domingo, 10 de fevereiro de 2019

EDEMA PULMONAR DE RE-EXPANSÃO (E.P.R.E.) E O ULTRASSOM PULMONAR COMO PARTE DA PROPEDÊUTICA.

Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico Intensivista. Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos.


O Jornal americano CHEST deste mês de fevereiro traz um caso muito interessante sobre uma patologia pouco frequente: O EDEMA PULMONAR DE RE-EXPASÃO (E.P.R.E.) Reexpansion pulmonary edema (REPE). A propósito do caso, faz uma rápida revisão sobre o tema dando especial ênfase ao uso da ultrassonografia pulmonar a beira leito (ultrassom point-off-care - POCUS) no diagnóstico e monitorização de sua resolução como alternativa eficaz a exames convencionas como radiografia e tomografia de tórax[ARTIGO CHEST].

A propósito desse caso e salientando que as imagens e o caso pertencem ao artigo acima citado, faremos esta revisão e discussão fazendo algumas adaptações no contexto descrito.

CASO RELATADO:

Paciente de sexo masculino, de 46 anos de idade apresentou-se no PS referindo dor torácica à direita de forte intensidade e de início súbito, tosse seca e dispneia, sem relato de febre. História pessoal pregressa de tabagismo desde os 15 anos. Sem relatos de medicamentos de uso continuo.

Na admissão no PS, o paciente estava com dor torácica intensa à direita. No exame clínico inicial apresentava na ausculta respiratória MV abolido no HTD. Sinais vitais: PA =140/80 mmHg; FC= 75 bpm; FR=20 rpm; TAX= 37ºC; e Sa02=94% em ar ambiente. Exames laboratoriais sem achados relevantes.

Radiografia de tórax mostrou colapso do pulmão direito resultante de pneumotórax espontâneo, já que não havia relato de trauma torácico associado (figura 1).

Figura 1. Rx de tórax na admissão

Feita drenagem de tórax com selo d´água no quarto espaço intercostal e linha axilar média. Após drenagem o paciente começou a tossir e a apresentar tremores. Rx de tórax controle após a drenagem, mostrou a expansão do pulmão, revelando, no entanto, uma área de hipodensidade no 1/3 médio e basal do pulmão direito (figura 2):

Figura 2. Rx de tórax controle, pós drenagem

Levantada hipótese de pneumonia comunitária (PAC) foi escalonado empiricamente antibiótico a base de levofloxacina 750 mg 12/12h.

2 horas depois da drenagem, o paciente evolui com piora da dispneia. Sa02 caiu para 86% apesar de estar com CBN e suplemento de oxigênio a 4 L/min. O CBN foi substituído por máscara facial com reservatório a 8L/min, obtendo uma melhora da saturação para 96%.

Uma ultrassonografia pulmonar à beira do leito (POCUS) foi realizada, mostrando sinais de um pequeno pneumotórax na parte superior do pulmão direito (presença de linhas A, ausência de deslizamento pleural e de linhas B), com presença do sinal do ponto pulmonar (lung point) na linha axilar anterior, consolidação no lobo inferior direito com presença de broncograma aéreo estático e dinâmico e áreas de  síndrome intersticial nas áreas remanescentes associadas a uma linha pleural irregular: 
A ultrassonografia pulmonar mostra no vídeo, na primeira parte, uma ampla consolidação de todo o lobo inferior direito, com broncograma aéreo, mostrado o pulmão com ecotextura parecida com o fígado (hepatizaão) traduzindo imagem de consolidação ultrassonográfica. Na segunda parte, com uma sonda linear, vemos o pneumotórax no quarto espaço intercostal medial ao mamilo, visualizando-se o ponto pulmonar (lung point) na linha axilar anterior. Na terceira parte do videi, observa-se, perto do ponto pulmonar, uma área de edema intersticial caraterizado pela presença de linhas B patológicas e irregularidade da linha pleural. 

