segunda-feira, 24 de julho de 2023

   DOSE DE ATAQUE DE VASOPRESINA NO CHOQUE SEPTICO (ESTUDO VALOR)


Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico intensivista. Responsável Técnico e Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos.




Em 21.07.2023 no Critical Care, foram publicados os resultados de um estudo observacional prospectivo denominado VAsopressin Loading for Refractory séptic shock (VALOR) Study, avaliando os efeitos de uma DOSE DE ATAQUE EM BOLUS DE VASOPRESSINA EM PACIENTES COM CHOQUE SÉPTICO nos quais a vasopressina foi indicada. Avaliou-se as respostas endocrinológicas e hemodinâmicas assim como sua segurança em razão dos efeitos adversos[1].

Como já se conhece, a vasopressina é o vasopressor de escolha de segunda linha como coadjuvante à infusão de noradrenalina no choque séptico refratário.

A vasopressina é um neurotransmissor central que age através da ligação com seus receptores 1 e 2 (V1 e V2)[2]. O receptor V1 é encontrado dentro do músculo liso da vasculatura sistêmica, e a vasopressina atua diretamente aumentando o tônus da musculatura lisa. O receptor V2 está predominantemente localizado no túbulo contorcido distal dos rins aumentando a reabsorção de água. Durante estados fisiológicos normais, vasopressina preferencialmente liga-se ao receptor V2. No entanto, durante o choque séptico, existe uma deficiência relativa de vasopressina e a administração intravenosa atua preferencialmente no receptor V1 para aumentar o tônus do músculo liso e aumentar a pressão arterial. A vasopressina aumenta a pressão arterial mais lentamente do que as catecolaminas. A vasoconstrição e os aumentos da pressão arterial induzidos pela vasopressina só são alcançados quando suas concentrações plasmáticas são superiores a 50pg/ml segundo relata a literatura[3]. Essas diferenças na relação concentração-vasoconstrição se devem aos receptores V1 e α1 conforme já comprovado[4]. Além disso, a meia-vida da vasopressina é de 10 a 35 minutos, enquanto a das catecolaminas é de poucos minutos[5]. A vasopressina quando indicada é administrada em infusão continua.

Entretanto, é importante prever a resposta pressórica ao uso de vasopressina à já que difere entre os pacientes (RESPONDEDORES VERSUS NÃO RESPONDEDORES). Embora melhorias marcantes ocorram em alguns pacientes, outros não respondem à vasopressina, e, portanto, outras nesses casos estratégias de manejo da pressão arterial poderiam ser introduzidas sem perda de tempo. O desenvolvimento de estratégias baseadas na resposta a dose de ataque de vasopressina (bolus) torna-se necessário, incluindo uma infusão contínua de vasopressina para respondedores e outra intervenção, como a infusão de corticoides ou epinefrina, para não respondedores.

