do diafragma
pela ultrassonografia. A técnica de ultrassom de diafragma é
não invasiva, fácil de executar e reproduzível. A variação na espessura do
diafragma durante o ciclo respiratório (fração de espessamento, TFdi) está
correlacionada à geração de pressão respiratória e EAdi e pode ser usada para
detectar fraqueza do diafragma. Valores de TFdi inferiores a 30% durante um
esforço inspiratório máximo detectam fraqueza do diafragma com alta
sensibilidade. A medição diária da espessura do diafragma expiratório final
pode detectar mudanças estruturais nos músculos respiratórios. Em pacientes
ventilados mecanicamente, um aumento progressivo na espessura do diafragma ao
longo do tempo foi correlacionado ao esforço excessivo e pode representar miotrauma
subassistido. O TFdi de 15-30% durante a ventilação corrente foi associado à
espessura do diafragma estável e à duração mais curta da ventilação. O
ultrassom é melhor usado para avaliações intermitentes de pacientes, pois não é
adequado para monitoramento contínuo.
Em julho de 2020, Jose
Dianti, Michele Bertoni e Ewan C. Golighe, publicaram uma revisão
sobre a manobra de oclusão expiratória para avaliar o ΔPocc[18].
Quando uma oclusão
expiratória final das vias aéreas é aplicada aleatoriamente durante um único
esforço inspiratório (ou até 5s), o esforço respiratório espontâneo do paciente
durante a oclusão irá gerar uma deflexão de pressão negativa na pressão das
vias aéreas que “desmascara” o esforço da musculatura respiratória (Fig. 9).
A magnitude da deflexão de pressão negativa durante a oclusão (ΔPocc) está
correlacionada com a Pmus durante respirações assistidas mecanicamente, porque
uma única oclusão expiratória final aplicada de forma intermitente ao acaso
para uma única respiração não altera a magnitude da ativação do diafragma.
Fig 9. Traçados
representativos mostrando a) a manobra de oclusão das vias aéreas em um
paciente com respiração espontânea em repouso, e b) dois pacientes com duplo
disparo; um resultante do disparo reverso e outro resultante da dissociação
entre o tempo inspiratório neural e o mecânico. A pressão nas vias aéreas (Paw),
o fluxo, a pressão esofágica (Pes) e a pressão transpulmonar (PL) foram registrados
durante a manobra de oclusão expiratória. ∆Pocc representa a oscilação
inspiratória na pressão das vias aéreas contra uma via aérea obstruída. A Pes
representa a pressão esofágica. O delta de pressão transpulmonar dinâmica (∆PLdyn)
representa o estresse mecânico dinâmico aplicado ao pulmão durante a
inspiração. Ao aplicar fatores de correção previamente validados, os médicos
podem usar ∆Pocc para estimar o esforço muscular respiratório (Pmus) e ∆PLdyn.
No painel b, durante a pausa expiratória, não há esforço respiratório do
paciente com disparo reverso, significando que o duplo disparo está ocorrendo
na ausência de impulso respiratório espontâneo. Por outro lado, um esforço
inspiratório pode ser visto durante a espera no traçado de outros pacientes
Usando este método
simples, os médicos podem detectar (a) esforço respiratório excessivo a partir
do valor estimado para Pmus, (b) esforço respiratório ausente durante a apneia
(sem deflexão de pressão durante a oclusão de 5s), e (c) estresse pulmonar
excessivo durante a respiração espontânea a partir do valor estimado para ∆PLdyn.
Assim, os principais
parâmetros que refletem o risco potencial de diafragma e lesão pulmonar podem
ser detectados de forma rápida e confiável medindo o ΔPocc. A manobra também
pode ser usada para monitorar pacientes que recebem bloqueio neuromuscular para
confirmar a ausência de esforço respiratório, se não houver deflexão negativa
na pressão das vias aéreas durante uma oclusão de 5s (ou seja, ΔPocc = 0 cm H2O),
a paralisia adequada provavelmente foi alcançada. A sensibilidade dessa
abordagem ainda não foi comparada diretamente com outros métodos comumente
usados para avaliar a adequação do bloqueio neuromuscular (ou seja,
estimulação nervosa periférica).
Finalmente, uma oclusão
expiratória pode diferenciar várias dissincronias. Por exemplo, a oclusão
expiratória pode desmascarar o acionamento ineficaz se a frequência
respiratória intrínseca do paciente for muito mais alta durante a oclusão do
que é aparente durante as respirações assistidas. Quando a ciclagem dupla é
observada, uma oclusão expiratória final revelará se isso resulta de esforço
inspiratório excessivo e prolongado ou de disparo reverso (neste caso, o
paciente geralmente estará apneico durante a pausa). Se o ventilador parecer
ter sido disparado pelo paciente, mas não houver esforços respiratórios durante
a oclusão, é provável que haja um autodisparo.
O método, entretanto, tem
limitações. Primeiro, embora Δpocc possa ser usado para detectar com precisão o
excesso de Pmus e ∆PLdyn, os valores estimados desses parâmetros são imprecisos
e não podem substituir a medição direta se a precisão for necessária. Em
segundo lugar, a ausência de esforço respiratório durante a oclusão não exclui
a presença de esforço respiratório de desencadeamento reverso. Finalmente, a
hiperinsuflação dinâmica e a PEEP intrínseca podem levar à subestimação do
esforço, particularmente se a PEEP intrínseca não estiver equilibrada contra a
via aérea obstruída.
