domingo, 24 de maio de 2020

VENTILAÇÃO NA POSIÇÃO PRONA E AUTO-PRONA

Elaborador por: Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico Especialista em Medicina Intensiva. Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos - SP.
Coordenador do Programa de Residencia Médica - COREME - da Santa Casa de São Jose dos Campos - SP



1. INTRODUÇÃO
A ventilação prona refere-se à estratégia de ventilação mecânica com o paciente deitado na posição de decúbito ventral. Entre as várias opções terapêuticas em terapia respiratória intensiva, a posição prona é o melhor exemplo da progressiva integração, de observações experimentais e clínicas, entendimento fisiopatológico e de ensaios clínicos randomizados. De fato, a história da posição prona representa um paradigma ideal que deve ser seguido quando uma nova intervenção é proposta: a ideia foi bem pensada e descrita, aplicada experimentalmente, discutida, refinada e finalmente testada em ensaios clínicos progressivos até encontrar seu lugar definitivo no arsenal terapêutico. Nós agora sabemos como, quando e por que os pacientes devem ser pronados.

2. FISIOLOGIA DA RESPIRAÇÃO[1] [2]
Fisiologicamente, a respiração tranquila e normal é realizada:
(1) pelos movimentos de subida e descida do diafragma para aumentar ou diminuir a cavidade torácica (principal); e
(2) pela elevação e depressão da grade costal que eleva e reduz o diâmetro anteroposterior da cavidade torácica.
Durante a inspiração normal, a contração diafragmática puxa as superfícies inferiores dos pulmões para baixo. Os músculos mais importantes que elevam a caixa torácica (músculos inspiratórios) são os intercostais externos, mas outros que auxiliam são (1) músculos esternocleidomastóideos, que elevam o esterno; (2) serráteis anteriores, que elevam as costelas; e (3) escalenos, que elevam as duas primeiras costelas. Ao ser elevada expandem-se os pulmões porque, na posição de repouso natural, as costelas se inclinam para baixo, possibilitando, dessa forma, que o esterno recue em direção à coluna vertebral. As costelas durante a expiração estão anguladas para baixo, e os intercostais externos estão alongados anterior e inferiormente. Conforme eles se contraem, puxam as costelas superiores para frente com relação às inferiores, o que causa mecanismo de alavanca nas costelas, para levantá-las, produzindo a inspiração. Quando a caixa torácica é elevada, as costelas se projetam quase diretamente para frente, fazendo com que o esterno também se mova anteriormente para longe da coluna, aumentando o diâmetro anteroposterior do tórax por cerca de 20% durante a inspiração máxima, em comparação à expiração.
Durante a expiração normal, o diafragma simplesmente relaxa, e a retração elástica dos pulmões, da parede torácica e das estruturas abdominais comprime os pulmões e expele o ar. Os músculos que puxam a caixa torácica para baixo, durante a expiração (músculos expiratórios), são principalmente o (1) reto abdominal, que exerce o efeito poderoso de puxar para baixo as costelas inferiores, ao mesmo tempo em que, em conjunto com outros músculos abdominais, também comprime o conteúdo abdominal para cima contra o diafragma; e (2) os intercostais internos. Os intercostais internos funcionam exatamente de modo oposto aos externos, atuando como músculos expiratórios, porque se angulam entre as costelas, na direção contrária, e produzem a alavanca oposta. Durante a expiração vigorosa, no entanto, as forças elásticas não são poderosas o suficiente para produzir a rápida expiração necessária; assim, força extra é obtida, principalmente, pela contração da musculatura abdominal, que empurra o conteúdo abdominal para cima, contra a parte inferior do diafragma, comprimindo, dessa maneira, os pulmões.
A pressão pleural (Ppl) normal no início da inspiração (fase de repouso no final da expiração) é cerca de −5 cmH2O, que é a quantidade de pressão necessária para manter os alvéolos abertos. A Pressão pleural (Ppl) de repouso negativa (-5 cmH2O) resulta do equilíbrio entre a força de sucção exercida para grade costal que tende a expandir a caixa torácica e a pressão de retração pulmonar que em sentido contrário representa as forças elásticas nos pulmões que tendem a colapsá-los (Figura 1).
Figura 1: Pressão Intrapelural

A pressão alveolar (Ppl) é a pressão dentro dos alvéolos e cujo valor muda a depender da fase do ciclo respiratório.
A Pressão Transpulmonar (PTP) é a diferença entre a pressão alveolar (Palv) – a pressão pleural (Ppl), que representa a pressão de expansão dos alvéolos.
Quando a glote está aberta e não existe fluxo de ar para dentro ou para fora dos pulmões, as pressões em todas as partes da árvore respiratória, até os alvéolos, são iguais à pressão atmosférica, que é considerada a pressão de referência zero nas vias aéreas — isto é, 0 cmH2O (pressão de repouso). Para causar o influxo de ar para os alvéolos, durante a inspiração a pressão alveolar (Palv) deve cair para valor ligeiramente abaixo da pressão atmosférica (abaixo de 0), cerca de −1 cmH2O. Essa pressão ligeiramente negativa é suficiente para puxar 0,5 litro de ar para o interior dos pulmões, nos 2 segundos necessários para uma inspiração normal e tranquila.
Durante a expiração, a pressão alveolar sobe para cerca de +1 centímetro de água e força o 0,5 litro de ar inspirado para fora dos pulmões, durante os 2 a 3 segundos de expiração.
No início da inspiração normal: Palv =0cmH2O; Ppl= -5cmH2O e PTP = +5cmH2O (0 - -5cmH2O). A expansão da caixa torácica traciona os pulmões para diante com força maior e cria uma Ppl mais negativa, que chega a cerca de −7,5 cmH2O. Ao longo da inspiração a PTP irá aumentando (Figura 2).

Figura 2: Variação da Pressão Transpulmonar (PTP)

Qualquer que seja o posicionamento de um indivíduo, a expansão alveolar sempre dependerá da pressão transpulmonar (PTP).
Anatomicamente as bases pulmonares possuem uma maior área de tecido pulmonar (alvéolos e vasos sanguíneos) que os ápices pulmonares. Assim fisiologicamente as bases pulmonares são mais ventiladas e perfundidas. O efeito da gravidade ainda, faz com que o fluxo sanguíneo tenda a se dirigir com maior intensidade para as bases aumentando o peso destas regiões, que são por essas razões, denominadas de “áreas dependentes”, tornando os ápices “áreas não dependentes”. O maior peso pulmonar (que pode ainda, ser aumentado por edema intersticial) representam uma força opositora à pressão negativa pleural e uma força compressiva sobre os alvéolos. Assim, por estas razões, nas bases pulmonares a pressão pleural é menos negativa que nos ápices pulmonares e os alvéolos destas bases pulmonares estarão menos distendidos (alvéolos mais complacentes e recrutáveis) que nos ápices (mais distendidos, menos complacentes e recrutáveis). Na posição supina, ocorrem fenômenos semelhantes com a diferença que teremos áreas dependentes posteriores e áreas não dependentes anteriores (Figura 3).