Conforme as últimas recomendações do Surviving Sepsis Campaign (SSC) de 2021, vasopressina pode ser administrada em infusão contínua de até 0,03 U/min (1,8 U/h). Embora como recomendação fraca a partir de evidência de qualidade moderada, o SSC orienta iniciar vasopressina quando a dose de norepinefrina está na faixa de 0,25–0,5 μg/kg/min. A vasopressina é um hormônio peptídico endógeno produzido no hipotálamo e armazenado e liberado pela hipófise posterior. Seu mecanismo para atividade vasoconstritora é multifatorial e inclui a ligação de receptores V1 no músculo liso vascular, resultando em aumento da pressão sanguínea arterial. Estudos mostram que a concentração de vasopressina é elevada no choque séptico inicial, mas diminui para a faixa normal na maioria dos pacientes entre 24 e 48 horas à medida que o choque continua. Esse achado foi chamado de “deficiência relativa de vasopressina”, pois, na presença de hipotensão, seria esperado que a vasopressina estivesse elevada. O significado deste achado é desconhecido. Ao contrário da maioria dos vasopressores, a dose de vasopressina não é titulada, mas administrada em uma dose fixa de 0,03 unidades/min para o tratamento do choque séptico. Em ensaios clínicos, a vasopressina foi usada até 0,06 unidades/min. Doses mais altas de vasopressina foram associadas a isquemia cardíaca, digital e esplâncnica. O estudo VANISH comparou diretamente o uso de vasopressina versus norepinefrina ao randomizar pacientes com choque séptico em um desenho fatorial 2 × 2 com o objetivo de avaliar também o papel da hidrocortisona. Não houve diferença significativa entre os grupos vasopressina e norepinefrina na mortalidade de 28 dias. Embora não tenha havido diferença em relação à lesão renal, o uso de vasopressina reduziu o risco de terapia renal substitutiva (TRS). Quanto à terapia de combinação, o estudo principal (VASST) comparando norepinefrina sozinha com norepinefrina mais vasopressina (0,01–0,03 U/min) não mostrou melhora na mortalidade em 28 dias. No entanto, em uma análise de subgrupo, pacientes com choque menos grave recebendo norepinefrina <15μg/min melhoraram a sobrevida com a adição de vasopressina. Ambos VANISH e VASST demonstraram um efeito poupador de catecolaminas da vasopressina; como tal, o uso precoce de vasopressina em combinação com norepinefrina pode ajudar a reduzir a carga adrenérgica associada aos agentes vasoativos tradicionais. Na revisão sistemática de 10 RCTs feita pelo SSC, a vasopressina com norepinefrina reduziu a mortalidade em comparação com a norepinefrina sozinha, mas não reduziu a necessidade de TRS. Não houve diferença nos riscos de isquemia digital ou arritmias. O cut-off de norepinefrina para a adição de vasopressina variou entre os estudos e permanece obscuro. Iniciar vasopressina quando a dose de norepinefrina está na faixa de 0,25–0,5 μg/kg/min parece sensato. Outra metanálise de RCTs sobre choque distributivo mostrou um menor risco de fibrilação atrial com a combinação de vasopressina e norepinefrina em comparação com a norepinefrina sozinha. No entanto, uma outra metanálise de dados individuais de pacientes com choque séptico de 4 RCTs mostrou que a vasopressina sozinha ou em combinação com norepinefrina levou a um maior risco de isquemia digital, mas menor risco de arritmia em comparação com a norepinefrina sozinha[6].

Apesar de não existir uma definição consensual universal, o termo CHOQUE REFRATÁRIO tem sido frequentemente usado durante o manejo do choque circulatório (independentemente de sua etiologia), para alertar sobre uma ausência de resposta à terapia vasopressora inicial. Em 2013, uma revisão no Brasil, definia choque refratário como aquele com necessidade de > 0,5 mcg/kg/min de noradrenalina/adrenalina por > 1h ou >1 mcg/kg/min em qualquer período de tempo. Em 2018, uma revisão apontou que uma definição razoável de choque refratário seria uma resposta inadequada à terapia com altas doses de vasopressores, definida como ≥ 0,5 mcg/kg/min de norepinefrina ou dose equivalente de outro vasopressor. Durante muito tempo, esse status de choque refratário tem sido usado como o momento para a introdução de uma segunda droga vasopressora como a vasopressina. Desde as primeiras diretrizes do Surviving Sepsis Campaign (SSC) em 2004, existe a recomendação da associação de vasopressina para manejo do choque séptico em pacientes refratários a outros vasopressores, sem, no entanto, a própria SSC definir o que seria esse choque séptico refratário. As sucessivas diretrizes (2008, 2012, 2017), mantiveram essa recomendação, sem também incluir a definição de choque refratário. Entretanto, as mais recentes diretrizes do SSC de 2021 trazem, dentro da 38 recomendação (sugestão de associação da vasopressina à norepinefrina), uma observação decorrente da prática dos autores, no sentido de a vasopressina geralmente ser iniciada quando a dose de norepinefrina está na faixa de 0,25–0,5 μg/kg/min[7]. Com doses > 0,5 mcg/kg/min de norepinefrina ou dose equivalente de outro vasopressor existe uma mortalidade associada de até 60% e com doses >1 μg/kg/min de norepinefrina ou equivalente que continuam a se deteriorar clinicamente têm uma mortalidade relatada de 80 a 90%[8] [9]. Outros tem adotado um cut-off mais conservador para definir altas doses altas de vasopressores, usando como corte uma dose de norepinefrina (ou de outro vasopressor equivalente) > 0,2 microgramas/kg/min[10].