Em novembro de 2020, Ewan
C. Goligher e colaboradores, também do grupo canadense publicam revisão
sobre estratégias clínicas para implementar ventilação de proteção pulmonar e diafragmática,
evitando esforço insuficiente e excessivo[19].
Referem que a ventilação
protetora pulmonar pode ser melhor compreendida em termos de limitação do stress
mecânico global e regional (pressão aplicada ao pulmão) e do strain (deformação
da forma em repouso). A lesão pulmonar pode ocorrer por hiperdistensão
(volutrauma/barotrauma), recrutamento tidal cíclico (atelectrauma), ambos
resultantes da insuflação heterogênea de alvéolos colapsados. É importante
ressaltar que a lesão pulmonar pode ocorrer independentemente de o ventilador
(lesão pulmonar induzida pelo ventilador, VILI), esforço respiratório do
paciente (lesão pulmonar autoinfligida pelo paciente, P-SILI), ou ambos juntos
estão gerando as forças aplicadas ao pulmão (Fig.10).
Fig. 10 Princípios da
ventilação protetora pulmonar e do diafragma. ΔP: mudança na pressão das vias
aéreas durante a inspiração; PEEP: pressão expiratória final positiva; P-SILI:
lesão pulmonar autoinfligida pelo paciente; VILI: lesão pulmonar induzida por
ventilador; VT: volume corrente
Medidas para monitorar o stress
pulmonar à beira do leito estão disponíveis (pressão transpulmonar, driving
pressure), mas não para medir a deformação resultante, tornando difícil
individualizar adequadamente as configurações de ventilação mecânica para
maximizar a proteção pulmonar. Além disso, mesmo que o stress global possa ser
medido com bastante precisão usando a pressão transpulmonar calculada a partir
da pressão das vias aéreas e esofágica, o efeito da gravidade no pulmão
edemaciado torna a distribuição do colapso e da aeração muito desigual entre as
regiões pulmonares dependentes e não dependentes; portanto, os índices globais
não refletem stress ou tensão regional. Para minimizar o stress e a tensão
totais, as regiões dependentes (geralmente com tendência à atelectasia) geralmente
requerem recrutamento, enquanto as regiões não dependentes (geralmente bem
ventiladas) requerem o alívio da hiperdistensão.
Durante a ventilação
invasiva, o volume corrente (VT) é rotineiramente calculado com base no peso
corporal predito (PBW), que se correlaciona com o volume pulmonar em indivíduos
saudáveis. Essa correlação é muito menos precisa em pacientes com síndrome do
desconforto respiratório agudo (SDRA) por causa de inundação alveolar e
atelectasia, resultando em um “baby lung” muito menor do que o volume pulmonar
previsto. Usar a driving pressure (Δpaw) para estimar o volume corrente (VT) em
razão da complacência do sistema respiratório [Driving Pressure (Δpaw) = VT/Crs)
é particularmente atraente porque a Crs é afetada pelo tamanho do pulmão aerado
e poderia, portanto, refletir melhor a tensão global (VT/baby lung). A driving
pressure (Δpaw) se correlaciona com os resultados da SDRA entre pacientes com o
mesmo VT/PBW e pode ser útil para guiar a ventilação, embora seu papel ainda
precise ser testado em um estudo prospectivo. Deve-se reconhecer que a pressão
estática das vias aéreas não é um marcador muito confiável de stress pulmonar
(tanto na inspiração final quanto na expiração), porque reflete as
contribuições tanto do pulmão quanto da parede torácica (duas pressões atuando
em série). Pacientes obesos são um exemplo em que existe alta pressão
intratorácica (e, portanto, maior pressão de platô) devido ao peso imposto pela
parede torácica. O stress pulmonar é preferencialmente medido pela pressão
transpulmonar (PL), que permite quantificar a contribuição do pulmão e da parede
torácica para mudanças na pressão das vias aéreas.
O diafragma é o músculo
principal de inspiração e os músculos da parede abdominal lateral são os
músculos expiratórios mais proeminentes. A ventilação mecânica é empregada para
aliviar a bomba muscular respiratória e limitar as consequências do alto
esforço respiratório (por exemplo, sensação de dispneia, insuficiência
respiratória, possível lesão muscular respiratória). No entanto, a ventilação
mecânica fornecida como a fonte respiratória predominante também pode levar à
atrofia do diafragma e lesões com um impacto deletério substancial no desfecho
do paciente. Estudos clínicos demonstram que após 24 horas de ventilação
mecânica, 64% dos pacientes apresentam fraqueza do diafragma e no momento do
desmame, a fraqueza do diafragma está presente em até 80% dos pacientes com
dificuldades de desmame. Embora muitos fatores contribuam para a fraqueza do
diafragma em pacientes em estado crítico, a descarga excessiva ou insuficiente
do músculo respiratório resulta rapidamente em alterações deletérias na
estrutura e função do diafragma. O baixo esforço muscular respiratório, devido à
assistência excessiva do ventilador ou sedação, pode resultar em atrofia
muscular, enquanto o alto esforço foi associado a lesão induzida por carga. Em
um estudo marcante, Levine et al. demonstraram o desenvolvimento de atrofia por
desuso do diafragma em pacientes com morte encefálica em ventilação mecânica
controlada e estudos subsequentes confirmaram a presença de atrofia de fibras
dependente do tempo no diafragma de pacientes ventilados. Em consonância com
esses achados, estudos de ultrassom demonstraram que o baixo esforço do
diafragma durante a ventilação mecânica está associado ao desenvolvimento de
atrofia dependente do tempo e que a atrofia está associada a resultados ruins.