Figura 3: Pressão Pleural

3. EFEITOS DA POSIÇÃO PRONA NA MECÂNICA RESPIRATÓRIA E NA OXIGENAÇÃO[3] [4] [5] [6] [7] [8] [9] [10] [11] [12] [13].
A posição prona altera a mecânica e a fisiologia da troca de gases melhorando a oxigenação que resulta em redução da mortalidade em uma população selecionada de pacientes com Síndrome de Angústia Respiratória do Adulto (S.A.R.A). Essa melhora da oxigenação pode ser atribuída a vários mecanismos que podem ocorrer de forma isolada ou associados.  Dentre eles, estão a diminuição dos fatores que contribuem para o colabamento alveolar: a redistribuição da ventilação alveolar e a redistribuição da perfusão.

a) Peso pulmonar. o edema pulmonar faz o peso pulmonar aumentar, o que, somado à ação da gravidade, faz com que as regiões dependentes sofram colapso (atelectasia compressiva). Desta maneira, em posição supina, a região dorsal é a mais colapsada pelo acúmulo de líquido intersticial. Ao se pronar o doente, o edema da região dorsal se desloca para a região ventral (“modelo da esponja” de Bone RC) não sofrendo mais ação do peso pulmonar, de modo que se torna mais expandida que pode ser assim mantida por efeito da PEEP associada (pressão sobreposta). Quando um paciente está em decúbito dorsal, a PTP ventral excede significativamente a PTP dorsal, resultando em maior expansão dos alvéolos ventrais do que os alvéolos dorsais; esse efeito é exagerado na síndrome da angústia respiratória aguda (SARA), de modo que os alvéolos ventrais se tornam excessivamente distendidos e os alvéolos dorsais se tornam atelectasiados. A posição prona reduz a diferença entre o PTP dorsal e ventral, tornando a ventilação mais homogênea, levando a uma diminuição da hiperinflação alveolar ventral e colapso alveolar dorsal e recrutamento de alvéolos que entraram em colapso durante a ventilação supina. Na SARA, existe importante alteração da relação ventilação/perfusão na posição supina, uma vez que o fluxo sanguíneo e o colapso alveolar são maiores nas porções dependentes do pulmão. Em prona, a relação ventilação/perfusão melhora, pois o pulmão anteriormente dependente continua a receber a maior parte do fluxo sanguíneo à medida que os alvéolos reabrem, enquanto o pulmão recém-dependente continua a receber a minoria do fluxo sanguíneo à medida que os alvéolos começam a colapsar (Figuras 4 e 5).
Figura 4: Melhora da atelectasia com a posição prona


Figura 5: Imagem na TC dos efeitos da posição prona

A posição prona torna a razão ar/tecido mais homogênea quando comparada à posição supina, e isso acontece tanto em indivíduos normais quanto pacientes com SARA: uma distribuição mais homogênea das áreas de densidade implica que as pressões transpulmonares também são distribuídas de maneira mais homogênea na posição prona do que na posição supina. De fato, na posição supina, as áreas pulmonares não dependentes (ventrais ou anteriores) estão mais distendidas que as dependentes (dorsais ou posteriores), e essas diferenças são significativamente reduzidas quando a posição prona é aplicada. Os mecanismos através do qual isso acontece provavelmente estão relacionados à necessidade de o pulmão adaptar sua forma à caixa torácica. Por exemplo, quanto mais "triangular" é a forma da área de pulmão não dependente dentro de uma da caixa torácica mais “esférica”, maior o alongamento para alinhamento dessas duas estruturas. Isso descreve o mecanismo denominado “incompatibilidade das formas". Segundo este mecanismo, o pulmão isolado pode ser pensado como um cone, com unidades alveolares do mesmo tamanho em todo o parênquima se não houver efeito da gravidade. Quando o pulmão é colocado na caixa torácica, a necessidade do cone se adaptar a uma forma mais cilíndrica da caixa torácica impõe uma força de alongamento no ápice do cone, o que leva a um aumento no tamanho das unidades alveolares nessa área. A consequência é uma maior expansão das regiões ventrais comparadas às dorsais. Entretanto, esse mecanismo está ligado às forças gravitacionais (peso pulmonar), que atuam comprimindo progressivamente as unidades pulmonares ao longo do eixo gravitacional (não dependente à dependente). Quando a gravidade é adicionada, as unidades na parte inferior do pulmão sentem a pressão sobreposta das unidades da parte superior e tendem a entrar em colapso. Portanto, na posição supina, a incompatibilidade das formas e a força gravitacional agem na mesma direção (expansão das unidades pulmonares não dependentes e compressão das dependentes). Esses dois fenômenos provocam falta de homogeneidade na ventilação nos pulmões normais e na SARA. Na posição prona, a incompatibilidade das formas e a força gravitacional agem em direções opostas: enquanto pela incompatibilidade das formas há tendência a expandir as regiões ventrais, a força gravitacional (peso pulmonar) tende a comprimi-las (Figura 6). O resultado é que a ventilação das unidades pulmonares dependentes e não dependentes são mais homogêneas na posição prona. As consequências dessa maior homogeneidade são evidentes: ventilação e perfusão são distribuídas de maneira mais homogênea levando a uma melhoria da oxigenação, qualquer dano eventualmente provocado pela carga de energia da ventilação mecânica ficará mais uniformemente distribuída no parênquima pulmonar na posição prona do que na posição supina.


Figura 6: Mecanismo de incompatibilidade das formas e o efeito gravitacional

Também tem sido proposta uma melhora na capacidade residual funcional aumentada (CRF), mas alterações na CRF não foram um achado dominante na maioria dos estudos de ventilação prona. Alterações na distribuição da água e secreções extravasculares do pulmão também podem desempenhar um papel.

b) Massa cardíaca. Em indivíduos normais, o peso do coração sobre regiões dependentes do pulmão diminui o gradiente de pressão transpulmonar, o que facilita o seu colabamento. Nos pacientes com SARA, este efeito pode ser ainda mais acentuado, devido ao aumento da câmara cardíaca direita secundária à hipertensão pulmonar decorrente da vasoconstrição hipóxica, liberação de substâncias vasoconstritoras e remodelamento da circulação pulmonar. Estudos tomográficos em posições prona e supina compararam as áreas pulmonares que estavam sob compressão cardíaca e mostraram que ao contrário da posição supina, que tinha considerável fração de ambos pulmões sob peso cardíaco, na posição prona apenas uma pequena fração de ambos pulmões estava sob este efeito.

c) Alteração da mobilidade diafragmática e desvio cefálico do conteúdo abdominal. Em humanos, o movimento do diafragma na posição supina é uniforme enquanto que na posição prona ocorre maior movimentação da região dorsal. Este fato ocorre porque, provavelmente, a compressão do diafragma pelos órgãos abdominais se torna menor. A sedação e a paralisia dos pacientes ventilados mecanicamente deprimem o tônus muscular diafragmático, fazendo com que o conteúdo abdominal induza a um desvio cefálico das regiões mais posteriores do diafragma em posição supina, o que contribui para o colapso destas regiões. Em posição prona, o peso do conteúdo abdominal fica repousado sobre a superfície do leito, diminuindo o desvio do diafragma.

d) Configuração da caixa torácica. A configuração da caixa torácica pode influenciar na pressão transpulmonar das diferentes regiões pulmonares. Na posição supina seu formato é triangular (ápice em cima), o que permite a formação de atelectasias mais extensas na região dorsal. Na posição prona ela assume uma forma mais retangular, de modo que a formação de atelectasias se torna menor.

e) Redistribuição da perfusão
A explicação de que a melhoria da oxigenação com a posição prona deva-se ao recrutamento pulmonar não é completamente verdadeira. Na verdade, a abertura observada nas regiões dorsais na posição prona está sempre associada ao colabamento parcial das regiões ventrais. De fato, a média das densidades na tomografia computadorizada não mudam significativamente com a posição. Portanto, o que realmente parece explicar o efeito observado é a diferença entre o recrutamento dorsal e o des-recrutamento ventral do pulmão. Essa diferença está estreitamente relacionada às mudanças na fração de shunt e de perfusão que tem sido observado. O papel da forma do pulmão é bastante óbvio se pensarmos no “modelo da esponja”. Imagine-se que o peso do pulmão é aumentado para uma quantidade tal que cause o colabamento das regiões pulmonares dorsais em 50% da altura pulmonar: devido às forças compressivas relacionadas ao peso quando o paciente está
pronado, o pulmão entra em colapso a 50% da sua altura (a região ventral) enquanto o ouro 50% (regiões dorsais) reabrirá. O efeito nas trocas gasosas dependerá da quantidade de massa presente no 50% superior e 50% inferior. Se os pulmões fossem perfeitamente redondos, a quantidade de massa seria exatamente a mesma na parte superior e inferior. No entanto, como a forma é quase cônica (com o ápice voltado para a parte ventral do tórax), maior quantidade de massa pulmonar estará presente nos 50% dorsais, e reabrirá na posição prona associada a uma maior rede de vasos sanguíneos perfundindo essa região aberta o que favorecerá também uma melhor perfusão (Figura 7).