DOSE DE ATAQUE DE VASOPRESSINA

Inicialmente, em 2021, Nakamura K. et.al., publicaram um estudo retrospectivo de 21 casos avaliando a dose de ataque de vasopressina em bolus de 1U EV. Demonstraram o potencial da dose de ataque de vasopressina para aumentar rapidamente a pressão arterial e prever respostas subsequentes à sua infusão contínua, identificando respondedores/não respondedores a uma infusão sem muitos eventos adversos[11]. Com base nesses achados, o mesmo grupo realizou o estudo observacional prospectivo denominado estudo VAsopressin Loading for Refractory séptic shock (VALOR).

ESTUDO VALOR

Seleção de pacientes

Foram incluídos pacientes internados na UTI do Centro de Emergência e Cuidados Intensivos do Hitachi General Hospital de Japão, entre abril de 2021 e março de 2023. Esta UTI médica e cirúrgica é reservada para pacientes do departamento de emergência, para pacientes que apresentam deterioração aguda intra-hospitalar e para pacientes graves após cirurgia.

  1. Os critérios de inclusão foram os seguintes:
  2. Idade ≥18 anos,
  3.  Choque séptico (critérios de sepse-3),
  4. Necessidade de administração de vasopressina após a infusão contínua de noradrenalina ≥0,2 μg/kg/min,
  5. Não estar recebendo terapia contínua com esteroides até a administração de vasopressina e,
  6. Ter uma linha arterial.
  7. Os critérios de exclusão do estudo foram designados como fim da vida/cuidados terminais.

Protocolo de administração de vasopressina

Vasopressina foi introduzida em pacientes com choque séptico quando a dose de noradrenalina atingia um valor ≥ 0,2 μg/kg/min. No protocolo do estudo, a vasopressina foi administrada por via intravenosa em bolus de 1U como dose de ataque, seguida de sua administração intravenosa contínua a 1U/h (0.017 U/min).

Antes da dose de ataque de vasopressina, os seguintes procedimentos foram realizados:

  1. Coleta de sangue para testes endocrinológicos e
  2. Sistema de monitorização hemodinâmica minimamente invasiva pelo método PiCCO através do sensor ProAQT (Getinge, Japão) conectado à linha arterial.

Medidas realizadas

  • Indice de Catecolaminas (IC)[12]: calculado como:

 [dopamina + dobutamina + (noradrenalina + adrenalina) μg/kg/min x 100]

  • Mudança do IC (IC): IC após dose de ataque – IC pré dose de ataque de vasopressina
  • Lactato arterial,
  • Balanço hídrico,
  • Parâmetros hemodinâmicos: imediatamente antes dose de ataque de vasopressina e quando a ΔPAM máxima foi alcançada (após 3 a 5 minutos). Pressão arterial média (PAM) aferida da linha arterial, frequência cardíaca (FC), débito cardíaco (CO), volume sistólico (VS), variação do volume sistólico (VVS), pressão venosa central (PVC), resistência vascular sistêmica (RVS) e dPmx (o aumento máximo da pressão ao longo do tempo calculado no ProAQT). O dPmx, é geralmente expresso como dp/dt max, medida ecocardiográfica que representa a contratilidade ventricular esquerda. No entanto, a pré-carga e a pressão aórtica podem afetar o dp/dt max.
  • Testes endocrinológicos, como hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) e os níveis de cortisol foram avaliados imediatamente antes da dose de ataque de vasopressina.
  • Outras medidas: Idade, sexo, altura, peso corporal, escores de APACHE II e SOFA na admissão, comorbidades e ocorrência de fibrilação atrial na administração de vasopressina foram analisados ​​como características básicas. O uso de terapias adjuvantes, como ventilação mecânica, ECMO, foram avaliados. Também foram avaliados o momento da administração de vasopressina desde o início da noradrenalina, a dose de noradrenalina e o IC quando a vasopressina foi introduzida, assim os níveis máximos de lactato em 24 horas após a administração de vasopressina.