Uma tomografia computadorizada de tórax foi realizada. O laudo descreveu um pequeno pneumotórax apical e uma consolidação inflamatória no lobo inferior direito. O quadro intersticial de natureza infecciosa também foi visto na parte superior do lobo médio. Nenhum derrame pleural foi evidenciado (figura 3).


Figura 3. TC de tórax pós drenagem

O paciente foi então submetido a VNI com 7 cm H2O de PEEP. Monitorou-se com USG pulmonar a cada 2 horas e observou-se um recrutamento alveolar rápido da área de consolidação. 
A ultrassonografia pulmonar é repetida durante uma ventilação não invasiva (VNI), usando 7 cm H2O de PEEP. Apreciamos o recrutamento de áreas distais dentro da consolidação.

Importante redução da área de consolidação ocorreu 8 h após o diagnóstico (4h com PEEP e 4h com oxigênio através de cânula nasal). 
Se compararmos este vídeo com os primeiros, podemos ver uma grande redução na dimensão da área consolidada (o fígado está à direita), enquanto a área intersticial na periferia é maior.

Resolução completa da consolidação ocorreu após 48 h, com sinais apenas de síndrome intersticial residual. O Rx normalizou nos 2 dias subsequentes. O paciente recebeu alta após 5 dias de internação.

DISCUSSÃO:

O edema pulmonar de reexpansão (EPRE) é uma doença que ocorre como complicação da reexpansão do pulmão colabado, após drenagem de um pneumotórax, derrame pleural ou após reexpansão de uma atelectasia existente previa de outra etiologia. Foi descrito pela primeira vez em 1958[1].

Sua incidência é considerada rara. Echevarria e col., publicaram um artigo no qual consultaram o Medline e pesquisaram artigos datados de 1950 a janeiro de 2008. Dos 233 artigos revisados, 13 forneceram informações sobre a existência de EPRE com incidência relatada de 0% a 1%. Mynarek e col. encontraram ocorrência 0 de EPRE após investigar 711 procedimentos de toracocentese guiados por ultrassonografia realizados em 371 pacientes. Rozenman e col. detalharam sua experiência em um período de 8 anos em que 180 pacientes apresentaram 320 episódios de pneumotórax e apenas em 3 dos 320 casos, EPRE foi diagnosticado. Todos esses artigos concluem que a EPRE, em geral, é realmente uma entidade rara[2].

Quanto à sua etiologia, a causa do EPRE é ainda hoje considerada desconhecida. Apesar de mais de 60 relatos de casos terem sido descritos na literatura em um período de 50 anos, a fisiopatologia dessa entidade é ainda obscura. Muitos autores citam como fatores predisponentes: o tempo prolongado de colapso (> 3-7 dias); rapidez da reexpansão (< 10 min usando um sistema de sucção); intensidade da reexpansão (evacuação de > 2.000 mL em caso de derrames, sendo recomendado 1-2L a cada 2 horas) como principais fatores predisponentes do EPRE. Alguns dos fatores de risco descritos parecem ser tabagismo, idade (aumento do risco em pacientes mais jovens) e sexo (maior no sexo feminino)[3] [4]. Meriand e col., também sugerem um aumento da permeabilidade microvascular e/ou alveolar pulmonar, já que em seu estudo, PCP e PAP normais descartaram aumento da pressão hidrostática como causa[5]. Entretanto publicações mais recentes em paciente com função ventricular diminuída apontam que uma reexpansão pulmonar após evacuação de liquido ou ar associado à inspiração do paciente, gerará pressões pleurais negativas, aumento do retorno venoso e do enchimento ventricular com consequente aumento da pressão transpulmonar (pressão intracavitária – pressão pleural), e da pós-carga ventricular, prejudicando o desempenho ventricular com consequente aumento da pressão capilar pulmonar e edema intersticial[6].