Pode-se supor que os pacientes correm o risco de desenvolver lesão do diafragma
induzida por esforço, como sugerido pela presença de lesão da fibra, ruptura
sarcômera, inflamação e disfunção contrátil em biópsias e aumento agudo da
espessura do diafragma na ultrassonografia. Esta hipótese requer confirmação
adicional. Juntas, essas considerações sugerem que o diafragma pode ser
protegido por ventilação titulada e sedação para restaurar a atividade inicial
do diafragma, evitando o esforço respiratório excessivo. As várias linhas de
evidências fisiológicas e clínicas que sugerem que um nível de esforço
respiratório semelhante ao da respiração tranquila em repouso é provavelmente
ideal para proteção do pulmão e do diafragma.
ESTRATÉGIAS
DE MONITORAMENTO
Para implementar a
ventilação mecânica com proteção pulmonar e diafragmática, as variáveis
mediadoras da lesão, principalmente o stress pulmonar e o esforço
respiratório, devem ser monitorados. As técnicas de monitoramento disponíveis,
suas vantagens e desvantagens e as metas específicas propostas estão resumidas
na Tabelas 1.
TABELA 1: OPÇÕES PARA MONITORAR ESTRATEGIA PROTETORA
Parâmetro |
Faixa
aceitável |
Volume Tidal ou Corrente (VT ou
VC) Pressão de Platô (Pplat) |
VT: 4–8 ml/kg de peso
predito Pplat: ≤ 28-30 cmH2O |
Driving Pressure (ΔP) |
ΔP < 15 cmH2O |
Curvas e alças de volume,
pressão e fluxo |
Detectar assincronias |
Pressão de oclusão nos 100
primeiros milissegundos (P0.1) |
1 a 4 cmH2O |
Pressão muscular (Pmus) e Delta
de Pressão Transpulmonar Dinâmica prevista pelo Δpocc |
Pmus predita: 5 a 10cmH2O (Δpooc:
8 a 20 cmH2O) ΔPLdyn predita < 15–20 cmH2O |
Pressão esofágica (Pes) e Pressão
Transpulmonar (PL) |
ΔPes 3–15 cmH2O (proteção do
diafragma) ΔPL,dyn < 15–20 cmH2O (proteção pulmonar) |
Pressão Transdiafragmática (ΔPdi)
e Transgástrica (ΔPga) |
ΔPdi–15 cmH2O |
Fração de espessamento do
diafragma (TFdi) |
TFdi 15–30% |
Atividade Elétrica do Diafragma
(EAdi) |
Normalizar EAdi alvo com base no Pocc, ΔPdi ou ΔPes |
A driving pressure (ΔPaw= Pplat – PEEP), é uma medida que visa estimar o stress pulmonar corrente global. ΔPaw pode ser medido durante a ventilação controlada ou assistida por oclusões inspiratórias e expiratórias finais curtas manuais ou automatizadas. Importante, ΔPaw é determinado pela pressão de condução transpulmonar (ΔPL) e pressão de condução através da parede torácica (ΔPcw); assim, as mudanças na elastância da parede torácica afetam Δpaw, sem afetar o stress pulmonar. Como pendelluft e variações regionais no stress pulmonar são fenômenos “dinâmicos” que não podem ser detectados em condições estáticas, o risco de estresse pulmonar regional excessivo durante a respiração assistida pode ser estimado com mais precisão pela ΔPL dinâmica (ΔPLdyn = PL no final da inspiração – PL no final da expiração) ao invés de medidas estáticas como ΔPaw. O monitoramento da pressão esofágica (Pes) como uma estimativa da pressão pleural, pode fornecer informações sobre a predisposição para o colapso expiratório final e atelectasia (PL expiratório final) e hiperdistensão alveolar no baby lung (PL platô derivada da elastância).
Monitorar e controlar o
esforço muscular respiratório são os maiores desafios na implementação da
ventilação mecânica protetora de pulmão e diafragma. O padrão ouro para
quantificar o esforço muscular respiratório global é o produto pressão-tempo
esofágico (PTP), enquanto o PTP da pressão transdiafragmática (Pdi, ou seja, a
diferença entre a pressão gástrica (Pga) e Pes) durante a inspiração fornece
uma medida do esforço diafragmático. A amplitude da Pes ou Pdi durante a
respiração corrente fornece uma estimativa simples da pressão gerada por todos
os músculos respiratórios (Pes), ou diafragma (Pdi), enquanto o aumento
expiratório em Pga reflete a atividade muscular expiratória. A atividade
elétrica do diafragma (EAdi) é o substituto mais preciso do impulso
respiratório e se correlaciona com os índices de esforço, mas com considerável
variabilidade entre os pacientes. Além disso, os valores de pico de EAdi em
indivíduos jovens saudáveis durante a respiração corrente podem variar entre
4 e 29 μV. No entanto, as alterações no EAdi são úteis para monitorar as
alterações no impulso e esforço respiratório do paciente, especialmente para
identificar pacientes em risco de assistência excessiva do ventilador.
