quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

CONGESTÃO VENOSA AVALIADA PELA PRESSÃO VENOSA JUGULAR ESTIMADA PELA ULTRASSONOGRAFIA

Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico Responsável Técnico e Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos. Coordenador da Residência em Medicina Intensiva – COREME e membro do Grupo Técnico de Enfrentamento à COVID -19 da Santa Casa de São Jose dos Campos.



Ha muito tempo se sabe que a distensão da veia jugular (turgência jugular) interna (VJI) avaliada clinicamente (de forma visual) reflete a pressão final de enchimento ventricular (pré-carga do VD) denominada de pressão diastolica final do ventriculo direito (PDFVD ou PD2 do VD). Com o paciente em decúbito dorsal e o tronco a 45°, procura-se o ponto mais elevado da distensão da veia jugular interna dentro do triângulo cervical anterior e se mede a altura desse ponto a nível do ângulo esternal ou ângulo de Louis. Esse teste bastante simples e reprodutível permite a reavaliação seriada do estado da pressão das camaras direitas que levam a congestão venosa, sendo importante causa de disfunção orgânica especialmente renal(1).

A altura da turgência venosa jugular corresponde à Pressão Venosa Jugular (PVJ) e deve ser medida, na vertical, entre o ângulo de Louis e a horizontal traçada a nível da projeção do ponto mais alto da turgência da Veia Jugular Interna Direita. Para estimar a Pressao Venosa Central (PVC) soma-se 5 cm (valor correspondente à distância entre ângulo de Louis e o atrio direito, independentemente da posição do corpo).







   A: Ângulo de Louis  B: Espaços intercostais 

Ref.: https://www.researchgate.net/figure/Figura-3-A-Localizacion-del-angulo-de-Louis-B-Localizacion-del-cuarto-espacio_fig3_317786173/amp

Em recente estudo prospectivo observacional publicado no Anals of Internal Medicine,  Libo Wang, MD e col., analisam a precisão da avaliação ultrassonografica, quantitativa e qualitativa, da pressão venosa jugular (PVJ) na previsão de PVC elevada (2).

Para tanto, ultrassonografia da veia jugular interna foi realizada colocando o paciente em decúbito elevado de até 30° com o pescoço flácido ligeiramente voltado para a esquerda em posição neutra. Foi usado um probe linear de 7 MHz a 5 cm de profundidade posicionado transversalmente na base do pescoço, acima da clavícula, paralelo ao chão. Teve-se cuidado para não exercer muita pressão e comprimir artificialmente a veia jugular interna com a sonda de ultrassom.  A veia jugular interna foi identificada e seguida cranialmente (varredura) até ficar com um diametro menor que a artéria carótida adjacente durante todo o ciclo respiratório, ponto este denominado de "ponto de colapso da VJI".

A altura vertical até a projeção horizontal do ponto de colapso da VJI medida desde o ângulo esternal (ângulo de Louis) foi expressa em centímetros.  A essa altura foram adicionados 5 cm, conforme preconizado para avaliacao clinica, sendo esse valor expresdo em cmH2O definido como a Pressão Venosa Jugular ultrassonografica (uPVJ).  

Caso a veia jugular interna direita não fosse visualizada com cabeceira a 30°, o paciente era orientado a realizar a manobra de Valsalva para confirmação da posição anatômica da veia jugular interna.  Se a veia era visualizada, esses pacientes recebiam um valor de uJVP de 5 cmH2O.  

O valor da uPVJ foi medida preferencialmente do lado direito por ser este lado anatomicamente melhor relacionado com a veia cava superior e o atrio direito;  entretanto, a veia jugular interna esquerda foi usada quando a direita não foi visualizada ou se um cateter central estava presente.  Além disso, devido à variabilidade substancial no comprimento do pescoço entre os pacientes, o valor da uPVJ foi tambem medida em decúbito elevado de 45° nas zonas cervicais visualmente estimadas: zona 1, abaixo da clavícula;  zona 2, terço inferior do pescoço;  zona 3, terço médio do pescoço;  zona 4, terço superior do pescoço;  e zona 5, acima do ângulo da mandíbula.  

Foi também estimadas a uPVJ qualitativa na posição vertical com o paciente sentado a 90° (uPVJ vertical).  A cabeça do paciente era apoiada na cabeceira da cama ou na parede a aproximadamente 90 ° com as pernas estendidas e apoiadas na cama ou, se sentado, com os joelhos flexionados e os pés no chão.  A orientação do probe foi colocado na base do pescoço, logo acima da clavícula.  Um achado positivo foi observado se a veia jugular interna era distendida pelo menos até o tamanho da artéria carótida comum adjacente e não colapsou ao longo do ciclo respiratório.  

A pressão venosa jugular foi verificada visualmente com o paciente deitado em 30° a 45°, com o pescoço flácido ligeiramente voltado para a esquerda (idêntico ao posicionamento da uPVJ) como o ponto mais alto da PVJ interna.  Como feit com a uPVJ, 5 cm foram adicionados à distância vertical da VJI e o ângulo esternal e definido como a PVJ visual.  

