quarta-feira, 24 de janeiro de 2024

PROPHY-VAP trial.

MONODOSE PROFILÁTICA DE 2gr DE CEFTRIAXONA PARA PAV PRECOCE EM NEUROCRÍTICOS. PROPHY-VAP trial. 

Dr. Alejandro Barba Rodas

Médico Coordenador da UTI Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos.



PROPHY-VAP trial, é um ensaio de superioridade multicêntrico, randomizado, duplo-cego, controlado por placebo, com avaliação cegada, realizado em 9 UTIs de 8 hospitais universitários franceses, que teve com objetivo avaliar o efeito de uma dose única de 2gr de ceftriaxona na prevenção de PAV precoce em pacientes adultos  com lesão cerebral aguda em ventilação mecânica.



GRUPO POPULACIONAL ALVO:


  1. Pacientes  adultos: ≥18 anos;
  2. Pacientes “comatosos”, neste estudo definidos pela Escala de Coma de Glasgow  ≤12; 
  3. Ventilação mecânica ≥ 48 horas;
  4. Apenas pacientes com lesão cerebral aguda: traumatismo cranioencefálico (TCE), acidente vascular cerebral isquêmico (AVC-i),  hemorrágico (AVC-h) ou hemorragia subaracnóidea (HSA); 
  5. Ausência de doença infecciosa;
  6. Nenhuma terapia antibiótica contínua;
  7. Não estar  internado no hospital por > 48 horas:
  8. Não estar intubado >12 horas.

INTERVENÇÃO:

Pacientes receberam 2 g de ceftriaxona EV em dose única (30 minutos) ou placebo nas 12 horas seguintes à intubação traqueal.

Randomizacão 1:1.

Os participantes não receberam descontaminação seletiva da orofaringe e do trato digestivo.  

DESFECHO

O desfecho primário foi a proporção de pacientes que desenvolveram PAV precoce.
PAV precoce: definida por critérios clínicos, radiológicos e laboratoriais ocorrendo entre o  2º ao 7º dia de ventilação mecânica. Destaque-se que foi escolhido um ponto de corte de 7 dias após a intubação traqueal em vez de 5 dias porque em pacientes com lesão cerebral, o risco de desenvolver PAV devido a microrganismos resistentes a antibióticos permanece baixo até o dia 8. 

A análise foi relatada na população com intenção de tratar modificada, que compreendia todos os pacientes designados aleatoriamente, exceto aqueles que desistiram ou não deram consentimento para continuar e aqueles que não receberam o tratamento alocado porque atenderam a um critério de não elegibilidade.  

RESULTADOS

De 14 de outubro de 2015 a 27 de maio de 2020, 345 pacientes foram randomizados (1:1) para receber ceftriaxona (n=171) ou placebo (n=174). 330 receberam a intervenção alocada e 319 foram incluídos na análise (162 no grupo ceftriaxona e 157 no grupo placebo).  166 (52%) participantes da análise eram homens e 153 (48%) eram mulheres.  15 pacientes não receberam a intervenção alocada após a randomização e 11 retiraram o consentimento.  A decisão confirmou 93 casos de PAV, incluindo 74 infecções iniciais.  

A incidência de PAV precoce foi menor no grupo ceftriaxona do que no grupo placebo (23 [14%] vs 51 [32%]; taxa de risco 0,60 [IC 95% 0,38–0,95], p=0  ·030), sem impacto microbiológico e sem efeitos adversos atribuíveis à ceftriaxona. 




CONCLUSÃO DOS AUTORES

Com base nesses achados, os autores recomendam uma dose única e precoce de ceftriaxona (2gr) para prevenção de PAV em pacientes com lesão cerebral aguda que necessitam de ventilação mecânica, visto que esta  população apresentam alto risco de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV).  Esse alto risco é atribuído à aspiração frequente de microrganismos da orofaringe antes da intubação traqueal e à ocorrência de depressão imunológica na primeira semana após a lesão cerebral. 

Mais importante ainda, os desfechos centrados no paciente também foram positivos. Houve melhorias estatisticamente significativas no número de dias sem ventilador, dias sem UTI e dias sem hospitalização. 

A mortalidade e os desfechos neurológicos melhoraram após 28 dias, mas após 60 dias essas diferenças perderam significância estatística.

COMENTÁRIOS

Apesar de que já está bem documentada a associação do rebaixamento do nível  de consciência avaliado por um Escore de Coma de Glasgow (GCS) ≤14 e risco de broncoaspiracão  (Medeiros e col. 2016), a definição se “coma” ou “paciente  comatoso” usualmente é atribuída à um GCS ≤8. De qualquer forma, ao que parece, no estudo selecionou-se os pacientes de acordo com a Classificação do TCE: moderado (GCS = 9 a 12), Grave (GCS = 4 a 8) equiparável à definição de coma e GCS =3 para coma profundo.

Deve se ter cautela na interpretação dos resultados, já que diferem de alguna ensaios randomizados anteriores, que não relataram impactos significativos no tempo de internação ou na mortalidade. 

Além disso, o estudo não teve poder suficiente para avaliar a resistência aos antibióticos, particularmente a longo prazo, e não avaliou o impacto potencial da profilaxia antibiótica em outras populações das UCI e dos hospitais. 

Não está claro se e como esses resultados serão generalizados para UTIs com diferentes perfis de flora predominante e de resistência a antibióticos.

Sendo assim, precisa-se de mais estudos abrangendo uma população maior de pacientes neurológicos e outras populações de pacientes de UTI não neurológicos para se ter uma maior força de evidência.