ANÁLISE LABORATORIAL NA COVID 19
Elaborado por: Dr. Alejandro Enrique Barba Rodas. Médico Coordenador da Unidade Coronariana da Santa Casa de São Jose dos Campos.
A COVID-19 é uma doença causada pelo
coronavírus, denominado SARS-CoV-2, que apresenta um espectro clínico que varia
de infecções assintomáticas a quadros graves. De acordo com a Organização
Mundial de Saúde, a maioria (cerca de 80%) dos pacientes com COVID-19 podem ser
assintomáticos ou oligossintomáticos, e aproximadamente 20% dos casos detectados
requer atendimento hospitalar por apresentarem dificuldade respiratória, dos quais
aproximadamente 5% podem necessitar de suporte ventilatório. O vírus SARS-CoV-2
é transmitido de pessoa a pessoa, por meio de gotículas de saliva ou secreção
nasal quando uma pessoa infectada tosse ou espirra. No momento, não existem
vacinas ou tratamentos específicos para a COVID-19. No entanto, existem muitos
ensaios clínicos em andamento avaliando possíveis tratamentos[1].
No meio desta pandemia que assola já
muitos países e que vem colapsando os grandes sistemas de saúde do mundo, nos
deparamos com grandes desafios não apenas quanto ao diagnóstico e tratamento
desses pacientes, mas também quanto a diretrizes tanto para admissão e alta no
hospital e na UTI, como para alta e des-isolamento.
Nesse cenário, muita controversa e
confusão vem sendo gerada na interpretação dos resultados dos testes de real
time RT-PCR feitos nas amostras de secreção respiratória coletadas por swab
orofaríngeo /nasofaringeo usado para detecção do vírus (RNA) e dos testes
imunológicos para detecção de anticorpos (IgM, IgG, IgA) a exemplo do
denominado “teste rápido” que deverá começar a ser usado no Brasil (imunocromatografia).
Entender aspectos de SENSIBILIDADE (S),
ESPECIFICIDADE (E), VALOR PREDITIVO POSITIVO (VPP) E VALOR PREDITIVO NEGATIVO
(VPN) é importante para interpretação dos resultados.
- Quando um
teste dá positivo, o que se quer saber se esse teste é realmente positivo (VP)
ou não (FP). Isto será de suma relevância para definir se o paciente é
verdadeiramente um Covid 19 (+). Da mesma forma para um teste negativo é de
todo desejável saber se ele pode ser um verdadeiro negativo (VN) ou um falso
negativo (FN) para descartá-lo ou não como paciente doente pelo Covid 19.
Fonte: Diagnósticos da América S/A
(DASA). COVID 19 RECOMENDAÇÃO DE USO DE EXAMES LABORATORIAIS
Fonte: Guia de Vigilância Epidemiológica Emergência de
Saúde Pública de Importância Nacional pela Doença pelo Coronavírus 2019.
Ministério da Saúde. 03.04.2020.
1) TESTE
MOLECULAR: RT-PCR EM TEMPO REAL (RT-PCR) - Reverse transcription
polymerase chain reaction quantitative real time - RT-PCR)
É uma técnica de
laboratório baseada no princípio da reação em cadeia da polimerase (PCR) para
multiplicar ácidos nucleicos, onde o material genético inicial na reação de PCR
é o RNA, que é transcrito de forma reversa gerando um DNA complementar (cDNA)
usando a enzima transcriptase reversa. A partir deste cDNA se estabelece uma
replicação em cadeia através da enzima polimerase.
Trata-se, portanto, de
detecção do RNA do vírus Sars-Cov-2 (carga viral) em amostras de secreção
respiratória (naso/orofaringe, lavado brônquico ou secreção traqueal) por
metodologia de biologia molecular com amplificação de regiões específicas dos
genes N, E, S e RdRP, e utilização de RNAseP como controle positivo. Entre
alguns protocolos existentes para detecção desses genes, o que tem sido adotado
pela maior parte dos países e recomendado pela Organização Pan-Americana da
Saúde (OPAS) é o protocolo internacional desenvolvido pelo Instituto
Charité/Berlim. Esse método tem sido amplamente utilizado por estabelecimentos
de saúde pública e da saúde suplementar, incluindo laboratórios da rede privada
e, até esse momento, é considerado o método de referência no Brasil para
confirmar COVID-19.