Numa consulta atualizada usando como fonte o UpToDate, encontramos que EPRE é considerado uma das formas de Edema Pulmonar Não Cardiogênico (EPNC)[7] que geralmente ocorre unilateralmente após rápida reexpansão do pulmão colapsado (tipicamente por mais de três dias) em pacientes com pneumotórax, com taxas variando de 16 a 33%. Os fatores de risco incluem diabetes, tamanho do pneumotórax e presença de derrame pleural. Embora raramente (1%), pode seguir-se a evacuação de grandes volumes de líquido pleural (> 1 a 1,5 litros) ou a remoção de um tumor endobrônquico obstrutivo que provocou atelectasia. O mecanismo fisiopatológico é desconhecido. Os mecanismos propostos incluem lesão direta e disfunção do surfactante no pulmão atelectásico crônico, aumento das pressões transpleurais quando pressões pleurais excessivamente negativas são criadas durante a remoção de fluidos ou ar, ou lesão indireta da reperfusão da área reexpandida. O EPRE parece estar relacionado à rapidez da reexpansão pulmonar e à gravidade e duração do colapso pulmonar antes da reexpansão. No entanto, um estudo que examinou o desenvolvimento de edema pulmonar de reexpansão após toracocentese mostrou que era independente do volume de líquido retirado e das pressões pleurais, e recomendou que mesmo grandes derrames pleurais fossem drenados completamente enquanto a dor torácica ou a pressão pleural expiratória final fossem menores que -20 cmH2O. Os pacientes geralmente desenvolvem rapidamente o quadro (minutos a horas), embora a apresentação possa ocorrer após 24 a 48 horas em alguns casos. O curso clínico varia de alterações radiográficas isoladas a colapso cardiopulmonar completo, mas a maioria dos pacientes apresenta dispneia de início agudo, tosse e hipoxemia. Os achados típicos de TC incluem opacidades em vidro fosco ipsilaterais, espessamento septal, consolidação focal e áreas de atelectasia. Uma taxa de mortalidade tão alta quanto 20% foi descrita em uma pequena revisão. No entanto, consistente com a nossa experiência, a mortalidade é muito menor com as séries maiores e posteriores relatando uma taxa de mortalidade inferior a 5%[8].

Muitos autores acreditam que o EPRE deve ser incluído na lista de causas de síndrome do vazamento capilar difuso[9]. O edema intersticial e o colapso alveolar com atelectasia compressiva ocasionado podem levar a hipoxemia e se uma quantidade suficiente de fluido for sequestrada no interstício pulmonar, hipovolemia e choque podem ocorrer. Pacientes com casos leves de EPRE podem necessitar apenas oxigênio por cateter nasal. VNI pode ser necessária em caso de hipoxemia moderada/grave. A ventilação mecânica invasiva é a última opção no caso de falha de ventilação não invasiva. Normalmente, os achados da radiografia torácica são inespecíficos e apresentam grau variável unilateral de opacidades do espaço aéreo[10].

Considerando a fisiopatologia da EPRE, no caso relatado esperava-se encontrar um perfil “B” ou um “pulmão branco” no USG pulmonar realizado. Causou surpresa encontrar uma ampla consolidação no lobo inferior direito. Em razão do EPRE poder imitar outras doenças ou levar a doenças pulmonares inesperadas subjacentes que podem estar escondidas no pulmão colapsado, a diferenciação radiológica do EPRE com outras lesões pulmonares deve ser sempre feita.
Em 2010, Kim e col., realizaram uma tomografia computadorizada de alta resolução em de todos os seus pacientes com EPRE, procurando sinais patognomônicos. Na maioria dos casos, os resultados mostraram áreas de opacidade em vidro fosco, consolidações e espessamento intersticial (intra e interlobular). Infelizmente, nenhum destes é específico para o EPRE[11].

O que pode ajudar no diagnóstico diferencial entre pneumonia e EPRE é o quadro clínico: um rápido início e uma resolução dramática dentro de algumas horas de iniciada a ventilação não invasiva com PEEP aponta para presença de EPRE.