Eventos adversos registrados

Isquemia digital, isquemia mesentérica e isquemia miocárdica foram prospectiva e sistematicamente registrados.

Desfecho primário

Mudança do IC (IC) 6 h após a introdução da vasopressina, ou seja, com redução das doses de catecolaminas devido à administração de vasopressina.

Desfechos secundários

·         Mudança do IC (IC) 2 e 4 h após a introdução da vasopressina

·         Débito urinário a cada 2 h após a introdução da vasopressina

·         Balanço hídrico 24h após dose de ataque de vasopressina

·         Lactato e alterações do pH por 2h,

·         Tempo total de administração da vasopressina,

·         Uso de esteroides após a administração da vasopressina,

·         Mortalidade intra-hospitalar e

·         Tempo de internação na unidade de terapia intensiva

Classificação de pacientes: respondedores e não respondedores. Foi feita com base na variação máxima da pressão arterial média (PAM max) definida pela diferença entre a PAM antes da administração do bolus de vasopressina e a PAM máxima dentro de 3 a 5 minutos após a administração da dose de ataque de vasopressina.

No estudo anterior retrospectivo, adotou-se como o ponto de corte para distinguir respondedores de não respondedores um aumento da pressão arterial média (PAM) de 18 mmHg, 1 min após a dose de ataque de vasopressina. Neste valor não havia nenhum caso com ΔIC < 0 em 2, 4 ou 6 h. Assim, respondedores foram definidos como aqueles com alteração da PAM ≥18 mmHg 1 min após a dose de ataque de vasopressina, e não respondedores como aqueles com PAM <18 mmHg após a dose de ataque, que correspondeu ao tercil inferior.

Neste estudo prospectivo, a alteração máxima da PAM foi prospectiva e cuidadosamente observada pelos médicos dentro de 3 a 5 minutos após a dose de ataque e registrada como alteração máxima da PAM (ΔPAM max). Assim, esperava-se uma distribuição de ΔPAM e ponto de corte diferentes para este estudo prospectivo. Portanto, para seguir a linha do estudo anterior em que o ponto de corte de 18 mmHg correspondeu ao tercil inferior, selecionamos o tercil inferior de ΔPAM max como ponto de corte neste estudo.

RESULTADOS.

92 pacientes incluídos receberam um bolus de 1 U de vasopressina seguido por uma infusão contínua de 1 U/h. O tercil inferior de ΔPAMmax após dose de ataque de vasopressina foi de 22mmHg. 62 pacientes com ΔPAM > 22 mmHg foram classificados como respondedores e 30 com ΔPAM ≤ 22 mmHg como não respondedores.

As características de idade, sexo, altura, peso, escores de gravidade, terapia adjuvante e fibrilação atrial não diferiram significativamente entre respondedores e não respondedores.

O tempo para iniciar a administração de vasopressina desde o início da noradrenalina foi mais longo nos respondedores [5 horas (1,4, 15,7) vs. 1,75 horas (0,5, 4,9), p = 0,018], e a concentração de lactato no sangue em 24 h foi menor nos respondedores [2,6 mmol/l (1,6, 4,6) vs. 4,7 mmol/l (2,9, 8,1), p = 0,008], enquanto a dose de noradrenalina e o ΔIC no momento do início da vasopressina não diferiram significativamente entre respondedores e não respondedores.