Embora as medições feitas à beira do leito exijam conversão para milímetros de mercúrio (1,36 cm H2O = 1,0 mm Hg) para comparações com valores de cateterização, foi estabelecido que uma PVJ maior que 8 cm acima do átrio direito ou maior que 3 cm acima do ângulo do esterno era anormal.  Portanto, uma PVJ elevada foi definida como maior que 8 cm.  Este valor foi registrado antes do exame de uPVJ.

   Imagens do artigo original da referência (2)               mostrando a técnica de avaliação da VJI.

Forma de estimar a altura do ponto de colapso da VJI.


Neste vídeo, extraído do vídeo original da referência se explica a forma da varredura do probe para estimar o ponto de colapso da VJI.

O estudo foi realizado em 2 hospitais acadêmicos dos EUA com pacientes adultos submetidos a cateterismo cardíaco direito entre 5 de fevereiro de 2019 e 1 de março de 2021.

100 pacientes participantes foram submetidos a cateterismo cardíaco direito (idade média, 59,6 anos; 44% com fração de ejeção prepreservada).

A uPVJ em posição reclinada previu com precisão a pressão atrial direita elevada (PAD > 10 mm Hg), com uma área sob a curva de 0,84.

Uma uPVJ positiva na posição vertical foi 94,6% específico para prever a PAD elevada.

Concluem os autores que a avaliação ultrassonográfica de ponto de da PVJ (uPVJ) é viável, reproduzível e preditiva com precisão de PVCs elevadas em pacientes submetidos a cateterismo cardíaco direito. 

Outro estudo recente também validou a uPVJ em pacientes portadores de doença renal crônica dialitica com eventual quadro de hipervolemia e congestão venosa. O método mostrou boa apuração para prever PVC >10cmH2O (3).

REFERÊNCIAS

(1) https://www.medicinanet.com.br/m/conteudos/revisoes/5250/insuficiencia_cardiaca_congestiva.htm

(2) https://www.acpjournals.org/doi/10.7326/M21-2781

(3) https://ejrnm.springeropen.com/articles/10.1186/s43055-021-00661-4

quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

A LEI DE STARLING E A CONGESTÃO VENOSA

Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico Responsável Técnico e Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos. Coordenador da Residência em Medicina Intensiva – COREME e membro do Grupo Técnico de Enfrentamento à COVID -19 da Santa Casa de São Jose dos Campos.

Na postagem anterior destacamos a importância da congestão venosa como causa de disfunção orgânica, especialmente de Lesão Renal Aguda - LRA. 

Como apontado, movimento do fluido entre os compartimentos vascular e intersticial é regulado pelo equilíbrio entre a pressão hidrostática capilar e a pressão oncótica plasmática. 

Referência: Biologia dos vasos sanguíneos. https://www.msdmanuals.com

Em condições normais, o equilíbrio entre essas forças resulta em fluxo líquido de fluido para o interstício conhecido como filtração capilar de acordo com a equação de Starling que afirma o seguinte:

 

Onde Q é o volume de filtração transcapilar/segundo, Pcap é a pressão hidrostática capilar, Pint é a pressão hidrostática intersticial, πp é a pressão oncótica do plasma, πint é a pressão oncótica intersticial, Lp é a condutividade hidráulica da membrana, S é a área de superfície para filtração, e σ é o coeficiente de reflexão de Staverman.



Referência: https://rk.md/2018/starling-forces-hydrostatic-and-oncotic-pressures/



Referência: https://slidetodoc.com/capillary-exchange-diffusion-most-important-solute-exchange-method/

O acúmulo de fluido resultante no espaço intersticial é removido pelos linfáticos. Durante a inflamação ou condições que alteram a permeabilidade da membrana capilar, há um excesso de fluido resultante no espaço intersticial, comumente referido como edema intersticial. A pressão hidrostática capilar aumentada, a pressão oncótica plasmática reduzida e a permeabilidade capilar aumentada têm o potencial de aumentar a filtração de fluido através da membrana capilar e, portanto, levar à formação de edema.

O edema intersticial leva ao comprometimento da difusão de oxigênio e metabólitos dos capilares para os tecidos e ainda aumenta a pressão do tecido que leva à obstrução da drenagem linfática e a distúrbios na interação célula a célula, o que leva à falência progressiva de órgãos. A capacidade do rim de acomodar pressões intersticiais hidrostáticas crescentes é limitada devido à cápsula renal e, portanto, todos esses efeitos são vistos de forma mais proeminente no rim. Eles causam congestão renaledema intersticial leva ao comprometimento da difusão de oxigênio e metabólitos dos capilares para os tecidos. O edema intersticial aumenta a pressão do tecido e leva à obstrução da drenagem linfática e a distúrbios na interação célula a célula, o que leva à falência progressiva de órgãos. A capacidade do rim de acomodar pressões intersticiais hidrostáticas crescentes é limitada devido à cápsula renal e, portanto, todos esses efeitos são vistos de forma mais proeminente no rim. Eles causam congestão renal, com redução da perfusão renal e filtração glomerular devido à compressão extrínseca dos vasos arteriais e, subsequentemente, levam ao desenvolvimento de LRA.

No vídeo em anexo de descrevem as forças de Starling e as bases da geração do edema intersticial.

Referência :https://youtu.be/Kuh1tSGCLBk