Figura 7: Redistribuição da perfusão na posição prona

f) Complacência Pulmonar
Na posição supina, a complacência da parede torácica é determinada pela elasticidade relativa da parede torácica anterior e do diafragma, uma vez que a porção posterior do tórax está em contato com a cama reduzindo sua capacidade de expansibilidade. Na posição prona, a elasticidade geral do diafragma não muda, enquanto a parte dorsal do tórax fica livre para se mover. Devido à conformação anatômica do tórax, a parede torácica dorsal é menos complacente que o anterior; portanto, a complacência líquida da parede torácica diminui em um paciente em posição prona. Esta situação contrariamente ao que possa se pensar, favorece uma melhor distribuição de gases em direção às regiões pulmonares ventrais e paradiafragmática, com um maior recrutamento dessas áreas. Daqui resulta que a distribuição de ar se torna mais homogênea. As alterações na complacência geral da parede torácica durante a posição prona, explica por que essa manobra está associada a um aumento na capacidade de recrutamento pulmonar. A resposta da mecânica do sistema respiratório à posição prona seria um aumento na pressão das vias aéreas durante a ventilação controlada a volume (VCV) ou uma diminuição do volume corrente (VC) durante a ventilação controlada a pressão (PCV). Na verdade, após a manobra, a pressão do platô pode não aumentar, mas pode permanecer constante ou até diminuir fortemente: isso sugere um recrutamento líquido do pulmão durante a VCV. Por outro lado, durante a PCV, se a posição prona estiver associada a um recrutamento pulmonar líquido, o volume corrente permaneceria constante ou até aumentaria.

g) Liberação de CO2
A PaCO2 durante a posição prona pode permanecer inalterada, aumentar ou até diminuir, dependendo do comportamento da ventilação alveolar e sua relação com o volume pulmonar total (isto é, com capacidade de recrutamento pulmonar líquida). Um aumento de PaCO2 na posição prona pode depender de dois mecanismos diferentes a seguir:
• Diminuição da ventilação alveolar (unidades alveolares hiperinsufladas têm uma complacência menor e, portanto, são menos ventiladas. A menos da complacência da parede torácica posterior também pode ser responsável por uma diminuição do volume alveolar.
• Uma mudança relativa na perfusão pulmonar.
Por outro lado, embora se tenha verificado uma diminuição da PaCO2 relacionados a um aumento líquido na capacidade de recrutamento, o aumento da PaO2 não parece depender totalmente desse efeito: a oxigenação pode de fato, melhorar por outras causas além da capacidade de recrutamento. Em geral, uma diminuição na PaCO2 significa uma diminuição no espaço morto. Interessante notar que o espaço morto fisiológico, como calculado por métodos padrão, inclui não apenas o espaço morto real, mas também, em parte, o componente da fração shunt, que aumenta as diferenças entre o PCO2 alveolar e arterial. Portanto, o espaço morto reflete o comportamento das trocas gasosas respiratórias, e isso pode explicar por que essa é uma das variáveis ​​mais associadas ao resultado final.

4. CONTEXTO ATUAL DE USO

4.1. EM PACIENTES EM VENTILAÇÃO MECÂNICA

Em 2013, o estudo PROSEVA (TRIAL) de Claude Guerin et.al., publicado na revista NEJM mostrou que a ventilação mecânica em posição prona melhorava a sobrevida do paciente em SARA grave. O estudo definia SARA grave pela relação Pa02/Fi02 < 150 mmHg, com uma Fi02 de pelo menos 60% (0.6), uma PEEP ≥ 5 cmH20 e um VC de 6ml/kg de peso predito. A mortalidade em 28 dias foi de 16,0% no grupo prona versus 32,8% no grupo supino (P <0,001). A taxa de risco de morte em posição prona foi de 0,39 (IC 95%, 0,25 a 0,63). A Mortalidade não ajustada em 90 dias foi de 23,6% no grupo prono versus 41,0% no grupo supino (P <0,001), com uma taxa de risco de morte de 0,44 (IC 95%, 0,29 a 0,67). Esse estudo paradigma concluiu que em pacientes com SARA grave (hoje moderada a grave), a aplicação precoce de sessões de pelo menos 16 horas consecutivas de posição prona (por 4 de supina) diminuiu significativamente a mortalidade em 28 e 90 dias[14]. Seu uso, entretanto, não obteve a adesão almejada, prevalecendo ainda as estratégias a base de manobras de recrutamento alveolar (MRA). Até 2013 vários outros estudos já haviam sido publicados sobre posição prona, com participação de grandes pesquisadores como Gattinoni, Taccone, Pesenti, Mancebo, Fernandez e o próprio Guerin, entre outros[15] [16] [17] [18] [19] [20] [21] [22] [23] [24]. A metanalise desses estudos foi publicada em julho de 2014 no CMAJ, a mesma que concluiu que o uso da posição prona durante a ventilação mecânica, reduziu todas as causas de mortalidade de forma significativa entre os pacientes com SARA grave (P/F <100mmHg) que receberam ventilação mecânica protetora, mas não significativa entre os pacientes com SARA leve (P/F 100 – 199mmHg) e moderada (P/F 200 – 299mmHg)[25]. Outras metanálises obtiveram conclusões similares[26] [27] [28]. Entretanto uma revisão sistemática da Cochrane em 2015 não encontrou evidências convincentes de benefício ou dano da aplicação universal da posição pronba em adultos com hipoxemia sob ventilação mecânica em unidades de terapia intensiva (UTI)[29]. No Brasil, as Diretrizes de Ventilação Mecânica de 2013, adotaram os critérios e indicações do estudo PROSEVA. Metanálises em 2014 mostraram benefícios no uso também na SARA moderada[30].

Em maio de 2017, Guerin publica uma revisão, na qual conclui que a posição prona é um componente essencial da ventilação mecânica de proteção pulmonar e deve ser usada como terapia de primeira linha em associação com baixo volume corrente e agentes bloqueadores neuromusculares em pacientes com SDRA grave[31]. Em outubro de 2017, uma metanálise de Laveena Munshi et.al., encontrou redução da mortalidade no subgrupo de pacientes com SARA grave ventilados mecanicamente em posição prona quando aplicada por pelo menos 12 horas diárias[32]. Circunstancialmente, no mesmo mês de outubro de 2017, publica na revista JAMA, o Estudo ART, um grande estudo randomizado que mostrou que uma estratégia de manobras de recrutamento máximo com titulação PEEP mais alta (contra o padrão, de PEEP baixa) resultou em aumento da mortalidade de 28 dias. Esses resultados do ART, trouxe questionamentos às Manobras de Recrutamento Alveolar, voltando uma atenção maior para a estratégia de prona com titulação de PEEP baixa associada a estratégia protetora[33]. Em dezembro de 2017, o próprio Guerin e col., publica o estudo APRONET (estudo prospectivo internacional de 1 dia de prevalência realizado quatro datas em abril, Julho e outubro de 2016 e janeiro de 2017), mostrando que a taxa de uso de  posição prona foi de 5,9% (11/187), 10,3% (41/399) e 32,9% (49/149), na SARA leve (201 -300), moderada (101-200) e grave (≤100) respectivamente, definidas de acordo com os critérios de Berlim e em 40,2% daqueles que cumpriam os critérios adotados no PROSEVA (PaO2/FIO2 < 150 mmHg, PEEP ≥ 5 cm H2O, FIO2 ≥ 0.60)[34]. No mesmo ano de 2017, diretrizes desenvolvidas pela ATS (American Thoracic Society), ESICM (European Society of Intensive Care Medicine) e SCCM (Society of Critical Care Medicine Clinical Practice Guideline) foram publicadas trazendo a recomendação forte do uso da estratégia prona para pacientes com SARA grave, definida pelos critérios de Berlim, por pelo menos 12 horas por dia. Na ocasião, houve falta de consenso do painel sobre o fornecimento de uma recomendação para posicionamento prona em pacientes com SARA moderada segundo os critérios de inclusão do estudo PROSEVA (PaO2/FIO2 101-150) devido ao menor confiança no equilíbrio entre o desejável em comparação com indesejável resultados neste subgrupo de pacientes[35].