Finalmente, Pes ou EAdi podem complementar a análise da forma de onda do
ventilador para facilitar a identificação de dissincronias paciente-ventilador.
Outras técnicas menos
invasivas estão disponíveis para monitorar os esforços respiratórios do
paciente durante a ventilação mecânica à beira do leito. A P0.1, é uma
estimativa do impulso respiratório e pode ser usada para detectar esforços
muito baixos e altos. A deflexão máxima da Paw durante uma oclusão respiratória
completa (ΔPocc) é usada para detectar com precisão a pressão muscular
respiratória excessiva (Pmus) e a ΔPLdyn. Esta manobra também
pode ser usada para avaliar diferentes formas de dissincronia
paciente-ventilador. O ultrassom pode ser usado para visualizar e quantificar o
espessamento do diafragma durante a inspiração na zona de aposição (fração de
espessamento, TFdi. TFdi fornece um índice de contratilidade diafragmática e se
correlaciona razoavelmente bem com o esforço inspiratório (ΔPes) e EAdi.
ESTRATÉGIAS
CLÍNICAS PARA FACILITAR A VENTILAÇÃO PROTETORA DO PULMÃO E DO DIAFRAGMA
Diversas estratégias
podem ser utilizadas para facilitar a ventilação protetora pulmonar e
diafragmática, incluindo modulação da assistência inspiratória e expiratória do
ventilador, drogas que modificam o impulso e/ou esforço respiratório, remoção
extracorpórea de CO2 (ECCO2R) e estimulação elétrica dos músculos respiratórios.
Uma abordagem de
ventilação protetora do pulmão e do diafragma visa minimizar o stress e a
tensão pulmonar, ao mesmo tempo que limita a atrofia e as lesões do diafragma.
Para atingir esses objetivos, as configurações do ventilador inspiratório podem
ser ajustadas para (1) modular o esforço inspiratório do paciente, (2) minimizar
o stress pulmonar dinâmico e (3) prevenir ou corrigir a dissincronia
paciente-ventilador ou qualquer forma de incompatibilidade entre necessidades e
suporte.
Ajuste de Parâmetros
Inspiratórios.
A titulação das
configurações do ventilador inspiratório para otimizar o esforço respiratório
requer uma compreensão completa do controle da respiração sob ventilação
mecânica, reconhecendo que o controle do sistema respiratório responde às mudanças
nas demandas ventilatórias, modificando o esforço inspiratório (e, portanto, o
volume corrente) em maior extensão do que a frequência respiratória. Portanto,
as configurações do ventilador inspiratório afetarão o esforço inspiratório ao
modificar o volume corrente fornecido. Bom lembrar que o ´principal estímulo do
centro respiratório é o aumento do CO2 (hipercapnia) que produz aumento da FR
(taquipneia) na tentativa de “lavar” CO2. Por outro lado, hipoxemia grave
(<60mmH2O) se converte em potente estímulo do centro respiratório através de
quimiorreceptores localizados nos corpúsculos carotídeos (estímulo hipoxico) gerando
dispneia e esforço muscular respiratório.
Em pacientes com
respiração espontânea, aumentar a pressão ou o volume assistido aumentará o
volume corrente fornecido e reduzirá o esforço inspiratório ao reduzir o CO2 em
razão do aumento do VT (já que o impulso respiratório depende principalmente do
controle quimiorreflexo do pH arterial). A assistência excessiva, resultando em
um volume corrente superior às demandas do paciente, pode quase anular o esforço
inspiratório do paciente e, como tal, promover atrofia diafragmática. No
entanto, aumentar o suporte inspiratório pode não atenuar o esforço
inspiratório na presença de impulso respiratório alto devido a estímulos
diferentes do pH/CO2 arterial; como dor, ansiedade ou estimulação de receptores
pulmonares periféricos por edema pulmonar ou inflamação. Nesse caso, a pressão
transpulmonar (e, portanto, o stress pulmonar dinâmico) pode aumentar
progressivamente com o aumento do suporte inspiratório.
Em um modo de volume
direcionado, o esforço do paciente será modificado principalmente pelo volume
corrente definido e o perfil de fornecimento de fluxo (padrão de fluxo e pico
de fluxo). Nos modos de pressão direcionada, o volume corrente fornecido e,
portanto, o esforço inspiratório do paciente, é influenciado pela pressão
inspiratória definida, pelo tempo de subida e pelo critério de ciclagem e,
claro, pelas propriedades mecânicas do sistema respiratório. Independentemente
do modo de assistência, o volume corrente administrado e o esforço respiratório
juntos determinarão o stress pulmonar global e regional, dependendo das propriedades
mecânicas do sistema respiratório.
Ajuste de FiO2
O aumento da FiO2 para
aumentar a PaO2 e reduzir o estímulo hipóxico, pode aliviar o aumento do
impulso respiratório em alguns pacientes (mas, hiperoxemia não é necessária
para atingir esse efeito).
