domingo, 15 de março de 2020


ESTABILIDADE DO HCoV-19 (SARS-CoV-2), EM AEROSSOL E SUPERFÍCIES EM COMPARAÇÃO COM SARS-CoV-1 (**)
(Aerosol and surface stability of HCoV-19 (SARS-CoV-2) compared to SARS-CoV-1[1])

Neeltje van Doremalen(1), Trenton Bushmaker(1), Dylan H. Morris(2), Myndi G. Holbrook(1), Amandine Gamble (3), Brandi N. Williamson(1), Azaibi Tamin(4), Jennifer L. Harcourt(4), Natalie J. Thornburg(4), Susan I. Gerber(4), James O. Lloyd-Smith(3,5,) Emmie de Wit(1), Vincent J. Munster(1)

1.       Laboratory of Virology, Division of Intramural Research, National Institute of Allergy and Infectious Diseases, National Institutes of Health, Hamilton, MT, USA.
2.       Department of Ecology and Evolutionary Biology, Princeton University, Princeton, NJ, USA
3.       Department of Ecology and Evolutionary Biology, University of California, Los Angeles, Los Angeles, CA, USA
4.       Division of Viral Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, GA, USA.
5.       Fogarty International Center, National Institutes of Health, Bethesda, MD, USA


(**) Resumo feito pelo Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos - SP.



Artigo original do NEJM publicado na forma de pré-print na plataforma medRxiv no último dia 09.03.2020, revela que o HCoV-19 (SARS-CoV - 2) causou > 88.000 doenças relatadas com uma taxa atual de letalidade de aproximadamente 2%. Aqui investigamos a estabilidade[2] de HCoV-19 viáveis em superfícies e em aerossóis em comparação com o SARS CoV-1. No geral, a estabilidade é muito semelhante entre o HCoV-19 e o SARS-CoV-1. Descobrimos que vírus viáveis podem ser detectados em aerossóis até 3 horas após a aerossolização, até 4 horas em superfície de cobre, até 24 horas em superfície de papelão e até 2-3 dias em superfícies de plástico e aço inoxidável.

HCoV-19 e SARS-CoV-1 exibiram meia-vida[3] similar em aerossóis, com estimativas medianas em torno de 2,7 horas. Ambos os vírus mostram viabilidade relativamente longa em superfície de aço inoxidável e polipropileno em comparação com cobre ou papelão: a estimativa média de meia-vida para o HCoV-19 é de cerca de 13 horas em superfície de aço e 16 horas em superfície de polipropileno.

Nossos resultados indicam que a transmissão pelo aerossol através de fômites[4] do HCoV-19 é plausível, pois o vírus pode permanecer viável nos aerossóis por várias horas e em superfícies de até dias.

O novo coronavírus humano, agora denominado coronavírus 2 da síndrome respiratória aguda grave 2 (SARS-CoV-2, referido como HCoV-19 ao longo deste manuscrito) surgiu em Wuhan, China no final de 2019.

Em 3 de março de 2020, mais de 88.000 casos foram diagnosticados em 64 países, incluindo 2,915 mortes. A rápida expansão desse surto é indicativa de transmissão eficiente de homem para homem. HCoV-19 foi detectado em amostras do trato respiratório superior e inferior de pacientes, com altas cargas virais em amostras do trato respiratório superior. Portanto, a transmissão do vírus por secreções respiratórias na forma de gotículas (> 5 mícrons) ou aerossóis (<5 mícrons) parece ser possível.

Estabilidade do vírus no ar e nas superfícies podem afetar diretamente a transmissão do vírus, pois as partículas precisam permanecer viáveis ​​por tempo suficiente após serem expulsas do hospedeiro para serem recebidas por um novo hospedeiro. Transmissão aérea ou transmissão a partir de fômites tem sido proposta com tendo papel importante na epidemiologia dos dois coronavírus zoonóticos que surgiram neste século, o SARS-CoV-1 e MERS-CoV. Transmissão aérea pode ter sido responsável pela grande disseminação durante a epidemia de SARS de 2002-2003, e numerosos eventos de grande disseminação da SARS-CoV-1 foram associados a procedimentos médicos geradores de aerossóis.

Também houve suspeita de transmissão durante a epidemia de SARS e uma análise de  SARS nosocomial concluiu que os fômites haviam desempenhado um papel significativo. Dado o impacto potencial de diferentes vias de transmissão na epidemiologia de vírus emergentes, é crucial quantificar as características virologias que podem moldar esses aspectos da transmissão do HCoV-19. Aqui, analisamos a estabilidade do HCoV-19 em aerossol na superfície e comparemos com o SARS CoV-1, o coronavírus mais intimamente relacionado com infecção em humanos. Avaliamos a estabilidade em aerossol do HCoV-19 e do SARS-CoV-1 por até três horas em aerossóis e até 7 dias em diferentes superfícies. Estimamos as taxas de decaimento de HCoV-19 e SARS-CoV-1 em cada condição usando uma regressão bayesiana.