Em fevereiro de 2019, duas importantes revisões foram publicadas na mesma revista Semin Respir Crit Care Med pelo grupo italiano. Na primeira, de Gattinoni e col., trazem uma atualização sobre os mecanismos por trás da posição prona, destacando sua complexidade. De fato, os efeitos positivos na oxigenação e na liberação de CO2 da posição prona devem ser atribuídos a uma insuflação-ventilação mais homogênea, à incompatibilidade do formato pulmonar/torácico e à alteração da elastância da parede torácica. O grupo faz uma revisão de cinco grandes ensaios que tentaram, a partir de diferentes teorias, hipóteses e modelos, demonstrar a eficácia da posição prona, que finalmente levou esta estratégia a ocupar seu lugar definitivo entre as diferentes terapias de suporte à SDRA[36]. A segunda, uma revisão de Michele Umbrello e col., aponta que o efeito protetor do pulmão na posição prona, pode ser ainda mais importante em pacientes obesos por causa de diminuição da CRF e aumento da atelectasia. O procedimento mostrou-se seguro em pacientes de centros experientes. Fisiologia clássica aplicada em estudos realizados no final dos anos 90 em pacientes obesos descobriram como a posição prona aumenta volume pulmonar, reduz a elastância pulmonar e melhora a oxigenação em pacientes obesos. No entanto, os pacientes obesos colocados em decúbito ventral, sua pressão intra-abdominal tenderá a aumentar, apresentando maior incidência de lesão renal e hepatite hipóxica, pelo que estas funções devem ser rigorosamente monitorizadas[37].

4.1.1. PROCEDIMENTO[38] [39]
Técnica
São necessárias mínimo de 3 e idealmente 5 pessoas para o posicionamento do paciente.
-Uma deverá permanecer sempre na cabeceira do leito e será responsável pelo tubo endotraqueal. É aconselhável tenha pronta sonda de aspiração para uso imediato, visto que ocorre abundante drenagem de secreção após o posicionamento em prona.
-Uma segunda pessoa ficará encarregada de cuidar para que cateteres, drenos e conexões não sejam tracionados.
-As outras pessoas, estarão posicionadas a cada lado do leito, e serão responsáveis por virar o paciente, primeiramente para o decúbito lateral, e em seguida para a posição prona. Os braços devem ser posicionados ao longo do corpo, com a cabeça voltada para um dos lados, e os eletrodos para monitorização cardíaca fixados no dorso. Não é necessário que se faça suspensão abdominal, já que este procedimento não traz nenhuma vantagem sobre a resposta positiva da posição.
- Deve-se manter a prona por 16 a 20 horas/dia.

Preparação
Para minimizar algumas complicações, é importante, antes do procedimento, verificar se o tubo endotraqueal está posicionado 2 cm acima da carina e fixado de forma segura; parar a alimentação enteral e constatar a presença de resíduos alimentares; assegurar-se de que todos os acessos e cateteres estão desconectados; e durante o posicionamento em prona, mudar a posição da cabeça a cada duas a quatro horas.

Indicações [40] [41] [42] [43]:
  • Como terapia de resgate: precocemente (nas primeiras 48h) nos casos de SARA grave que não melhoram apesar do uso de tais estratégias ventilatórias protetora convencional em posição supina. Conforme o estudo PROSEVA, SARA Grave definida como a relação P/F < 150 com FiO2 ≥0,6 e PEEP ≥5 cm H2O.
  • Na hipoxemia refratária devido a SARA: Uma definição razoável é uma relação P/F ≤100 mmHg com PaO2 ≤60 mmHg, apesar da otimização dos ajustes do ventilador com FiO2 de 100%.
  • Na SARA moderada (segundo definição de Berlim), quando:
- Após PEEP titulada;
- IVD (Insuficiência Ventricular Direita Aguda – Cor Pulmonale Agudo) moderada a grave
  • Na impossibilidade de sustentar ventilação protetora: paciente com Pressão de Distensão (Driving Pressure) > 15 cmH2O; FR > 35 rpm; pH < 7,2.
  • Em raras circunstâncias, a ventilação propensa tem sido usada como uma ponte para a ECMO

Contraindicações
a) Absolutas:
·         Choque refratário
·         Sangramento agudo (por exemplo, HDA, hemoptise maciça)
·         Múltiplas fraturas ou traumas (por exemplo, fraturas instáveis do fêmur, pelve, face)
·         Instabilidade ou risco de instabilidade da coluna vertebral (TRM, artrite reumatoide)
·         Hipertensão intracraniana com PIC > 30 mmHg ou pressão de perfusão cerebral <60 mmHg
·         Cirurgia traqueal ou esternotomia dentro de duas semanas
b) Relativas:
·         TVP recente tratada por <2 dias
·         Instabilidade hemodinâmica (PAM  65mmHg)
·         Tubo (s) anterior (es) do tórax com vazamento de ar
·         Cirurgia abdominal maior
·         Cirurgia torácica
·         Via área difícil e intubação difícil.
·         Dialise peritoneal
·         Marcapasso recente, BIA, dispositivos de assistência ventricular
·         Arritmias graves com risco de vida
·         Condições clínicas que limitam a expectativa de vida (por exemplo, insuficiência respiratória dependente de oxigênio ou ventilador)
·         Queimaduras graves, principalmente anteriores.
·         Gravidez no 2º/3º trimestre
·         Receptor de transplante pulmonar
·         Uso prévio de terapias de resgate (óxido nítrico inalado, bimesialta de almitrina, oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) ou ventilação não invasiva (VNI) antes da intubação.
·         Intolerância previa à manobra de prona

Complicações
  • Compressão do nervo (por exemplo, lesão do plexo braquial)
  • Edema facial (melhora com trendelemburg reverso a 10º)
  • Ulcerações cutâneas (queixo, orelhas, região anterior do tórax, cristas ilíacas e joelhos)
  • Obstrução de via aérea superior por acúmulo de secreções
  • Deslocamento do tubo endotraqueal e cateteres
  • Disfunção do diafragma (pelo uso de BNM)
  • Feridas por pressão (por exemplo, facial)
  • Deslocamento de cateteres vasculares ou tubos de drenagem
  • Extubação acidental
  • Hipotensão severa
  • Arritmias
  • Úlceras de córnea
  • Redução transitória da saturação arterial de oxigênio
  • Vômito (melhora com trendelemburg reverso a 10º)
  • Arritmias transitórias
  • Barotrauma devido a intubação traqueal seletiva