O RNA do vírus e
a carga viral, podem ser detectados por metodologias moleculares entre 0 a 12
dias de sintomas, mas segundo a Sociedade Brasileira de Patologia
Clínica/Medicina Laboratorial, a detecção do vírus por RT-PCR em tempo real
(reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa) permanece sendo o teste
laboratorial de escolha para o diagnóstico de pacientes sintomáticos na fase
aguda (entre o 3º e 7º dia de doença, preferencialmente). Detecção mais
prolongada tem sido observada, em situações de maior gravidade.
O real time
RT-PCR é considerado ALTAMENTE ESPECÍFICO (E), em razão de ser
praticamente impossível um resultado falso positivo (FP). Talvez uma exceção
seria erro humano com troca involuntária de resultados. Pela mesma razão possui
em ALTO VALOR PREDITIVO POSITIVO (VPP).
DESTA FORMA
UM RESULTADO (+) CONFIRMA A DOENÇA, SENDO DESNECESSÁRIO A COLETA DE UMA SEGUNDA
AMOSTRA.
Em contrapartida
existe uma maior possibilidade de haver falsos negativos (FN) pelo que a SENSIBILIDADE
(S) e o VALOR PREDITIVO NEGATIVO (VPN) NÃO SÃO ALTOS, em
razão de:
- Amostra
insuficiente muito tardia em pacientes convalescentes (pouca carga viral após o
7º dia do início dos sintomas) ou muito precoce (antes do 3º dia de início dos
sintomas).
- Má técnica de
coleta de material de naso e orofaringe e/ou trato respiratório inferior
- Inadequada conservação
- Inadequado transporte
- Demora no
processamento.
- Razões
técnicas inerentes ao teste como, por exemplo, mutação do vírus ou inibição de
PCR.
DESTA FORMA
UM RESULTADO (-) NÃO EXCLUI DOENÇA, PODENDO SER NECESSÁRIO UMA SEGUNDA COLETA,
caso exista alta suspeita clínica, radiológica e epidemiológica ou a suspeita
de algum dos fatores causadores de falso (-). Haverá, portanto, que justificar
adequadamente a coleta desta segunda amostra, já que enquanto não chegar o
resultado desse segundo teste, manterá o paciente na condição ainda de “caso
suspeito aguardando exame” com todas as implicâncias que disso decorra,
especialmente se o paciente vier a óbito antes de chegar o resultado desse
segundo teste. Dessa forma, se um
resultado negativo foi obtido de um paciente com alta probabilidade de infecção
por SARS-CoV-2, particularmente quando foram analisadas apenas amostras do
trato respiratório
superior, é indicado, se possível, coletar amostras de vias respiratórias
inferiores e testar novamente.
É importante
destacar que para as amostras negativas para COVID-19 por teste molecular e que
sejam de pacientes com Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), deve-se
aproveitar o material já com RNA extraído e realizar amplificação para detecção
de Influenza e outros vírus respiratórios (painel viral respiratório)[2] [3].
Importante
salientar neste ponto que o PROTOCOLO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, considera
como CASO POSITIVO OU NEGATIVO DO PONTO DE VISTA LABORATORIAL O RESULTADO
APENAS DE UM TESTE LABORATORIAL.
CASOS
CONFIRMADOS
POR CRITÉRIO
LABORATORIAL: caso suspeito de SG ou SRAG com teste de:
● Biologia
molecular (RT-PCR em tempo real, detecção do vírus SARS-CoV2, Influenza ou
VSR):
- § Doença pelo Coronavírus 2019: com resultado detectável para SARS-CoV2.
- § Influenza: com resultado detectável para Influenza.