O USG pulmonar tornou-se comumente usados nas últimas décadas, não só em cuidados intensivos, medicina de emergência, ou cirurgia do trauma, mas também na clínica médica e pneumologia[12]. Isso ocorreu porque o USG é feito com equipamentos relativamente baratos, é um exame rápido (5 min para a maioria dos usos na medicina interna), e pode ser realizado e repetido a beira leito (POCUS) sem efeitos colaterais[13].

USG pulmonar a beira leito já é um exame consagrado com exaustivos estudos publicados validando seu uso desde os trabalhos de pesquisa feito por professores renomados como o francês Daniel A. Lichtenstein e o italiano Giovanni Volpicelli, por citar apenas 2 nomes de uma grande lista de ícones do ultrassom poin-off-care (POCUS).

Há muito tempo já se sabe que tanto a radiografia de tórax (Rx) quanto a tomografia computadorizada de tórax (TC) têm limitações no diagnóstico de doenças pulmonares do paciente crítico[14]. O pneumotórax, trata-se de uma patologia que utiliza a radiografia de tórax como método de diagnóstico padrão. Entretanto alguns casos podem não ser detectados. A tomografia, embora de grande utilidade, reveste-se de maior custo e riscos para o paciente, decorrentes do uso de radiação e das complicações durante o transporte até o centro de imagem. Durante muito tempo, a ultrassonografia torácica foi considerada um método inútil para avaliar as patologias pulmonares. O estudo e a classificação de determinados padrões de imagens adquiridos com a ultrassonografia pulmonar permitiram que esse exame se transformasse em uma opção diagnóstica e de monitorização muito promissora.

Em 2009 o prof. Daniel A. Lichtenstein e col., publicar um estudo correlacionado o perfil detectado pelo USG pulmonar e a pressão capilar pulmonar. Aponta que ≥ 3 linhas “B” visualizadas em um mesmo espaço intercostal é indicativo de patologia, imagem denominada de “rastro de foguete” caracterizando a síndrome intersticial. No artigo faz uma interessante correlação entre o padrão ultrassonográfico e tomográfico (figura 4):

Figura 4: Nas imagens superiores vemos: A: espaço intercostal com uma linha “B”, sem significado patológico, sinalizando um sujeito saudável. Em B e C espaços intercostais com ≥ 3 linhas “B” que nascem da pleura (rastro do foguete) definindo a síndrome intersticial. Ainda, em B observa-se 4 ou 5 linhas “B” separadas por uma distância aproximada de 7mm entre elas (medidas na linha pleural) pelo que são denominadas de “linhas B7” que se correlacionam com septos interlobulares subpleurais espessados. Em C, a distância entre as linhas “B” é de aproximadamente 3mm pelo que se denominam “linhas B3” que se correlacionam com lesões subpleurais em padrão de vidro fosco. Nas imagens inferiores observamos a correlação de imagens tomográficas com as do ultrassom. Em 1, tomografia computadorizada normal. Nenhum elemento é visível na parede torácica anterior, correlaciona-se com a imagem A. Em 2, síndrome alveolar e intersticial aguda. Os septos subpleurais e interlobulares são espessados (setas) e, portanto, visíveis na tomografia computadorizada, correlacionando-se com a imagem B do ultrassom. Em 3, áreas em vidro fosco se apoiam no pulmão anterior esquerdo (setas), correlaciona-se com a imagem C do ultrassom. As lesões em “vidro fosco” observadas à TC de tórax nas síndromes intersticiais mais graves têm correlação com a presença de linhas B3. Entretanto, independentemente da terminologia utilizada, quanto mais linhas “B” presentes por espaço intercostal tanto maior o número de septos interlobulares subpleurais espessados por líquido ou fibrose. Lichtenstein e cols encontraram uma correlação positiva entre as alterações radiográficas e a presença de linhas “B” patológicas com uma sensibilidade e especificidade muito boas, ambas de 93%. Quando utilizaram a tomografia computadorizada de tórax como referência, a correlação foi completa[15].