Ajuste do drive
respiratório
A assistência
ventilatória ajustada neuralmente (NAVA) fornece assistência inspiratória
proporcional à atividade elétrica do diafragma. O aumento da assistência
inspiratória reduzirá a atividade elétrica do diafragma (e vice-versa) em uma
ampla faixa de demanda respiratória e, consequentemente, o volume corrente
permanece relativamente estável em uma ampla faixa de assistência. Em teoria,
os mecanismos de reflexo pulmonar evitam que os pacientes inspirem
espontaneamente grandes volumes correntes e o NAVA pode, portanto, facilitar a
ventilação de proteção pulmonar. Além disso, a inatividade do diafragma devido
à assistência excessiva é improvável no NAVA, pois a baixa atividade do
diafragma reduzirá imediatamente a assistência inspiratória. Estudos futuros
devem confirmar o papel do NAVA na ventilação protetora de pulmão e diafragma,
mas estudos randomizados recentes sugerem benefício clínico do NAVA (tempo
reduzido no ventilador) em comparação ao modo de suporte de pressão.
Ajuste de parâmetros
expiratórios
A pressão positiva expiratória
final positiva (PEEP) tem sido tradicionalmente ajustada para otimizar a oxigenação
e/ou a mecânica pulmonar. Uma estratégia de ventilação com PEEP mais alta (das
quais existem várias, geralmente resultando em 15 ± 4 cmH2O) é atualmente
recomendada em relação à PEEP mais baixa (aproximadamente 9 ± 3 cmH2O) na SDRA
moderada e grave. Na presença de respiração espontânea durante a ventilação
mecânica, uma estratégia de PEEP mais alta oferece várias vantagens
potenciais adicionais para facilitar a ventilação protetora de pulmão e
diafragma. Em primeiro lugar, em pacientes com recrutabilidade pulmonar
significativa, a PEEP reduz a quantidade de pulmão “sólido” atelectásico e,
portanto, pode atingir uma distribuição mais homogênea da oscilação da pressão
pleural corrente (∆Ppl) em toda a superfície pulmonar após uma contração
diafragmática. A distribuição uniforme do estresse dinâmico inspiratório pode
diminuir a insuflação assimétrica prejudicial associada ao esforço espontâneo
(ou seja, pendelluft), reduzindo o estresse pulmonar regional em regiões
pulmonares dependentes. Em segundo lugar, ao aumentar o volume pulmonar
expiratório final, forçando o diafragma a operar em um comprimento menor e,
assim, prejudicando o acoplamento neuromuscular do diafragma, o aumento da PEEP
pode atenuar a força gerada pela contração diafragmática. De fato, vários
estudos clínicos fornecem evidências indiretas para sugerir que a PEEP mais
alta pode tornar o esforço espontâneo menos prejudicial em pacientes com
insuficiência respiratória aguda antes da intubação, em pacientes com SDRA e em
pacientes pediátricos com lesão pulmonar. Por outro lado, evidências
experimentais preliminares sugerem que se o diafragma for mantido em um
comprimento mais curto durante a ventilação mecânica, as fibras musculares do
diafragma poderiam se adaptar ao comprimento reduzido absorvendo sarcômeros em
série (isto é, atrofia longitudinal). Isso pode resultar em alongamento
excessivo das fibras com a redução posterior de PEEP durante uma tentativa de
desmame do tubo T ou após a extubação. A possibilidade de fraqueza do diafragma
resultante do excesso de PEEP deve, portanto, ser considerada.
Resolvendo assincronias
As assincronias
paciente-ventilador podem causar lesão pulmonar e/ou diafragmática, aumentando
o estresse pulmonar dinâmico e/ou contrações diafragmáticas lesivas, respectivamente.
As assincronias podem ocorrer durante a inspiração (falta de fluxo, ciclos
curtos, insuflação prolongada e disparo reverso), durante a expiração (auto
disparo, esforço ineficaz) ou ambos durante a inspiração e expiração (disparo
reverso e disparo duplo).
O disparo reverso, decorre
de uma contração diafragmática desencadeada por insuflação mecânica, é comum em
pacientes totalmente sedados (nos quais o impulso é abolido). O disparo reverso
pode provocar empilhamento de volumes, resultando em volumes correntes
excessivos e alto stress pulmonar dinâmico, e pode criar condições de carga
excêntrica do diafragma com lesão muscular resultante. Quando necessário para
evitar o empilhamento, o disparo reverso pode ser abolido por agentes
bloqueadores neuromusculares. Alternativamente, o desenvolvimento do disparo
reverso pode indicar que a sedação deve ser interrompida para permitir que o
paciente assuma o controle da ventilação.
Em pacientes com impulso
respiratório relativamente alto e baixa constante de tempo do sistema
respiratório, o tempo de inspiração neural pode exceder a inflação mecânica (ciclagem
precoce). Nesses casos, a contração dos músculos inspiratórios continua durante
a expiração mecânica e o diafragma é forçado a se contrair durante o alongamento
(contração excêntrica). Nos modos direcionados ao volume, altas demandas não
atendidas aparecem como “falta de fluxo”, uma curvatura para baixo da Paw
inspiratória, e o paciente pode sentir dispneia e desconforto, que podem ser
resolvidos aumentando a taxa de fluxo inspiratório usando um padrão de fluxo desacelerado.
Fortes esforços inspiratórios podem resultar em duplo disparo e empilhamento,
portanto, entrega de altos volumes correntes. Uma melhor combinação do tempo
inspiratório mecânico e neural pode ser obtida aumentando o tempo inspiratório
do ventilador e usando um padrão de fluxo desacelerado no modo de volume
controlado, diminuindo o critério de ciclagem no modo de pressão de suporte ou
usando modos proporcionais de assistência. É importante ressaltar que em
pacientes com alto impulso respiratório, a modificação do tempo inspiratório
pode não ser suficiente para resolver a dissincronia. O aumento do nível de
assistência para atender às demandas do paciente deve ser considerado, mas, se
isso resultar em uma alta ventilação prejudicial, outros meios para diminuir o
impulso respiratório do paciente, como sedação, podem ser necessários.