- § Vírus Sincicial Respiratório: com resultado detectável para VSR.
● Imunológico
(teste rápido ou sorologia clássica para detecção de anticorpos):
- Doença pelo Coronavírus 2019: com resultado positivo para anticorpos IgM e/ou IgG. Em amostra coletada após o sétimo dia de início dos sintomas.
CASO
DESCARTADO DE DOENÇA PELO CORONAVÍRUS 2019 (COVID-2019)
Caso suspeito de
SG ou SRAG com resultado laboratorial negativo para CORONAVÍRUS (SARSCOV- 2
não detectável pelo método de RT-PCR em tempo real), considerando a
oportunidade da coleta OU confirmação laboratorial para outro agente
etiológico.
Desta feita, entendo que nos
casos de teste negativo, em que uma segunda amostra bem fundamentada e
justificada for solicitada, o paciente deverá manter sua condição de “caso
suspeito aguardando exame” tanto para fins de manejo e isolamento quanto para
fins de declaração de óbito.
Esclareça-se
ainda que esse segundo exame a ser solicitado não significa “contraprova”. Sempre
que um teste positivo é constatado por uma rede particular, por exemplo, a
amostra é enviada para as instituições, que realizam a “contraprova”.
Confirmado o caso, o laboratório está apto a fazer os demais testes na
população. No Brasil, existem três laboratórios de referência, segundo o
Ministério da Saúde: Instituto Adolfo Lutz (SP), Fundação Oswaldo Cruz (RJ) e
Instituto Evandro Chagas (PA). O processo ocorre apenas no primeiro teste
positivo.
2) TESTE
IMUNOLÓGICOS
Estes dados são
preliminares e novos estudos de validação estão sendo realizados em diferentes
dias da janela imunológica e serão divulgados nas próximas versões deste
documento.
Os dados até o
momento demonstram que um resultado positivo confirma a doença, porém um
resultado negativo não exclui a doença.
Os anticorpos
podem ser detectados com melhor sensibilidade à partir do 7º dia de sintomas,
dependendo do método. Existem
limitações e variações de sensibilidade do teste conforme o tempo de doença.
Detecção de
anticorpos (anticorpos totais IgA/IgG ou IgM/IgG ou anticorpos isolados IgA /
IgG / IgM) no sangue total (testes rápidos ou point of care) ou
soro/plasma (Quimioluminescência ou ELISA) para avaliação da resposta
imunológica à infecção pelo Sars-Cov-2
RECOMENDAÇÃO
PRIORITÁRIA DE SOLICITAÇÃO
1) Paciente
sintomático moderado/grave, com mínimo de 7 dias de sintomas, com critérios
clínicos/radiológicos de internação hospitalar, para racionalização do uso do
RT-PCR (RT-PCR realizado se sorologia negativa) e diagnóstico de Covid-19
(sorologia positiva)
2) Profissional
de Saúde afastado com suspeita de Covid-19 para triagem do retorno às
atividades profissionais, com realização
após o 7º dia de sintomas para racionalização do uso do RT-PCR. Deve ser
realizado o RTPCR se a sorologia for negativa e a manutenção do isolamento
individual se a sorologia positiva até 14 dias.
RECOMENDAÇÃO
NÃO PRIORITÁRIA DE SOLICITAÇÃO (depende de disponibilidade de recursos)
1) Pacientes
sintomáticos sem critérios clínicos de internação hospitalar, para
racionalização do uso do RT-PCR (RT-PCR
realizado se sorologia negativa) e diagnóstico de Covid-19 (sorologia positiva)
e vigilância epidemiológica, com realização do teste após 7º dia.