4.1.2. TÉCNICA PROTOCOLIZADA:
1-      Paciente em posição supina com cabeceira a 0 grau
2-      Importante checar posição de equipos, traquéia da prótese ventilatória, sondas (vesical e nasoentérica) e estabilidade hemodinâmica do paciente antes do início da manobra
3-      Parar dieta antes de pronar.
4-      Sedação e analgesia profundas, com ou sem bloqueio meuromuscular (BNM)
5-      Instituir acesso venoso central e monitorização contínua de pressão arterial invasiva.
6-      Fi02 100%. Dar preferência ao movo ventilatório volume controlado (VCV)
7-      Posicionar as mãos do paciente embaixo da região glútea com a palma da mão voltada para baixo com devida proteção ocular (manter olhos fechados)
8-      Colocar coxins na frente do paciente distribuídos de modo a aliviar os pontos de apoio anatômicos principais (usar o KIT prona, se disponível). Colocar os coxins na cintura pélvica e escapular para alivio da compressão sobre o abdome. Deve-se usar proteção para testa, face, joelhos e ombros (placas hidrocolóides). Considerar colocar uma fralda absorvente na face do paciente. Trocar se muito úmido
9-      Cobrir  paciente com lençol cujas bordas laterais devem ser enroladas com as bordas do lençol onde o paciente está deitado, na forma de envelopamento que deve se manter firme para uma melhor mobilização do paciente.
10-  Movimentar paciente em bloco com devida comunicação da equipe em 3 tempos (horizontal -> decubito lateral com corpo para acima - > prona). Médico dirige os tempos dos movimentos na contagem de “1-2-3”. As pessoas que se encontram na parte lateral da cama deverão se posicionar de forma firme e estável (um passo na frente e outro atrás) usando o próprio corpo para evitar o risco de caída do corpo do paciente.
11-   Ajeitar a roupa de cama do paciente, posição de cateteres, e eletrodos no dorso do paciente.
12-  Posição da cabeça deve ser alternada com troca de posição de 2/2h (posição de “nadador”).
13-  Reiniciar dieta enteral com volume menor. Pode se manter o paciente em leve trendelemburg reverso para reduzir risco de vomito.
14-  Certificar-se de que os olhos estão fechados
15-  Monitorar resposta à prona com SpO2. Se houver dessaturação abaixo de 90% mantida após 10 minutos da rotação, retornar para supina.
16-  Retornar a posição supina se PCR, piora hemodinâmica grave, arritmias malignas ou suspeita de deslocamento da prótese ventilatória
17-  Coletar gasometria após 1 hora de prona. Considerar o paciente como respondedor se a P/F aumentar em 20% ou PaO2 aumentar em 10mm Hg.
18-  Manutenção da posição prona por 16 a 20 horas/dia.


4.1.3 VIDEOS ILUSTRATIVOS

4.2. EM PACIENTES EM VENTILAÇÃO ESPONTÂNEA COM COVID-19

Em 2015, Scaravilli e col., publicou uma série de casos retrospectivos de 15 pacientes com insuficiência respiratória hipoxêmica, submetidos a pronação em ventilação espontânea (não intubados). Em geral, a maioria dos pacientes apresentava pneumonia (13/15), eram imunocomprometidos (8/15), não necessitaram de intubação (13/15) e sobreviveram (12/15). Pronação foi realizada 43 vezes, representando uma média de duas vezes por paciente aproximadamente. Na maioria das vezes, o oxigênio era fornecido com uma máscara facial, máscara de BiPAP ou Capacete de CPAP (helmet). Tempo de pronação foi mínimo de 3 horas e máximo de 8 horas. Durante 18 procedimentos de pronação, o paciente foi mantido com a mesma quantidade de suporte respiratório durante todo o procedimento. A posição prona melhorou a oxigenação transitoriamente, mas depois diminuiu para a linha de base. Pronação não teve efeitos sobre a PaCO2, pH, frequência respiratória ou hemodinâmica. Dois procedimentos de pronação foram interrompidos devido à intolerância do paciente, mas nenhuma complicação foi observada. Este estudo tem sua limitado pelo seu desenho retrospectivo. Em particular, não está claro quais critérios de seleção foram usados para determinar quais pacientes foram submetidos a pronação. No entanto, medir os pontos temporais em série no curso de cada paciente permitiu que cada paciente sirva como seu próprio controle interno[44].
Normalmente, a posição prona é usada em pacientes intubados sob ventilação mecânica. No entanto, a fisiologia da pronação deve funcionar independentemente do tipo de ventilação (espontânea ou mecânica). Isto porque existem benefícios com a ventilação espontânea, como uma melhor depuração da secreção (a gravidade funciona a seu favor), o recrutamento de regiões posteriores do pulmão (dependentes) que frequentemente se tornam atelectáticas, melhor relação ventilação/perfusão. Pelo estudo de Scaravilli e col., o comportamento da curva de oxigenação em pacientes em ventilação espontânea foi similar ao dos pacientes em ventilação mecânica, sugerindo provavelmente a mesma fisiologia. Ainda, não estava claro se o paciente poderia tolerar períodos prolongados como preconizados para pacientes ventilados mecanicamente (pelo menos 16 horas, porém, mesmo que os pacientes não intubados não tolerassem tais períodos prolongados, algumas horas de pronação poderiam ser suficientes para recrutar as bases pulmonares. Os benefícios da pronação são inquestionáveis, já que poderia evitar a intubação e os riscos e efeitos deletérios da ventilação mecânica (VILI), sedação e uso de bloqueador neuromuscular, além de eventualmente evitar uma ocupação de leito de UTI. O principal risco de pronar paciente acordado em ventilação espontânea pode ser o atraso da intubação e piora clínica e da hipoxemia, aumentando o risco de dessaturação durante a intubação. Assim e pronação em pacientes acordados e em ventilação espontânea poderia ser considerada nas seguintes condições[45]:

(1) Insuficiência respiratória hipoxêmica (tipo I) isolada sem dispneia severa (paciente hipoxêmico com "aparência paradoxalmente bem"). Deve atender aos seguintes critérios:

·         sem falência de múltiplos órgãos
·         expectativa de que o paciente tenha uma lesão pulmonar bastante reversível e possa evitar intubação
·         sem hipercapnia ou dispnéia severa
·         estado mental normal, capaz de comunicar angústia ou desconforto
·         ausência de critérios de via aérea difícil

(2) Pacientes que manifestam “desejo de não ser intubados” (DNI). O principal risco de pronar acordado é que ele pode causar propositalmente atrasos excessivos e desnecessários da intubação. No paciente com DNI que está falhando com outros modos de ventilação, há pouco a perder com o teste de pronação acordada.

(3) Isso pode ser tentado como uma medida temporária para um paciente hipoxêmico, quando a intubação não estiver disponível imediatamente (por exemplo, dessaturação durante o transporte). Muitos pacientes acordados são capazes de se pronunciar, portanto isso pode ser possível sem outros recursos.

Após a publicação de Scaravilli e col. em 2015, não se sucederam novas publicações sobre o assunto caindo praticamente no esquecimento.

Entretanto, em 30.01.2020, Lin Ding e col. publicam no Critical Care, um estudo de coorte, multicêntrico, observacional e prospectivo realizado entre janeiro de 2018 e abril de 2019, para avaliar se o uso precoce de posição prona (PP) em paciente acordado e em ventilação espontânea, associada ventilação não invasiva (VNI) ou cânula nasal de alto fluxo (CNAF) poderia evitar a necessidade de intubação em pacientes com SARA moderada a grave. A eficácia da estratégia na melhoria da oxigenação foi testada em quatro grupos de pacientes: CNAF, CNAF + PP, VNI, VNI + PP. O desfecho primário foi a taxa de intubação. Os pacientes foram inicialmente colocados na VNI (CPAP/BiPAP) com PEEP de 5cmH20 e Fi02 inicial de 50% por pelo menos 30 minutos, visando como meta uma Sa02 ≥90% com Fi02 ≤ 60%. Caso a Sa02 < 90% após o teste inicial com VNI o paciente era colocado em posição prona, mantendo a VNI. Caso atingisse a meta, era colocado em CNAF sendo que se apresentava dessaturação < 90% era também colocado na posição prona mantendo a CNAF. A duração média do PP foi de 2 h duas vezes ao dia. Um total de 20 pacientes com SARA foram incluídos. As principais causas de SARA foram pneumonia por influenza (9 casos, 45%) e outros vírus (2 casos, 10%).  Dez casos eram SARA moderada e 10 casos eram graves. 11 pacientes evitaram a intubação (grupo de sucesso) e 9 pacientes foram intubados (grupo de falha). Todos os 7 pacientes com PaO2/FiO2<100 mmHg na VNI necessitaram de intubação. A PaO2/FiO2 em HFNC + PP foi significativamente maior no grupo de sucesso do que no grupo de falha (125 ± 41 mmHg vs 119 ± 19 mmHg, P = 0,043). A PaO2 / FiO2 demonstrou uma tendência ascendente nos pacientes de todos os grupos. O estudo concluiu que, a aplicação precoce de PP com HFNC, especialmente em pacientes com SARA moderada e SpO2 basal > 95%, pode ajudar a evitar a intubação. O PP foi bem tolerado, e a eficácia na PaO2/FiO2 das quatro estratégias de suporte foi: CNAF < CNAF + PP ≤ VNI < VNI + PP. Pacientes com SARA grave não eram candidatos adequados para HFNC/VNI + PP[46].