O HCoV-19 está causando muitos mais casos de doença e mais mortes que o SARS-CoV-1, assim como está se mostrando mais difícil de conter. Entretanto, nossos resultados indicam que a maior transmissibilidade observada para o HCoV-19 é improvável que seja devida a maior viabilidade ambiental desse vírus em comparação com o SARS-CoV-1. Em vez disso, existem vários fatores que poderiam explicar as diferenças epidemiológicas entre os dois vírus. Existem já dados de que indivíduos infectados com HCoV-19 podem eliminar e transmitir o vírus no estado pré-sintomático ou assintomático. Isso reduz a eficácia da quarentena e do rastreamento de contatos como medidas de controle em relação ao SARS-CoV-1. Outros fatores prováveis incluem a virulência (carga infecciosa necessária para estabelecer uma infecção), a estabilidade do vírus no muco, e fatores ambientais, como temperatura e umidade relativa. Em experimentos em andamento, estamos estudando a viabilidade do vírus em diferentes matrizes, como secreção nasal, escarro e matéria fecal, sob condições ambientais variadas, como temperatura e umidade relativa.

A epidemiologia da SARS-CoV-1 foi dominada pela transmissão nosocomial e SARS-CoV foi detectado em várias superfícies e objetos em ambientes de saúde. A transmissão de HCoV-19 também está ocorrendo em ambiente hospitalar, com mais de 3000 casos relatados de infecções adquiridas em hospitais. Esses casos destacam a vulnerabilidade das instituições de saúde para a introdução e disseminação do HCoV-19, ao contrário do SARS-CoV-1, que a maioria das transmissões secundárias foram relatadas fora dos estabelecimentos de saúde, e a transmissão generalizada na comunidade está sendo vista em vários contextos, como famílias, reuniões no local de trabalho e em grupo.

Uma característica notável do SARS-CoV-1 foi a super disseminação de eventos, nos quais um único indivíduo infectado foi responsável ​​por um grande número de casos secundários, bem acima do número médio indicado pelo número de reprodução (Reff). Uma tendência para esses eventos de super propagação tem duas importantes consequências para a epidemiologia de infecções emergentes: a propagação da infecção torna os pacientes mais propensos a morrer, e quando ocorrem os surtos, eles são explosivos e podem sobrecarregar a capacidade de saúde pública. Vários eventos hipotéticos de super disseminação foram relatados para HCoV-19. Dado que os eventos de super propagação de SARS-CoV-1 estavam ligados ao aerossol e a fômite, nossa constatação de que o HCoV-19 tem viabilidade no ambiente comparável à do SARS-CoV-1 dá credibilidade à hipótese de que ele também pode estar associado à super propagação.

Descobrimos que a meia-vida do HCoV-19 no papelão é maior que a meia-vida do SARS-CoV-1. Deve-se salientar que os dados eram visivelmente mais notórios para essa superfície do que para as outras superfícies testadas, por isso aconselhamos cautela na interpretação deste resultado. Aqui, mostramos que a estabilidade do HCoV-19 e SARS-CoV-1 sob o teste experimental, nas circunstâncias testadas foi semelhante.



[1] NEJM. Artigo original. medRxiv preprint doi: https://doi.org/10.1101/2020.03.09.20033217.doi: https://doi.org/10.1101/2020.03.09.20033217
[2] Estabilidade: tempo que ele consegue manter sua capacidade de infecção no ambiente
[3] Meia-vida: tempo necessário para que sua quantidade se reduza em 50%
[4] Um fômite (português brasileiro) ou fómite (português europeu) é qualquer objeto inanimado ou substância capaz de absorver, reter e transportar organismos contagiantes ou infecciosos (de germes a parasitas), de um indivíduo a outro. Há vários exemplos de fômites na Medicina. Sapatos contaminados podem espalhar doenças nos pés e na boca. Outros exemplos incluem ferramentas ou utensílios como mangueirinhas de chuveiro introduzidas na vagina de diversas mulheres que utilizam o mesmo banheiro e a mesma mangueira para fazerem lavagem vaginal pós coito; laringoscópios que não são apropriadamente desinfectados entre as utilizações em diversos pacientes. Toalhas sujas, talheres, maçanetas, corrimãos, ônibus e outros meios de transportes coletivos e mesmo superfícies tais como chão, paredes e mesas também podem servir de disseminadores de doenças porque são objetos que entram em contato com diversas pessoas e podem conter agentes patogênicos que são transmitidos de uns para outros devido ao uso comum desses objetos contaminados. Pesquisadores descobriram que superfícies lisas (não-porosas), transmitem bactérias e vírus melhor que materiais porosos; assim, é mais provável que se pegue uma doença de uma maçaneta de porta do que de dinheiro em papel. A razão é que materiais porosos e, especialmente, fibrosos, absorvem e aprisionam o agente contagiante, tornando mais difícil contraí-lo apenas através do toque. https://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%B4mite

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