Outra assincronia que
ocorre em pacientes com drive respiratório ausente ou baixo é o auto disparo,
ou seja, disparo do ventilador na ausência de esforço do paciente. Pode ocorrer
devido a fortes oscilações cardíacas transmitidas à Paw ou quando a constante
de tempo do sistema respiratório é baixa, como na SDRA. Vazamentos de ar e
umidade no circuito do ventilador também são causas comuns de auto disparo.
O disparo ineficaz (ou
esforços ineficazes) ocorre quando o esforço do paciente falha em disparar a
respiração fornecida pelo ventilador. O desencadeamento ineficaz é geralmente a
consequência de esforços inspiratórios fracos, seja por baixo impulso
respiratório devido à sedação, alcalose metabólica ou assistência ventilatória
excessiva, ou por fraqueza do diafragma. Quando a constante de tempo do sistema
respiratório é alta (ou seja, DPOC), a assistência excessiva do ventilador
resulta em ciclagem tardia, hiperinsuflação dinâmica e aumento da PEEP
intrínseca, predispondo ao disparo ineficaz. Diminuir o nível de assistência
pode, portanto, aliviar esforços ineficazes. A assistência excessiva na
ventilação assistida também pode induzir apneias durante o sono. Curiosamente,
vários estudos demonstraram que o NAVA melhora a interação paciente-ventilador,
especialmente reduzindo os riscos de esforços ineficazes e assistência
excessiva. Se a duração reduzida da ventilação mecânica relatada em alguns
estudos NAVA resulta da melhora da interação paciente-ventilador ainda precisa
ser investigado.
Estratégias de sedação
A supressão completa do
impulso respiratório e do esforço com sedação também pode contribuir para a
atrofia por desuso do diafragma. Diretrizes de prática clínica recentes
recomendaram uma abordagem de “primeira analgesia” para minimizar o risco de
sedação excessiva, uma vez que os opioides durante a ventilação mecânica foram associados
a menos assincronia e consciência deprimida em comparação com abordagens
baseadas em sedativos. No entanto, quando o impulso respiratório elevado não
pode ser resolvido de outra forma, os sedativos podem atenuar a resposta
ventilatória à hipoxemia e hipercapnia e a entrada cortical para os centros
respiratórios. Propofol e benzodiazepínicos são agonistas do ácido
gama-aminobutírico (GABA) conhecidos por causar depressão respiratória,
principalmente por reduzir a amplitude do esforço respiratório. Devido a que os
benzodiazepínicos estão associados a um alto risco de delírio e ventilação
mecânica prolongada, o propofol é o sedativo de escolha para controlar o
impulso respiratório alto. Como o propofol ou os benzodiazepínicos reduzem a
amplitude do esforço inspiratório, um disparo ineficaz pode se desenvolver à
medida que a profundidade da sedação aumenta. A sedação inalatória oferece uma
alternativa potencial para controlar o esforço respiratório, embora a
experiência clínica seja limitada até o momento. Para evitar sedação excessiva,
estratégias voltadas para titulação ativa de sedativos ou interrupção diária da
sedação devem ser empregadas e o impulso respiratório e o esforço devem ser
monitorados de perto.
Para pacientes sem
esforço respiratório excessivo, uma abordagem de analgesia multimodal que
minimiza o uso de opiáceos é recomendada para evitar a inatividade do
diafragma. A dexmedetomidina é um agonista alfa-2 seletivo que, ao contrário do
propofol e dos benzodiazepínicos, fornece sedação, ansiólise e analgesia sem
depressão respiratória. Essa propriedade o torna uma droga interessante de
escolha para preservar a consciência e a contratilidade do diafragma e, ao
mesmo tempo, limitar o risco excessivo de delirium em pacientes agitados sem
impulso respiratório elevado.
Posicionamento em Prona
A posição prona tem sido
usada há décadas no início da SDRA para melhorar a oxigenação e, com o tempo,
surgiu uma apreciação do benefício da proteção pulmonar do posicionamento prono.
Como a quantidade de tecido pulmonar é maior nas regiões dorsais do pulmão, as
forças gravitacionais geram mais atelectasia dependente na posição supina do
que na prona. Portanto, a correspondência ventilação-perfusão é melhorada na
posição prona e, mais importante, a energia aplicada ao pulmão pela ventilação
mecânica é distribuída entre mais alvéolos (não atelectáticos), reduzindo o stress
pulmonar. Esta é a suposta base para o benefício de mortalidade observado do
posicionamento prono em pacientes com SDRA. Os benefícios do posicionamento
prona também podem ser aplicados sob ventilação assistida com respiração
espontânea, porque o recrutamento pulmonar acumulado pelo posicionamento prona
pode atenuar o comportamento pulmonar “sólido” e reduzir o stress pulmonar
regional dependente do esforço. O posicionamento prono melhora a oxigenação em
pacientes com respiração espontânea e pneumonia por COVID-19; é possível que o posicionamento
prono também reduza o risco de lesão pulmonar autoinfligida pelo paciente.