Em 2020, a situação de pandemia provocada pelo SARS-Cov-19, provocando quadros graves associados a insuficiência respiratória aguda, motivo inicialmente a recomendação de intubação precoce nesses pacientes. Ainda o risco de aerossolização de certos procedimentos como oxigenação com alto fluxo, ventilação não invasiva e nebulização, gerou muita controvérsia nas recomendações desses procedimentos, a despeito da sua já comprovada utilidade nos casos de insuficiência respiratória tipo I ou hipoxêmica, como são, em regra, os casos provocados pelo COVID-19.

Em contrapartida, a necessidade de buscar alternativas, que pudessem evitar a intubação e os riscos e efeitos deletérios da ventilação mecânica (VILI), sedação e uso de bloqueador neuromuscular, além de eventualmente evitar uma ocupação de leito de UTI deixando-o reservado para aqueles casos inevitáveis, levou a resgatar a posição prona em paciente em ventilação espontânea e acordado. Durante a pandemia alguns poucos estudos têm sido publicados a respeito assim como protocolos têm sido propostos, sem, no entanto, ainda, baseados em estudos de forte nível de evidência.

O artigo de Qin Sun e col., pode ser o primeiro em reconhecer o valor da pronação precoce em paciente acordado com COVID-19 como um método para evitar o colapso alveolar. Esses autores descreveram uma estratégia de tratamento empregada em seu centro (província de Jiangsu, China) de que se correlacionou com taxas de intubação e mortalidade consideravelmente mais baixas do que as observadas em outros locais. Sua estratégia envolveu intervenção precoce e pronação acordada com cânula nasal de alto fluxo ou ventilação mecânica não invasiva, para evitar o colapso alveolar[47].

Caputo e col., em uma série de casos que descrevem 50 pacientes com COVID-19 que se apresentaram ao departamento de emergência do Lincoln Hospital (New York, USA) com saturação de oxigênio < 90%, sendo tratados inicialmente com cânula nasal ou máscara facial de oxigênio não reinalante. A saturação média de oxigênio apesar desses dispositivos tradicionais foi de 84%. Todos eles teriam indicação de intubação precoce. Entretanto, os pacientes foram instruídos a permanecer na posição prona acordados. Em cinco minutos, a saturação média de oxigênio aumentou dez pontos, para 94%. Apesar dessas melhorias, 18 pacientes (36%) necessitaram de intubação (13 nas primeiras 24 horas, 3 nas 24-48 horas e 2 nas 72 horas). A maioria dos pacientes parece ter sido tratado com uma estratégia de rotação posicional contínua (por exemplo, 30 a 120 minutos em decúbito ventral, seguida de decúbito lateral esquerdo, decúbito lateral direito e posição supina). 64% dos pacientes melhoraram e evitaram a intubação[48]. Essa taxa de sucesso, se assemelha ao BiPAP que reduz a necessidade de intubação na exacerbação da DPOC na mesma quantidade (65%). No caso do BiPAP na DPOC, essa redução de 65% na taxa de intubação se correlaciona com uma redução na mortalidade de 46%. Portanto, uma redução nas taxas de intubação em 64% é um enorme benefício que provavelmente está relacionado à melhora da mortalidade. Certamente, este estudo não é um trial, mas parece representar uma descrição realista da aplicação de uma intervenção durante uma pandemia. Como os pacientes inicialmente atenderam aos critérios de “intubação precoce” para intubação, os pacientes serviram efetivamente como seus próprios controles.

Slessarev M. e col., publicaram um relato de caso de um paciente com pneumonia grave por COVID-19, que foi tratado com uma combinação de cânula nasal de alto fluxo (inicialmente a 60 litros/min e 90% de 02) e pronação por 16 a 18 horas por dia (incluindo 8 a 10 horas à noite). Pronação correspondeu a melhorias cíclicas na oxigenação. Durante o dia, ele era capaz de comer, se comunicar com sua família e participar de fisioterapia autodirigida. No 4º dia teve alta para enfermaria sem necessidade de intubação. Um relatório recente da Itália feito por Gattinoni e colaboradores, descreve 2 fenótipos de pneumonia por COVID-19. Na fase inicial, muitos pacientes apresentam hipoxemia grave na ausência de dispnéia e com complacência pulmonar preservada, baixo peso pulmonar, baixa relação ventilação/perfusão (V/Q) e recrutabilidade pulmonar (definida como o fenótipo L). Com tempo, alguns desses pacientes evoluem para uma SARA mais clássica, com baixa complacência pulmonar, alto peso pulmonar, alto grau de shunt e pulmão alta recrutabilidade pulmonar (definida como o fenótipo H). Muito provavelmente o paciente do caso reportado tenha sido inicialmente um fenótipo L que evolui após 2 dias para um fenótipo H. A razão proposta para hipoxemia no fenótipo inicial L é a desregulação da perfusão pulmonar e a ausência do fenômeno de vasoconstrição hipóxica (não havendo grandes áreas mal ventiladas, não se deflagra o mecanismo de vasoconstrição com redistribuição de fluxo para áreas mais bem ventiladas) com consequente vasoplegia e hipoxia. A infecção viral leva inicialmente a um edema intersticial subpleural local modesto (lesões em vidro fosco) particularmente localizado nas interfaces entre estruturas pulmonares com diferentes propriedades elásticas, onde o estresse e tensão são concentrados. A vasoplegia é responsável por hipoxemia grave. A resposta normal a hipoxemia é aumentar a ventilação minuto, principalmente aumentando o volume corrente (até 15-20ml/kg), que está associado a uma pressão inspiratória intratorácica mais negativa. Outros fatores além da hipoxemia, estimulam acentuadamente, nesses pacientes, o impulso respiratório. Este aumento na ventilação minuto leva a uma diminuição na PaCO2. Os pacientes do tipo L podem permanecer inalterados por um período e, em seguida, melhorar ou piorar. A possível característica que determina a evolução da doença - além da gravidade da própria doença, é a profundidade da pressão intratorácica negativa associada ao aumento do volume corrente em respiração espontânea. De fato, a combinação de pressão intratorácica inspiratória negativa e aumento da permeabilidade pulmonar devido a inflamação, resulta em edema intersticial pulmonar. Este fenômeno, inicialmente descrito por Barach em 1938 e Mascheroni em 1988, ambos em um ambiente experimental, foi recentemente reconhecida como a principal causa de lesão pulmonar autoinfligida pelo paciente (P-SILI). Com o tempo, o aumento do edema aumenta o peso pulmonar, a pressão sobreposta e as atelectasias dependentes. Quando o edema pulmonar atinge uma certa magnitude, o volume de gás no pulmão diminui e os volumes gerados para uma dada pressão inspiratória diminuem. Nesta fase, a dispnéia se agrava, que por sua vez leva ao agravamento do P-SILI. A transição do tipo L para o tipo H pode ser devido à evolução da pneumonia COVID-19, por um lado, e a lesão atribuível à alta tensão ventilatória por outro. As regiões pulmonares dorsais têm mais tecido pulmonar, vasculatura mais densa, resultando em menor resistência pulmonar e baixa vasoconstrição pulmonar hipóxica devido à maior expressão endotelial óxido nítrico. A posição prona resulta em maior distribuição do tecido pulmonar entre as regiões dorsal e ventral levando a uma arquitetura alveolar mais uniforme. Além disso, também leva a uma distribuição mais uniforme da perfusão pulmonar, reduzindo a heterogeneidade regional da relação V/Q, melhorando a oxigenação. É possível que a oxigenação melhorada evite o agravamento da dispnéia, enquanto a redistribuição do tecido pulmonar alterando a relação tensão-esforço pulmonar e as forças intratorácicas, retardam a formação de edema pulmonar e a progressão da doença do fenótipo L para H[49] [50].