Nos testes endocrinológicos, as concentrações sanguíneas de vasopressina e cortisol não diferiram significativamente entre os grupos; no entanto, as concentrações de ACTH foram significativamente menores nos respondedores [22,8 pg/ml (9,7, 45,4) vs. 36,4 pg/ml (22,3, 92,5), p = 0,018].

Como desfecho primário, o ΔIC 6 h foi -10 nos respondedores versus 0 nos não respondedores, significativamente menor nos primeiros (p < 0,0001).

ΔPAMmax > 22 mmHg, que definiu os respondedores no presente estudo, teve sensibilidade de 92% e especificidade de 77% para ΔIC 6h < 0. Além disso, ΔIC 2 h e 4 h foram significativamente menores em respondedores. Entretanto, este conjunto de dados não teve poder suficiente para detectar uma diferença estatisticamente significativa na mortalidade intra-hospitalar entre respondedores e não respondedores (37,7% vs. 57,1%, p = 0,087).

O tempo de permanência hospitalar e a duração da ventilação mecânica/ECMO também não foram significativamente diferentes.

A diurese 2, 4 e 6 horas após a infusão de vasopressina foi significativamente maior nos respondedores, e a administração de fluido e o balanço hídrico também foram significativamente menores nos respondedores.

As alterações do lactato sanguíneo após 2 h foram significativamente menores com um valor negativo como mediana nos respondedores.

A duração final da administração de vasopressina não foi significativamente diferente entre os grupos, enquanto a taxa de uso de corticoides após a introdução de vasopressina foi maior nos não respondedores.

Como efeitos adversos, eventos de isquemia foram observados em 5 casos (5,4%). A isquemia digital ocorreu em 2 (7,1%) não respondedores e em 0 (0%) respondedores, significativamente maior nos primeiros (p = 0,030). Não foram observadas diferenças significativas na isquemia mesentérica ou isquemia cardíaca.

Antes da dose de ataque de vasopressina, a maioria dos parâmetros hemodinâmicos aferidos, incluindo pressão arterial, débito cardíaco e pressão venosa central, não diferiram significativamente entre respondedores e não respondedores. Apenas VVS foi maior nos respondedores:17% (13, 22,3) versus 12% (7,8, 19,3), p = 0,015. Após dose de ataque de vasopressina, o volume sistólico e dPmx foram significativamente maiores nos respondedores: volume sistólico 52 (42, 68) versus 42,5 (32,3, 54,5) ml, p = 0,025 e dPmx 1264 (1035, 1684) versus 956 (606,5, 1377), p = 0,024, respectivamente. No entanto, a AUROC da VVS antes da dose de ataque e dPmx após a dose de ataque para ΔIC 6 h < 0 foram baixos (0,623 e 0,706, respectivamente). Da mesma forma, a AUROC de ACTH para ΔIC 6 h < 0 foi baixo (0,651). Embora o valor absoluto do débito cardíaco (CO) e da RVS não tenham sido significativamente diferentes, as mudanças antes/depois da dose de ataque de vasopressina foram significativamente diferentes: mudança de CO: 0 (- 0,4, 0.5) versus -0.4 (-0,9, 0) l/min, p= 0,0034 e RVS: 569 (417, 858) versus 344 (159, 541) dynas/s/cm⁵, p=0.0013 respectivamente.  A análise de sensibilidade com o corte de 18 mmHg de ΔPAMmax para identificação de respondedor/não respondedor teve resultados semelhantes.

DISCUSSÃO

No presente estudo, a frequência de eventos adversos foi adequadamente baixa e semelhante àquela relatada em ensaios clínicos anteriores com vasopressina sem dose de ataque. Os presentes resultados indicam que uma dose de ataque em bolus de vasopressina endovenosa jde 1 U é segura.