Assim, o posicionamento prono pode facilitar a respiração espontânea segura e a
ventilação com proteção do diafragma, bem como a proteção pulmonar.
Fig
11. Mapa
de intervenções para obter ventilação mecânica protetora de pulmão e diafragma.
ECCO 2 R: remoção extracorpórea de dióxido de carbono
ABORDAGENS
FUTURAS PARA VENTILAÇÃO DE PROTEÇÃO MUSCULAR PULMONAR E RESPIRATÓRIA
Remoção extracorpórea de
dióxido de carbono (ECCO2R)
Eliminar o CO2 é o
objetivo principal da ventilação alveolar. O ECCO2R reduz as demandas
ventilatórias, diminuindo o esforço respiratório e, portanto, pode melhorar o
estresse pulmonar dinâmico. ECCO2R é viável e eficaz na redução do volume
corrente, driving pressure e mechanical power em pacientes com SDRA. Em
pacientes com respiração espontânea, o ECCO2R pode amortecer o impulso e o
esforço respiratório, teoricamente reduzindo a necessidade de suporte
ventilatório ou sedação para controlar o esforço respiratório. Karagiannidis et
al. mostraram que o aumento do fluxo de gás de varredura, aumentando a
eliminação de CO2, em pacientes com SDRA submetidos à oxigenação por membrana
extracorpórea (ECMO), reduziu o drive respiratório, estimado por EAdi. Mauri et
al. também mostraram que um suporte mais elevado de ECCO2R reduziu a P 0.1, o
esforço muscular respiratório e a pressão transpulmonar em pacientes com
respiração espontânea em recuperação de SDRA grave. Estudos clínicos piloto
exploraram a possibilidade extrema de extubar pacientes com SDRA grave logo
após a intubação por meio de ECCO2R: os resultados preliminares foram
encorajadores, mas eles também reconheceram a necessidade de identificar o
subgrupo de pacientes com alta probabilidade de sucesso. Apesar do apelo e da
lógica fisiológica desta estratégia, existem limitações relevantes. Em primeiro
lugar, em alguns pacientes, os estímulos não quimiorreceptivos (dor, agitação,
desconforto, acidose metabólica, estímulos mecânicos pulmonares) podem
predominar e o impulso respiratório elevado pode persistir apesar do ECCO2R. Em
segundo lugar, ECCO2R requer anticoagulação total e o risco de sangramento não
é insubstancial. Terceiro, a aplicação de ECCO2R pode exacerbar a hipoxemia por
vários mecanismos.
Bloqueio neuromuscular
parcial
O bloqueio neuromuscular
completo pode aumentar o risco de atrofia por desuso do diafragma e aumenta a
necessidade de sedação. Os bloqueadores neuromusculares de baixa dosagem
(“bloqueio neuromuscular parcial”) são uma possibilidade interessante entre a
paralisia total e os esforços respiratórios extenuantes, principalmente quando
o esforço respiratório responde de forma inadequada à titulação do suporte
ventilatório ou à sedação. A viabilidade do bloqueio neuromuscular parcial foi
avaliada em um estudo em pacientes com SDRA moderada e impulso respiratório
alto em modos parcialmente suportados. A titulação de rocurônio diminuiu o
volume corrente de aproximadamente 9 mL/kg para aproximadamente 6 mL/kg,
mantendo o Pdi em aproximadamente 5 cmH2O (dentro da faixa fisiológica da atividade
do diafragma em indivíduos saudáveis). Esses achados preliminares sugerem que o
bloqueio neuromuscular parcial pode ser uma abordagem viável para atingir as
metas de ventilação de proteção do pulmão e do diafragma em pacientes com alto
esforço respiratório. É importante ressaltar que o bloqueio neuromuscular
parcial não reduz o impulso respiratório, mas apenas as consequências mecânicas
do impulso alto. Essa dissociação entre o impulso central e o débito mecânico
dos músculos respiratórios pode resultar em dispneia. O alívio adequado da
dispneia e do desconforto deve ser garantido pela aplicação criteriosa de
sedativos e opioides. Estudos clínicos futuros devem confirmar a segurança e
eficácia do bloqueio neuromuscular parcial prolongado em pacientes ventilados.
Estimulação neuromuscular
A estimulação
neuromuscular (“pacing”) utiliza correntes elétricas para gerar contração
muscular na ausência de esforços voluntários, tornando-se uma intervenção
atraente em pacientes criticamente enfermos incapacitados. Há um interesse
crescente na estimulação neuromuscular como uma nova estratégia para preservar
ou restaurar a atividade dos músculos respiratórios e, por sua vez, prevenir ou
tratar a fraqueza do diafragma adquirida na UTI. Além disso, ao induzir as
contrações do diafragma, a estimulação neuromuscular pode melhorar a aeração
pulmonar de regiões pulmonares dependentes. A estimulação deve ser sincronizada
com o ventilador e esforços inspiratórios potencialmente prejudiciais devem ser
evitados.