Alguns ensaios clínicos (RCT) em andamento poderão nos trazer melhores evidências quanto à efetividade e segurança desta estratégia:

1. Prone Positioning in Spontaneously Breathing Nonintubated Covid-19 Patient: a Pilot Study (ProCov). ELHARRAR Xavier, Centre Hospitalier Intercommunal Aix-Pertuis/France (https://clinicaltrials.gov/ct2/show/NCT04344106).

- Os participantes do grupo intervenção (pacientes adultos >18 anos com COVID-19, não intubados em respiração espontânea) serão pronados por um tempo ideal de 3 horas.

- Desfecho primário:
·         Proporção de pacientes que respondem "à posição prona" (Período mínimo de duração da manobra: 1 hora) – “paciente respondedor”.
Ø  Melhora da PaO2 > 20% após 1 hora em posição prona em pacientes

- Desfechos secundários:
·         proporção de pacientes com "resposta persistente" após posição prona (Período: 1 dia) – “paciente respondedor persistente”.
Ø  Melhora da PaO2 > 20% 6 a 12 horas após retorno à posição supina (ressupinação).
·         Evolução da PaO2 (Período: 1 dia)
Ø  PaO2 1 hora após o início da posição prona e 6 a 12 horas após o retorno à posição supina.
·         Duração da posição prona e evolução da PaO2 (Período: 2 dias)
Ø  Procurar uma associação entre o tempo de posição prona e a resposta persistente ou não.
·         Evolução do SpO2 (Período: 1 hora)
Proporção de pacientes que melhoram a SpO2 dentro de 1 hora após a posição prona.
·         Dispnéia [Período: 1 dia]
Ø  Evolução da dispnéia (escores) 1 hora após o início da posição prona e 6 horas após o final da posição prona
·         Intolerância à posição prona (Período: 1 dia) – “paciente intolerante”
Ø  Proporção de pacientes que toleram a posição < 1 hora
·         Tolerância à posição prona (Período: 1 dia) – “paciente tolerante”
Ø  proporção de pacientes que conseguem manter a posição prona por mais de 3 h.

Critérios de Inclusão:
·         18 anos ou mais;
·         COVID 19 positivo por RT-PCR ou diagnóstico de sintomas clínicos e lesão tomográfica de tórax altamente suspeita durante o período de pandemia;
·         TC de tórax sem contraste dentro de 72 horas antes da inclusão;
·         Lesões tomográficas bilaterais, incluindo condensações posteriores e / ou predominância posterior de lesões;
·         Hospitalizado em uma unidade COVID ou unidade de terapia intensiva;
·         Respiração espontânea e oxigenoterapia com cânula nasal, máscara ou oxigenoterapia de alto fluxo;
·         Necessidade de oxigenoterapia ≥ 1l para Sat ≥ 90%;
·         Paciente que se beneficia da previdência social francesa, sob qualquer regime

Critério de exclusão:
·         Desconforto respiratório agudo (taquipneia > 25ipm ou uso de músculos respiratórios acessórios);
·         Alteração do nível de consciência;
·         Hemoptise ativa ou recente (<1 mês);
·         Tromboembolismo venoso recente (<1 mês);
·         Derrame pericárdico;
·         Derrame pleural severo, clínico ou por imagem;
·         Dor crônica nas costas ou cervical / história de cirurgia da coluna vertebral / metástases ósseas;
·         Feridas, trauma facial, cirurgia traqueal, esternal ou facial <15 dias;
·         Cirurgia abdominal recente (<1 mês);
·         Hipertensão Intracraniana> 30mmHg;
·         Paciente privado de liberdade, sob tutela ou curadoria;
·         Mulher grávida ou amamentando.

2. Impact of Prone Position in Patients Under Spontaneous Breathing on Intubation or Non-invasive Ventilation or Death Incidence During COVID-19 Acute Respiratory Distress (PROVID-19). Centre Hospitalier Régional d'Orléans/France. Este é um estudo controlado randomizado, multicêntrico que deverá inlcuir 400 pacientes com diagnóstico de COVID-19 e submetidos à oxigenoterapia convencional (grupo controle) ou a posição prona (gripo intervenção) aleatoriamente designados, em uma proporção de 1: 1. O grupo controle manterá o paciente em posição convencional: semissentado na cama ou sentado em uma cadeira. A posição prona não será permitida durante o dia (será permitida à noite se for a posição natural de dormir). O grupo de intervenção submeterá o paciente a sessões de 30 minutos a 1 hora de posição prona, seguidas de 2 horas de posição convencional (semissentado na cama ou sentando na cadeira). O objetivo é 5 sessões de posição prona durante o dia entre as 7h e as 22h. O máximo de posição prona à noite. Os pacientes devem poder se posicionar sozinhos ou com assistência mínima. O paciente estará livre para escolher sua posição prona preferida (https://clinicaltrials.gov/ct2/show/NCT04363463?term=Prone+Positioning+in+Spontaneously+Breathing&draw=2&rank=2).

- Desfecho primário:
·         Porcentagem de idade dos pacientes que serão submetidos a intubação endotraqueal ou ventilação não invasiva em dois níveis de pressão e/ou morrerão, em cada um dos 2 grupos de randomização. [Período: 28 dias]
Ø  Mostrar que a posição prona em pacientes com ventilação espontânea pode reduzir o risco de adquirir o seguinte evento (endpoint composto):
§  Intubação endotraqueal
§  Ou ventilação não invasiva (VNI) com dois níveis de pressão
§  E / ou morte

- Desfechos secundários:
·         Duração em dias para a mudança de 2 pontos na escala ordinal da OMS [Período: Dia 28]
Ø  Mostrar que o uso da posição prona melhora a pontuação da escala ordinal da OMS em 2 pontos mais rapidamente (após a randomização)
·         Taxa (%) de intubação e ventilação invasiva nos 2 grupos de randomização. [Período: dia 28]
Ø  Mostrar que a posição prona com ventilação espontânea reduz a necessidade de intubação endotraqueal e ventilação mecânica invasiva

·         Taxa (%) de ventilação não invasiva em dois níveis de pressão nos 2 grupos de randomização [Período: Dia 28]
Ø  Mostrar que a posição prona com ventilação espontânea reduz o uso de ventilação não invasiva em dois níveis de pressão
·         Duração da oxigenoterapia nos 2 grupos de randomização. [Período: dia 28]
Ø  Mostrar que a posição prona na ventilação espontânea reduz o tempo sob oxigenoterapia.
·         Duração da internação nos 2 grupos de randomização. [Período: dia 28]
Ø  Mostrar que a posição prona reduz o tempo de hospitalização.
·         Mortalidade hospitalar e mortalidade em D28 nos 2 grupos de randomização [Período: Dia 28]
Ø  Comparar a mortalidade hospitalar dos 2 grupos
·         Taxa (%) de necessidade de transferência para unidade de terapia intensiva [Período: dia 28]
Ø  Comparar a incidência da necessidade de transferência de ressuscitação entre os dois grupos.
·         Taxa (%) de uso de ventilação não invasiva em dois níveis de pressão, intubação durante toda a estadia, quando a estadia for superior a 28 dias. [Prazo: 1 ano]
Ø  Comparar o impacto do uso de ventilação não invasiva e intubação em toda a internação hospitalar quando a internação for superior a 28 dias entre os dois grupos.