Roberto Copetti e col., num estudo publicado em 2008 buscando critétios para distinguir entre edema intersticial hidrostático (edema agudo de pulmão cardiogênico) e edema pulmonar inflamatório (SARA), evidenciaram que linhas “B” patológicas foram encontradas em pacientes com ambos tipos de edema. Anormalidades da linha pleural foram detectadas em todos os pacientes com edema inflamatório e em apenas 25% dos pacientes com edema hidrostático (figura 5). Ausência ou diminuição do deslizamento pulmonar foi observada em 100% dos pacientes com edema inflamatório e em nenhum dos pacientes com edema hidrostático. Consolidações foram detectadas em 83,3% dos pacientes com edema inflamatório e em nenhum dos pacientes com edema hidrostático. Derrame pleural foi encontrado em 66,6% dos pacientes com edema inflamatório e em 95% dos pacientes com edema hidrostático (figura 6).

Figura 5. Em A, linha pleural irregular do edema inflamatório. Em B linha pleural do edema hidrostático
Figura 6. Derrame pleural associado a edema de tipo inflamatório

Além disso, nos casos de edema inflamatório, puderam ser identificadas:

- Alterações pleurais decorrentes de pequenas consolidações subpleurais (figura 7):

Figura 7. consolidações subpleurais

- Áreas denominadas “poupadas”, definidas como regiões pulmonares com aspecto ultrassonográfico normal cercadas por áreas com a presença de múltiplas linhas “B” (figuras 8 e 9):

Figura 8. Em A: áreas poupadas (spared area). Em B pulmão branco (White lung)

Figura 9. Comparação de área poupada e pulmão branco

- Diversas consolidações de tamanhos variados (figura 10):

Figura 10. Consolidações com broncogramas aéreos

Ponto Pulmonar. No ano 2000, o professor Daniel A. Lichtenstein e col.  descrevem o Ponto Pulmonar (lung point) como um sinal específico de pneumotórax. Um achado ultrassonográfico caracterizado por áreas de deslizamento pulmonar ou de linhas “B” alternadas com áreas sem deslizamento pleural ou linhas “B” ou aparecimento exclusivo de linhas “A”. O ponto em que ambas areas alternam tem se denominado de “ponto pulmonar”, descrito como um sinal específico de pneumotórax. O “ponto pulmonar” teve, nesse estudo, uma sensibilidade de 66% (75% no caso de pneumotórax oculto à radiografia convencional) e uma especificidade de 100%. O equivalente à ausência de deslizamento no modo M corresponde ao “sinal da estratosfera” para distinguir da área com deslizamento que corresponde ao “sinal da praia”[16] (figura11).

Figura 11. Em A, fase expiratória do ciclo, mostra pulmão menos insuflado com o ponto pulmonar (interface entre pulmão aerado e pneumotórax) sinalizado pela seta. Em B a insuflação pulmonar movimenta a área de pulmão aerado, deslocando o ponto pulmonar. Em C na expiração, área de pneumotórax, com ausência de deslizamento pleural, ausência de linhas “B” e presença de linhas “A”. Em D, sem deslocar o probe, na inspiração aparece uma área areada como um véu ou cortina que aparece e desaparece com os movimentos respiratórios (sinal da cortina). Em E, o sinal da estratosfera (ausência de deslizamento pleural) e da praia (com deslizamento pleural).

Consolidação ultrassonográfica. O conceito de consolidação ultrassonográfica difere do clássico conceito em que quase se usa como sinônimo de pneumonia. Em 2004 o próprio Daniel A. Lichtenstein e col. estabelecem os critérios ultrassonográficos para o estudo das consolidações ultrassonográficas. Em diversas patologias pulmonares agudas ocorre consolidação dos pulmões que toca a superfície pleural em pelo menos 98,5% das vezes, o que permite a exploração confiável por meio da ultrassonografia. O pulmão consolidado apresenta um aspecto ecogênico, com uma aparência ultrassonográfica que lembra a do fígado. Juntamente descreve o “sinal do retalho de pano” como uma área subpleural, irregular, hipoecogênicas, de aspecto “picotado”, semelhante a um “retalho de pano” associada geralmente a área de consolidação pneumônica ou de necrose. Ainda a presença de broncogramas (ar dentro das vis respiratórias distais), podem ser evidenciadas pela ultrassonografia, no interior da consolidação, como opacidades hiperecogênicas, que podem ser puntiformes ou lineares (o ar no ultrassom aparece hiperecogênico). Tais imagens podem ser estáticas (ar aprisionado) ou dinâmicas (ar se movimentando com o ciclo respiratório) em relação ao ciclo respiratório e nesse caso encontram-se sob a influência do fluxo aéreo nas vias aéreas (figuras 12 e 13)[17].