Conforme a mais
recente versão do Guia de Vigilância Epidemiológica Emergência de Saúde Pública
do Ministério da Saúde (03.04.2020) usada para esta análise, até o momento, o
Ministério da Saúde, só dispõe do ensaio imunocromatográfico para detecção
rápida e qualitativa dos anticorpos IgG/IgM da síndrome respiratória aguda
grave por coronavírus 2 (SARS-CoV2), em amostras de sangue total, soro ou
plasma humano. O teste deve ser usado como uma ferramenta para auxílio no
diagnóstico da doença por infecção por coronavírus (COVID 19), causada pelo
SARS-CoV2. São testes qualitativo para triagem e auxílio diagnóstico. Resultados
negativos não excluem a infecção por SARS-CoV2 e resultados positivos não podem
ser usados como evidência absoluta de SARS-CoV2. O resultado deve ser
interpretado por um médico com auxílio dos dados clínicos e outros exames
laboratoriais confirmatórios.
Atualmente, há
muitas empresas produzindo testes rápidos para diagnosticar COVID-19. De forma
geral, os testes sorológicos visam detectar anticorpo específico produzido pelo
corpo humano contra o vírus SARS-CoV2 ou detectar antígeno desse vírus. Para
isso, os métodos sorológicos são desenvolvidos para detecção de anticorpos IgG
e IgM ou detecção de antígenos específicos do vírus, alguns por ensaios
imunoenzimáticos (ELISA) e imunocromatográficos (teste rápido) e outros por
imunofluorescência.
No âmbito da
Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional e Internacional, deve-se
avaliar se o produto possui registro na Anvisa, avaliar a documentação do
fabricante e considerar que os dados podem ser insuficientes para tomada de
decisão. Portanto, esses testes, até o momento, não devem ser adotados para
decisão clínica, mas apenas para finalidade de vigilância por meio de estudos
de inquéritos populacionais e também como auxílio diagnóstico.
É essencial que
qualquer teste passe por um processo de validação por meio do Instituto
Nacional de Controle de Qualidade em Saúde da Fundação Oswaldo Cruz
(INCQS/Fiocruz), a fim de avaliar se os parâmetros de qualidade do teste
(sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo
negativo) são úteis para alguma etapa da estratégia de resposta à emergência em
saúde pública.
Em março de
2020, quando foi oferecida a doação deste teste para a resposta ao COVID-19,
era a única opção disponível em quantidade suficiente para todo o território nacional.
Esta estratégia deve ser reavaliada regularmente, para ajustar as definições
operacionais da vigilância epidemiológica. Este teste visa atender
exclusivamente no período a ESPIN e sua qualidade deve ser objeto de
monitoramento pelos Laboratórios Centrais de Saúde Pública em conjunto com o
INCQS/Fiocruz.
Qualquer desvio de qualidade deve ser comunicado à Anvisa. Tais
informações são de extrema importância para a precisão da indicação de medidas
não farmacológicas de COVID-19, pois um paciente com um resultado falso
negativo pode sair erroneamente do isolamento domiciliar e disseminar o vírus,
como também fazer com que profissionais de saúde tenham que se afastar do
trabalho e deixar de ajudar a salvar vidas, pelo resultado falso positivo.
De forma geral, recomenda-se que antes de se utilizar um teste rápido, deve-se
verificar se o mesmo já foi avaliado pelo INCQS. Mesmo validados, é importante
saber que os testes rápidos apresentam limitações e a principal delas é que
precisa ser realizado, de forma geral, a partir do 8º (oitavo) dia do início
dos sintomas. É necessário que o caso suspeito ou contato de caso confirmado de
COVID-19 espere esse tempo para que o sistema imunológico possa produzir
anticorpos em quantidade suficiente para ser detectado pelo teste.
[1]
Guia de Vigilância Epidemiológica Emergência de Saúde Pública de Importância
Nacional pela Doença pelo Coronavírus 2019. Ministério da Saúde. 03.04.2020.
[2]
Diagnósticos da América S/A (DASA). COVID 19 RECOMENDAÇÃO DE USO DE EXAMES
LABORATORIAIS Versão 1.0 de 28/03/20202
[3]
Métodos Laboratoriais para Diagnóstico da Infecção pelo SARS-CoV-2.
Recomendações da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica/Medicina Laboratorial.
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