Enquanto a deficiência de vasopressina não se correlacionou com as respostas à vasopressina, o tempo para iniciar vasopressina desde o início da noradrenalina foi mais longo nos respondedores no presente estudo. Esses achados indicam que os respondedores poderiam ter incluído pacientes menos graves (maior tempo para atingir o ponto de corte de noradrenalina), ou que pode existir uma deficiência de vasopressina que não poderia ser explicada pela concentração absoluta de vasopressina, como no caso de hipovolemia. Enquanto isso, as concentrações de ACTH foram significativamente maiores em não respondedores. A vasopressina é um dos reguladores de feedback da liberação de ACTH via receptor 3 hipofisário de vasopressina. Embora a concentração de vasopressina não tenha sido diferente entre os grupos, a excreção de vasopressina poderia ter continuado por mais tempo nos não respondedores. Nesses pacientes, com suspeita de insuficiência adrenal relativa, a suplementação com corticoides poderia ser um tratamento coadjuvante. Uma das razões pelas quais alguns ensaios clínicos randomizados mostraram que a eficácia da vasopressina foi maximizada com o uso de corticoides pode ser porque eles atuaram como uma terapia de resgate para os não respondedores à vasopressina.

VVS foi maior nos respondedores. Como a vasopressina induz a contração dos vasos venosos, pode ter aumentado o retorno venoso pela contração do volume estressado. dP/dt max é um marcador de contratilidade cardíaca, quando a pré-carga adequada e a pressão aórtica real foram mantidas. A vasopressina teoricamente não afeta a contratilidade cardíaca, mas conseguiria um ajuste hemodinâmico favorável com vasoconstrição, o que resultaria em aumento de dP/dt máx. Se originalmente a contratilidade cardíaca fosse melhor, a vasopressina seria mais efetiva, correspondendo aos nossos resultados.

Essas diferenças endocrinológicas e hemodinâmicas significativas seriam razoáveis ​​para as respostas à vasopressina, mas não previam adequadamente as respostas. As respostas à vasopressina podem ser afetadas por muitos fatores além das alterações hemodinâmicas e endocrinológicas; portanto, a carga de vasopressina pode ser importante para prever essas respostas.

Além disso, a carga de vasopressina aumentou a diurese em um curto período nos respondedores. Como a vasopressina aumentou a resistência vascular mais nas arteríolas glomerulares eferentes do que nas arteríolas glomerulares aferentes, foi demonstrado que a vasopressina poderia ter aumentado o débito urinário na fase inicial em comparação com a noradrenalina no choque séptico. Como o débito urinário foi significativamente diferente entre respondedores e não respondedores, a carga de vasopressina pode ter a previsibilidade dos impactos renais no choque séptico.

LIMITAÇÕES. Existem várias limitações que precisam ser abordadas.

Este foi um estudo observacional. Portanto, ensaios randomizados são necessários para confirmar os resultados destes estudos.

O cálculo do IC era realizado por um médico da emergência e da UTI, que nem sempre estava disponível para fazer ajustes rápidos no IC em pacientes de UTI.

Além disso, como os pacientes japoneses de UTI geralmente são menores e mais velhos do que os dos países ocidentais, uma dose de 0,03 U/min (1,8 U/h) poderia ser muito alta para aqueles; por isso adotou-se uma velocidade fixa de infusão menor de 1U/h (0.017 U/min). Assim, se faz necessário reproduzir o estudo em populações nos quais costuma-se usar uma dose de 0,03 U/min (1,8 U/h) como preconizado pelo Surviving Sepsis Campaign.

CONSIDERAÇÕES

A dose de ataque em bolus de vasopressina poderia ser introduzida quando indicado o uso dessa segunda droga no manejo do choque séptico para alcançar com segurança um aumento rápido da pressão arterial. A dose de ataque de vasopressina pode ser usada para prever respostas à sua infusão contínua e selecionar estratégias apropriadas para aumentar a pressão arterial.

No nosso meio, uma solução padrão de vasopressina se obtém diluindo 1 ampola (1ml = 20U) em 99ml de SF 0.9%, o que equivale a uma solução de 0.2U/ml. A dose de ataque em bolus seria feita com 5ml da solução reparada (1U) e o restante da solução seria infundida a uma velocidade de 0,017 (pelo estudo) a 0,03 U/min (conforme preconizado pelo Surviving Sepsis Campaign. Entretanto, um aumento da PAM > 18 a 22 mmHg após 3 a 5 minutos da dose de ataque, poderia alertar sobre a necessidade de suspender a vasopressina e mudar para uma outra estratégia como associar corticoide e/ou uma outra catecolamina (adrenalina, dobutamina).