Figura 12. Em a) Imagens de USG pulmonar mostrando a consolidação pulmonar e dentro imagens de broncogramas lineares e pontiformes. Destaque-se a imagem de consolidação pulmonar com a ecotextura do fígado (”hepatização”). Em b) a correspondência coma imagem de consolidação pela tomografia.

Figura 13. Imagem do sinal do retalho de pano, que corresponde a área de necrose tecidual geralmente associada a consolidação pneumônica ou abscesso.

O tratamento é de suporte, consistindo principalmente de oxigênio suplementar e, se necessário, ventilação mecânica a pressão positiva (PEEP) que utiliza os mecanismos já comprovados no EAP cardiogênico. Neste caso recrutando áreas colabadas e assim aumentando a complacências pulmonar. A doença geralmente é autolimitada. De fato, existem já estudos publicados que comprovam o uso da ultrassonografia pulmonar no diagnóstico da atelectasia e na monitorização de sua resolução após manobras de recrutamento alveolar na SARA. Gerardo Tusman e outros pesquisadores tem publicado estudos em que a ultrassonografia pulmonar foi útil na detecção da presença de atelectasias decorrentes do recrutamento tidal e na sua resolução após uma manobra de recrutamento alveolar (figura 14)[18] [19] [20] [21].

Figura 14. USG pulmonar na manobra de recrutamento alveolar.

CONCLUSÃO:

1. EDEMA PULMONAR DE RE-EXPANSÃO (E.P.R.E.)  pode ser uma complicação rara de edema pulmonar intersticial associado a áreas de atelectasia pulmonar que ocorrem após drenagem de pneumotórax, derrame pleural ou reexpansão de atelectasia previa de outra etiologia. Deve ser suspeitada quando o paciente apresenta após a drenagem ou reexpansão, súbita piora clínica com dispneia e dessaturação.

2. Deve se fazer o diagnóstico diferencial de EPRE de outras patologias pleuro-pulmonares com base na forma de apresentação, exame clínico e exames radiológicos e laboratoriais.

3. Os estudos de radiografia torácica e tomografia computadorizada são úteis, mas não específicos para diagnosticar EPRE.

4. A ultrassonografia pulmonar a beira leito (POCUS) é um exame já consagrado não apenas em cuidados intensivos, emergência, anestesiologia e cirurgia de trauma, mas também em medicina interna e pneumologia. Muitos autores já publicaram inúmeros estudos sobre a aplicação da ultrassonografia pulmonar em diferentes contextos e patologias, sendo o derrame pleural, o pneumotórax, a pneumonia e a SARA algumas de suas principais aplicações.

5. Existem estudos que comprovam a utilidade da ultrassonografia pulmonar no diagnóstico das atelectasias pulmonares assim como no acompanhamento resolutivo através das manobras de recrutamento alveolar. 

6. Este relato de caso sugere que o USG pulmonar a beira leito pode ser uma boa alternativa à radiografia torácica e tomografia computadorizada para identificar EPRE e acompanhar a sua resolução.