Critério de inclusão:
·         Pacientes de 18 a 85 anos
·         Com confirmação de COVID-19
·         Em tratamento com oxigenoterapia (cânula nasal, máscara de média ou alta concentração ou cânula nasal de alto fluxo)
·         Capaz de mudar para a posição prona sozinho ou com assistência mínima
·         Termo de consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
·         Hospitalizado na unidade COVID por menos de 72 horas

Critério de exclusão:
·         Mulheres grávidas (teste positivo de gravidez durante a triagem) ou amamentando
·         Paciente em uso de oxigenoterapia prolongada ou pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP) ou ventilação não invasiva (VNI) em casa
·         Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC), estágio 3 ou 4
·         Paciente com doença pulmonar intersticial difusa crônica conhecida
·         Paciente com patologia neuromuscular
·         Contraindicação a posição prona (trauma torácico recente, pneumotórax, fratura ortopédica impedindo mobilização, etc)
·         Trombose venosa profunda dos membros inferiores com anticoagulação eficaz por menos de 48 horas
·         Instabilidade hemodinâmica (PAM <65 mm Hg) persistindo por mais de 1 hora
·         Frequência respiratória superior a 40 ciclos por minuto
·         Uso excessivo dos músculos respiratórios acessórios (a critério do clínico)
·         Indicação para VNI curativa (edema pulmonar agudo ou insuficiência respiratória hipercápnica aguda)
·         Síndrome Oclusiva Intestinal
·         Paciente incapaz de proteger as vias aéreas superiores
·         Incapacidade de entender o francês ou de seguir instruções para a posição prona.
·         Pessoa sob tutela
·         Maiores Protegidos
·         Não afiliado à segurança social francesa
·         Decisão de não renunciar à terapia de manutenção da vida
·         O paciente recebeu alta de uma unidade de terapia intensiva e foi tratado por ventilação mecânica invasiva ou não invasiva a 2 níveis de pressão durante a ressuscitação.

De acordo com os resultados do estudo de Ding L. e col. já citando anteriormente, posição prona poderia ser combinada com uma variedade de técnicas adicionais:

·         Prona + ar ambiente
·         Prona + sistema de oxigenoterapia de baixo fluxo
·         Prona + CANF
·         Prona + VNI (BiPAP/CPAP através de uma máscara facial)
·         Prona + VNI (BiPAP/CPAP através de uma interface de capacete ou helmet).

Ainda, visando reduzir a aerossolização dispositivos podem ser adaptados como aqueles recentemente divulgados (capsulas isolantes com sistemas de sucção/aspiração e tratamento de ar com filtro HEPA, máscaras full-face adaptadas com acoplamento de filtros HEPA).

Muito embora ainda sejam poucas as evidências do uso da posição prona em pacientes em ventilação espontânea, a atual conjuntura de pandemia tem motivado que diversas instituições tenham adotado protocolos em diversas instituições nacionais e internacionais[51] [52].

4.2.1. TÉCNICA PROTOCOLIZADA

De acordo com a literatura apresentada e experiencias existentes adota-se o seguinte PROTOCOLO PARA PACIENTES COVID-19:

1.      Paciente com suporte de oxigênio para atingir SaO2 = 92 - 96% (88-92% se houver risco de insuficiência respiratória hipercápnica) E suspeita/confirmação de COVID-19.

2.      Considere posição prona, se paciente tiver capacidade de:
  • Comunicar-se e cooperar com o procedimento.
  • Mudar de posição de forma independente
  • Não tiver risco de via aérea difícil

3.      Avalie Contraindicações:
3.1 Contraindicações absolutas
- Desconforto respiratório (FR ≥ 35, PaCO2 ≥ 65mmHg, uso muscular acessório)
- Necessidade imediata de intubação
- Instabilidade hemodinâmica (PAS <90mmHg) ou arritmia
- Agitação ou estado mental alterado
- Coluna instável / lesão torácica / cirurgia abdominal recente
3.2 Contraindicações relativas:
- Lesão facial
- Problemas neurológicos (por exemplo, convulsões frequentes)
- Obesidade mórbida
- Gravidez (2/3 trimestres)
- Feridas por pressão / úlceras
- Recusa terapêutica

4.      Siga a técnica padronizada:
- Explicar ao paciente o procedimento, riscos e benefícios, obtendo o seu consentimento (registrar em prontuário)
- Se possível acoplar sistema de redução de aerossolização (capsulas isolantes com sistemas de sucção/aspiração e tratamento de ar com filtro HEPA, máscaras full-face adaptadas com acoplamento de filtros HEPA)
- Garantir oxigenoterapia e suporte respiratório básico seguros (ver métodos combinados descritos com preferência para VNI)
- Acoplar kit de almofadas para proteger os pontos de pressão (face, tórax, bacia, joelhos)
- Orientar e instruir o paciente a adotar a posição do nadador ou com os braços estendidos por cima da cabeça, ou na posição em que melhor o paciente se adapte, mantendo-se pronado.
- A posição do trendelenberg reverso pode ajudar no conforto.
- Monitorar saturação arterial de oxigênio. Se houver queda, garanta que o O2 esteja conectado e funcionando
- A sedação não deve ser administrada para facilitar a pronação

5.      Monitore as saturações de oxigênio por 15 minutos e observe se atinge a meta prevista: SaO2 = 92-96% (88-92% se houver risco de insuficiência respiratória hipercápnica) e nenhum desconforto evidente.
5.1  Meta atingida:
Continue na posição prona:
- Mude de posição a cada 0.5 - 2 horas, com o objetivo de obter um tempo de pronação maior possível:
·         30 minutos a 2 horas totalmente deitado em prona (cama plana)
·         30 minutos a 2 horas no lado direito (cama plana)
·         30 minutos a 2 horas sentado (30-60 graus) ajustando a cabeceira da cama
·         30 minutos a 2 horas deitado no lado esquerdo (cama plana)
·         30 minutos a 2 horas totalmente deitado em prona de novo
·         Repita o ciclo …….
- Monitorar saturações de oxigênio após cada mudança de posição
- Titule os requisitos de oxigênio conforme possível
- Não há limite de dias para uso da estratégia de prona, enquanto ela atinja os objetivos de melhora

   5.2 Se meta não for atingida ou piorar a saturação de oxigênio:
   - Verifique se o oxigênio está conectado ao paciente
   - Aumentar a Fi02
   - Alterar a posição do paciente
   - Considere retornar à posição supina

  5.3 Considerar intubação e transferência a UTI se:
  - Nenhuma melhoria for obtida com a pronação (fracasso terapêutico)
  - Paciente incapaz de tolerar a posição prona
  - Insuficiência respiratória clínica (FR ≥ 35, dispneico, usando músculos acessórios)

4.2.3 VIDEOS ILUSTRATIVOS



[1] https://www.studocu.com/pt-br/document/universidade-de-ribeirao-preto/histologia/resumos/fisiologia-respiratoria/5394689/view
[2] Guyton e Hall. Tratado de Fisiologia Médica. Tradução da 13ª edição. 2017.
[3] https://www.uptodate.com/contents/prone-ventilation-for-adult-patients-with-acute-respiratory-distress-syndrome?search=prone%20positioning%20adult&source=search_result&selectedTitle=1~150&usage_type=default&display_rank=1
[4] Ferran Roche-Campo, et.al. Prone positioning in acute respiratory distress syndrome (ARDS): When and how?. tome 40 > n812 > décembre 2011. doi: 10.1016/j.lpm.2011.03.019
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