Ainda não há evidência
clínica de benefício da estimulação do diafragma em pacientes de UTI. A
estimulação direta dos nervos frênicos por eletrodos implantados cirurgicamente
tem sido empregada para restaurar a ventilação espontânea em pacientes com lesão
medular de alto nível e síndrome de hipoventilação central. A viabilidade da
estimulação direta usando eletrodos implantados temporariamente para a prevenção
da disfunção do diafragma está atualmente sob investigação em pacientes de
cirurgia cardíaca identificados como estando em risco de ventilação mecânica
prolongada (NCT04309123). O trabalho pré-clínico mostrou que esta técnica pode
reduzir o desenvolvimento de atrofia das fibras do diafragma tipo II. Recentemente,
Reynolds et al. apresentaram uma primeira série em humanos de estimulação do
nervo frênico transvenosa temporária em pacientes cirúrgicos e mostrou que essa
tecnologia proporcionava contrações do diafragma seguras e eficazes. Esta
estratégia está sendo estudada atualmente como uma intervenção potencial para
melhorar a força do diafragma em pacientes de difícil desmame (NCT03096639). O
papel da estimulação do nervo frênico transvenoso para a prevenção da atrofia
por desuso do diafragma ainda precisa ser investigado.
As estratégias de
estimulação neuromuscular direcionadas aos músculos expiratórios de pacientes
de UTI são menos estudadas. Isso é surpreendente, pois a estimulação dos
músculos expiratórios da parede abdominal pode ser empregada de forma não
invasiva por meio de eletrodos de superfície colocados sobre a parede
abdominal. A viabilidade de uma técnica de estimulação muscular expiratória
sincronizada com a respiração durante a fase inicial da ventilação mecânica foi
recentemente demonstrada com resultados promissores e sua eficácia está sob
investigação (NCT03453944).
Fig 12. Vias clínico-fisiológicas para atingir as metas de ventilação de proteção do pulmão e do diafragma. ΔP: mudança na pressão das vias aéreas durante a inspiração; P0.1 : diminuição da pressão das vias aéreas durante os primeiros 100 ms de esforço inspiratório contra uma via aérea ocluída; PaCO2: pressão arterial de dióxido de carbono; PEEP: pressão expiratória final positiva; Pes: pressão esofágica; PL : pressão transpulmonar; Pocc: deflexão da pressão das vias aéreas durante uma oclusão expiratória; FR: frequência respiratória; VT: volume corrente.
Mais recentemente em
fevereiro de 2021, Lisanne Roesthuis e col., também do grupo
canadense, publica estudo observacional em que avaliaram métodos não invasivos
para detectar alto esforço respiratório e pressões de condução transpulmonares
em pacientes COVID-19 durante a ventilação mecânica[20].
O delta de pressão transpulmonar
dinâmica (∆PLdyn) e a Pressão muscular (Pmus) foram estimadas em pacientes com
COVID-19 internados na Unidade de Terapia Intensiva do Radboud University
Medical Center, de acordo com as formulas Bertoni et al. da seguinte forma:
(1) ∆PLdyn predito = (Ppi - PEEP) —2/3 × ∆Pocc.
(2) Pmus = - 3/4 × ∆ Pocc.
Se os pacientes tivessem
alto esforço respiratório e/ou alta pressão transpulmonar dinâmica (Pmus
calculado ≥ 13-15 cmH2O e ∆PLdyn ≥ 16-17 cmH2O), ventilação mecânica prolongada
sem progresso clínico (ou seja, ≥ 14 dias) ou permaneceram hipercápnicos (PaCO2
≥ 60 mmHg), a manometria esofágica foi obtida como parte do protocolo clínico
padrão. Para o cálculo do ∆Pocc um total de 3–4 oclusões expiratórias manuais
(com duração de ~ 1–2 s) foram realizadas durante um registro de 10–15 minutos
por paciente.
Os ∆PL e Pmus medidos e
calculados foram comparados e o desempenho discriminativo para ∆PL e Pmus
excessivos foi avaliado. A relação entre pressão de oclusão e esforço
respiratório também foi avaliada.
13 pacientes foram
incluídos. Os pacientes apresentaram baixa complacência pulmonar dinâmica [24
(20–31) mL/cmH2O], PL alta (25 ± 6 cmH 2 O) e Pmus alta (16 ± 7 cmH 2 O). Baixa
concordância foi encontrada entre os valores medidos e o calculados de ∆PL e Pmus.
Entretanto, valores excessivos de ∆PL > 20 cmH2O e Pmus > 15 cmH 2O
foram detectados com precisão (área sob a curva de operação do receptor (AUROC)
1,00 [intervalo de confiança de 95% (IC), 1,00-1,00], sensibilidade 100% (IC
95%, 72-100%) e especificidade 100% (IC 95% , 16–100%) e AUROC 0,98 (95% CI,
0,90–1,00), sensibilidade 100% (95% CI, 54–100%) e especificidade 86% (95% CI,
42–100%), respectivamente). O esforço respiratório calculado por minuto foi
altamente correlacionado com ∆Pocc (para pressão esofágica tempo produto por
minuto (PTP es/ min) r2 = 0,73; P = 0,0002 e trabalho respiratório (WOB) r2 =
0,85; P <0,0001).
Portanto, os autores concluíram
que ∆PLdyn e Pmus podem ser calculados a partir de uma manobra de oclusão
expiratória e podem predizer com alta precisão ∆PL e Pmus excessivos em
pacientes com COVID-19.
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https://doi.org/10.1186/s13613-021-00821-9
Excelente apresentação Dr Alejandro es um mestre
ResponderExcluirótima publicação. Parabéns Dr. Tornou mais acessível este assunto.
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