[1] Rozenman J, Yellin A, Simansky DA, et al. Re-expansion pulmonar oedema following spontaneous pneumothorax. Respir Med. 1996;90(4):235-238.
[2] Mokotedi CM, Balik M Is the mechanism of re-expansion pulmonary oedema in a heart–lung interaction? Case Reports 2017;2017:BMJ Case Reports -2017-219340. http://dx.doi.org/10.1136/bcr-2017-219340
[3] Matsuura Y, Nomimura T, Murakami H, et al. Clinical analysis of reexpansion pulmonary edema. Chest. 1991;100(6):1562-1566.
[4] Alice Petiot, MD., et.al., Re-expansion pulmonary oedema. The Lancet. Clinical Picture. volume 392, issue 10146, p507, august 11, 2018
[5] Marland M, Glauser FL. Hemodynamic and pulmonary edema protein measurements in a case of reexpansion pulmonary edema. Chest. 1982;81(2):250-251.
[6] Candy Masego Mokotedi, Martin Balik. Is the mechanism of re-expansion pulmonary oedema in a heart–lung interaction?, Case Reports 2017;2017:BMJ Case Reports -2017-219340. http://dx.doi.org/10.1136/bcr-2017-219340
[7] Cita como tipos de EPNC: SARA, Edema pulmonar das grandes alturas, Edema Pulmonar Neurogênico, Edema Pulmonar de Reperfusão, Edema Pulmonar de Reexpansão, Edema por overdose de opiláceos, Edema por toxicidade por salicilatos, Edema por Embolia Pulmonar, Edema por Infecções virais, Edema por doença veno-oclusiva.
[9] Miller WC, Toon R, Palat H, Lacroix J. Experimental pulmonar edema following re-expansion of pneumothorax. Am Rev Resp Dis. 1973;108(3):654-660.
[10] Mahfood S, Hix WR, Aaron BJ, Blaes P, Watson DC. Reexpansion pulmonary edema. Ann Thorax Surg. 1988;45(3):340-345.
[11] Kim YK, Kim H, Lee CC, et al. New classification and clinical characteristic of reexpansion pulmonary edema after treatment of spontaneous pneumothorax. AmJ Emerg Med. 2008;27(8):961-967.
[12] Lichtenstein D. Lung ultrasound in the critically ill. Curr Opin Crit Care. 2014;20(3):315-322.
[13] Lichtenstein DA. Ultrasound in the management of thoracic disease. Crit Care Med. 2007;35(5 suppl):S250-S261.
[14] Henschke, C.I., et al., Accuracy and efficacy of chest radiography in the intensive care unit. Radiol Clin
North Am, 1996. 34(1): p. 21-31
[15] Lichtenstein, D.A., et al., A-lines and B-lines: lung ultrasound as a bedside tool for predicting pulmonar artery occlusion pressure in the critically ill. Chest, 2009. 136(4): p. 1014-20.
[16] Lichtenstein, D., et al., The “lung point”: an ultrasound sign specific to pneumothorax. Intensive Care
Med, 2000. 26(10): p. 1434-40.
[17] Daniel A. Lichtenstein, et.al., Ultrasound diagnosis of alveolar consolidation in the critically ill. Intensive Care Med (2004) 30:276–281
[18] Gerardo Tusman, et.al., Preventionandreversaloflungcollapseduringthe intra-operative period. Best Practice&ResearchClinicalAnaesthesiology24(2010)183e197
[19] Gerardo Tusman, et.al., Realtime images of tidal recruitment using lung ultrasound. Tusman et al. Crit Ultrasound J (2015) 7:19
[20] Gerardo Tusman, et.al., Ultrasonography for the assessment of lung recruitment maneuvers. Crit Ultrasound J (2016) 8:8
[21] Thomas Luecke et.al., Lung imaging for titration of mechanical ventilation. Curr Opin Anesthesiol 2012, 25:131–140



[ARTIGO CHEST] Valeria Tombini, et.al., Lung Ultrasound Diagnosis and Follow-up in a Case of Reexpansion Pulmonary Edema. CHEST 2019; 155(2):e33-e36. DOI: https://doi.org/10.1016/j.chest.2018.08.1091.

Nenhum comentário:

Postar um comentário