Embora não mencionado no estudo, o uso da vasopressina em bolus não é novidade. A literatura descreve seu uso dentro da estratégia denominada “push-dose vasopressor ou push-dose pressors” (vasopressores em dose-push) ou “bolus-dose vasopressor ou bolus-dose pressors” (vasopressores em bolus), isto é, drogaco efeito vasopressor administradas em bolus para controlar a hipotensão de forma emergencial. É uma prática que tem utilidade na anestesia ou em unidades de urgência/emergência e de terapia intensiva, pois pode ser útil para controlar a hipotensão transitória associada a agentes de indução administrados durante a intubação. Embora qualquer número de agentes possa ser usado como PDP, os mais comuns são a fenilefrina e a epinefrina (adrenalina). A fenilefrina é eficaz na correção da hipotensão. O aumento da pressão arterial é dependente da dose. Doses de 100mcg ou menos aumentam a pressão arterial média entre 4 mmHg e 4,8 mmHg (147 e 188 pacientes, respectivamente). Doses entre 100-199 mcg aumentam a PAM em 5,6 mmHg. Doses acima de 200 mcg aumentam a PAM em 12mmHg[13] [14]. A epinefrina push dose também melhora a hipotensão, mas foi menos estudada. Uma pequena série de pacientes pós-parada relata o uso de bolus de 10 mcg usados ​​para restaurar a pressão arterial sistólica de 60 mmHg para sistólica de 100 mmHg em três pacientes. Uma revisão retrospectiva da epinefrina em dose push durante o transporte para cuidados intensivos demonstrou PAM de 13 mmHg com um protocolo de dosagem de 10-20 mcg[15] [16]. Entretanto ainda faltam evidências consistentes para recomendar fortemente sua prática rotineira, especialmente com o uso de adrenalina que pode provocar taquicardia, arritmias e hipertensão rebote; e bradicardia e hipertensão de rebote com fenilefrina[17] [18].

Até as diretrizes de 2015 do Advanced Cardiac Life Support (ACLS) da American Heart Association, vasopressina era parte da estratégia de reanimação cardiopulmonar podendo substituir a adrenalina[19]. Foi removida após ensaios controlados e randomizados não mostrarem superioridade à epinefrina[20]. No cenário da anestesia, a literatura recomenda o uso de 0.5 a 1U endovenosa de vasopressina para o manejo inicial da síndrome vasoplegica[21].

Craig D. Nowadly e col., em 2020, publicaram um reporte de caso em que usaram vasopressina em push-dose de 1U endovenosa para tratar um quadro de choque pós intubação. Após indução com 20 mg de etomidato intravenoso (IV) e 100 mg de rocurônio IV para intubação em sequência rápida, observou-se que a pressão arterial diminuiu para 55/36 mmHg e o pulso aumentou para 136 batimentos/min. Após ressuscitação volêmica com 1000 mL de solução de ringer com lactato, a paciente permaneceu hipotensa com pressão arterial de 80/51 mmHg e pulso de 129 batimentos/min. Foi administrado 1U IV de vasopressina em bolus. Para tanto, a ampola de 1ml de vasopressina (20U) foi diluída em 19ml de SF 0.9% (seringa de 20ml com 1U/ml) sendo injetado 1ml da solução.  Dentro de 1 min, sua hemodinâmica melhorou para uma pressão arterial de 141/102 mm Hg e pulso de 120 batimentos/min. Posteriormente foi mantida a compensação hemodinâmica com noradrenalina EV/BIC[22].


Push-dose pressors (https://www.facebook.com/FOAMfrat/posts/how-push-dose-pressors-compare-to-one-another-/3005208066417998/)

 



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